Thursday 17 June 2021

 IPOR, LIVRARIA PORTUGUESA, ESCOLA PORTUGUESA & etc.

                                                                                                               Jorge Morbey       

1. A novela triste a que vimos assistindo, em que figuram o Instituto Português do Oriente, a Livraria Portuguesa e a própria Escola Portuguesa, é o resultado de um dos maiores erros cometidos por Portugal em Macau.

Tal erro persiste – herança dos sucessivos governos que têm passado pelo Poder em Portugal nos últimos vinte anos - e é urgente corrigi-lo.

Para tanto, é indispensável que o Estado Português assuma finalmente que:

- Portugal não dispõe de recursos suficientes para pôr em execução uma política externa - de Cultura e da Língua Portuguesa;

- A Língua Portuguesa não é património exclusivo de Portugal;

- Chegou ao fim a parceria que, em má hora, estabeleceu com a Fundação Oriente, com o objectivo de reforçar a sua diplomacia cultural nesta região do Mundo, em geral, e com a China e Macau, em particular.

2. Não é de agora a escassez de meios de que Portugal padece, nomeadamente para a execução da sua Política Externa. Na segunda metade do séc. XIX, por exemplo, foi Macau que assegurou – e disponibilizou o suporte financeiro – para garantir a manutenção das relações diplomáticas e consulares com os países desta região do Mundo. Nesse período, os Governadores de Macau eram investidos nas funções de representantes diplomáticos de Portugal em Pequim, Tóquio e Bangkok, com a categoria de ministros plenipotenciários.

3. No tempo em que desempenhei as funções de Presidente do Conselho Directivo do Instituto Cultural de Macau (1985/89) elaborei um projecto que situava Macau numa posição de equidistância relativa entre a China e Portugal, de modo a viabilizar o suporte necessário para o funcionamento de estruturas culturais das representações de Portugal na Ásia e, ao mesmo tempo, das representações da China nos Países de Língua Portuguesa. Salvaguardadas as diferenças em razão do objecto, a finalidade consistia em elevar Macau à posição de plataforma de relações culturais que poderia ter constituído o primeiro patamar do que é hoje o Forum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa, num espectro ainda mais vasto por incluir países desta região com comunidades de luso-descendentes e sino-descendentes.

A Aministração Melancia preferiu seguir o figurino usado por Portugal no séc. XIX. Revelando escasso empenho em inovar, o projecto concretizou-se confinado à viabilização das estruturas culturais nas Embaixadas de Portugal em Seul, Pequim, Tóquio, Bangkok e Delhi que, obviamente, aprazava a sua morte para 1999, com a reunificação de Macau à China. 

O referido projecto encontrava-se, aliás, congelado pelo Eng. Melancia que o reactivou no contexto da criação da Fundação Oriente, quando se teria apercebido dos amplos poderes que se desenhavam para a então nóvel Fundação.

4. É de justiça referir o generoso optimismo do então Presidente da República, Dr. Mário Soares, e a confiança que depositou no papel que augurava àquela Fundação, de principal agente coadjuvante da acção cultural externa de Portugal no Oriente e, principalmente, em Macau. O seu entusiasmo terá sido o motor que propiciou àquela Fundação, durante a Administração Melancia-Murteira Nabo, o poder de decidir sobre a reestruturação do sector da Cultura em Macau e as condições altamente favoráveis com que adquiriu o valioso património imobiliário que vem alienando.

5. Infelizmente, o balanço destes últimos vinte anos revela que o desempenho reservado à Fundação Oriente se saldou num dos maiores erros cometidos por Portugal em Macau.

Após a transferência do exercício da soberania sobre Macau, quando dela se esperava um desempenho marcante na acção cultural externa de Portugal no Oriente e na promoção da Língua e da Cultura Portuguesa em Macau, verifica-se exactamente o contrário: alienação de património imobiliário; redução anunciada - e atrasos na disponibilização - de verbas para o funcionamento das estruturas em que tem parceria com o Estado Português; inexistência ou, pelo menos, invisibilidade de actividades de carácter cultural, educativo, artístico, científico, social e filantrópico, em Macau.

6. Para que foi criada a Fundação Oriente?

De acordo com os seus estatutos, a Fundação promove, de modo especial em Macau, todas as acções que visem a valorização do seu património cultural e artístico.

Por que foi reconhecida a utilidade pública da Fundação Oriente?

Em Portugal (Declaração publicada no Suplemento do Diário da República nº 54, II Série, de 6 de Março de 1989) e, em Macau (Decreto-Lei nº 16/89/M, de 8 de Março, publicado no Boletim Oficial de Macau nº 10).

O termo do vínculo, entre a concessionária em regime de exclusividade da exploração do jogo em Macau e a Fundação Oriente, que lhe garantiam rendimentos regulares, constitui circunstância superveniente que a dispensem do cumprimento das suas obrigações estatutárias?

Estas interrogações assumem uma enorme actualidade e devem ser avaliadas pelo Estado Português.

7. Nos tempos que correm, especialmente após o anúncio da venda das instalações da Livraria Portuguesa em Macau, a Fundação Oriente perdeu aqui a credibilidade que lhe restava.

8. Parece urgente e inadiável que o Estado Português assuma as suas obrigações e ponha termo à parceria com a Fundação Oriente, designadamente no Instituto Português do Oriente e na Escola Portuguesa de Macau, e:

- Uma vez que a Língua Portuguesa não é património exclusivo de Portugal, pelo menos desde 1822, com a independência do Brasil;

- Ascendendo Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, S. Tomé e Príncipe e Timor Leste a Estados independentes que adoptaram a Língua Portuguesa como sua Língua Oficial;

- Tendo em conta que os Estados de Língua Oficial Portuguesa fundaram a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP);

- Em vista da DECLARAÇÃO SOBRE A LÍNGUA PORTUGUESA aprovada na VII CONFERÊNCIA DE CHEFES DE ESTADO E DE GOVERNO DA COMUNIDADE DOS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA, em Lisboa, a 25 de Julho de 2008;

                     e da

- Resolução sobre o Instituto Internacional da Língua Portuguesa, aprovada na XIII REUNIÃO ORDINÁRIA DO CONSELHO DE MINISTROS da CPLP, em Lisboa, a 24 de Julho de 2008;

- Verficando-se a circunstância de, apesar de diminuir de ano para ano o número de alunos da Escola Portuguesa de Macau, cresce o número de alunos originários dos Países de Língua Oficial Portuguesa que, eventualmente, poderão vir a contrabalançar a diminuição dos alunos originários de Portugal:

É chegada a hora de alargar a agenda da CPLP a outras questões relativas à Língua Portuguesa, tais como: a difusão das culturas lusófonas, os Crioulos de origem portuguesa, as Escolas Portuguesas no estrangeiro, os Leitorados de Português em Universidades estrangeiras, etc. etc. etc.


Publicado no Jornal HOJE MACAU 6/3/2009

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