Thursday 17 November 2011

LIBERDADE

LIBERDADE

O conceito que temos de Liberdade - goste-se ou não - é laico e republicano. Radica na divisa do Estado francês adoptada em 1793 enquanto expressão dos princípios da Revolução que metamorfoseou Luís XVI em "Citoyen Louis Capet" para o degolar na guilhotina. Tudo em nome da Liberdade, da Igualdade e da Fraternidade.

Mais tarde, o socialismo não deixaria de acentuar o carácter ambíguo e individualista dos termos. Liberdade de quê, e para quê?


No centenário da independência dos Estados Unidos da América, em 1876, a França ofereceu aos americanos a Estátua da Liberdade que está implantada numa ilhota à entrada de Nova Iorque com um facho aceso na mão, para iluminar o mundo.

A factura da energia consumida por tão intensa iluminação tem sido elevada. Desde a longínqua prisão da Rainha Lili'uokalani à anexação das ilhas Hawai aos Estados Unidos da América em 1898; passando pelo embargo a Cuba após 1959, onde brilha esse outro monumento à liberdade que dá pelo nome de Guantánamo; à “libertação” do Iraque em 2003; à “ajuda ao povo afegão contra o terrorismo taliban”; à “libertação” do povo líbio da tirania de Khadafi, etc., etc., etc.

Bem vistas as coisas, que diferença é que isto faz da iluminação do “Sol da Terra” – no dizer do Senhor Dr. Cunhal - bombado por Lenine, Estaline & Sucessores? Que diferença faz o fim dado a Imre Nagy e o de Saddam Hussein e Moamar Kadafi? Provavelmente a diferença de cor dos uniformes do Pacto de Varsóvia e da NATO.

Por um estranho efeito do equilíbrio da balança de poderes no tempo da “guerra fria”, o “mundo livre” parecia respirar mais liberdade do que após o desaparecimento da “cortina de ferro”. Dir-se-ia que o fantasma do “totalitarismo” funcionava como vacina contra a “tentação totalitária” nos países do “Ocidente”. O regime de Fidel de Castro serviu de anti-vírus à contaminação dos países capitalistas. E Portugal, dos tempos do PREC, chegou a ser equacionado no laboratório mental do Senhor Henry Kissinger como dose de reforço para combater o perigoso vírus que dava pelo nome de Santiago Carrillo, em Espanha; Georges Marchais, em França; Enrico Berlinguer, em Itália; Charilaos Florakis, na Grécia.

A implosão da União Soviética foi um revigorante poderoso para o capitalismo neo-liberal que, de mansinho primeiro, tem hoje as garras ferozes ao ataque do mundo. Comanda o sistema financeiro internacional com voracidade insaciável. Faz tábua rasa da soberania dos Estados. Manipula as lideranças políticas como marionetas. Marionetas que já não são caricaturas dos políticos. São os próprios políticos. Eles mesmo.

O desabar da União Europeia, no dizer do dissidente soviético Vladimir Bukovsky, seguir-se -à à implosão da União Soviética. Pelos mesmos motivos. Um governo não eleito e politicamente impune. Um Parlamento Europeu que faz lembrar o Soviete Supremo. Centenas de milhares de eurocratas com vencimentos, prémios e privilégios elevadíssimos. A União Soviética foi criada sob coacção, muitas vezes pela ocupação militar. A União Europeia tenta sobreviver pelo constrangimento e pelo terror financeiro e económico. A União Soviética quis amalgamar as nacionalidades numa identidade única: o povo soviético. A União Europeia quer amalgamar as nacionalidades numa única identidade: o povo europeu. A União Europeia, no entender de Bukovsky, é o velho modelo soviético vestido à moda ocidental.

Para que servem os governos dos países da União Europeia? Para defenderem os povos dos seus países, ou para serem meros “feitores” do sistema financeiro na opressão e empobrecimento dos seus concidadãos?

Governos para o quê?

Os belgas terão encontrado o caminho. Com um deficit considerável e uma dívida pública maior do que a portuguesa, a economia belga é das que mais tem crescido na zona euro. Sem governo por mais de um ano ou, melhor dizendo, com um governo de gestão que não tem poderes para ordenar medidas de austeridade.

Como escrevia Rui Tavares, Deputado Independente ao Parlamento Europeu, “A Bélgica tornou-se assim num inesperado caso de estudo para a teoria anarquista. Começou por provar que era possível um país desenvolvido sobreviver sem governo. Agora sugere que é melhor viver sem ele”. E concluía: “Nenhuma boa ideia sai dos nossos governos. E as pessoas começam a perguntar-se para que servem eles”.

É bem provável que, nos tempos que correm, o valor da Liberdade deixe cair as máscaras que lhe têm posto. Varra de vez os opressores. E a Liberdade se assuma plenamente Libertária.

Jornal Ponto Final: Macau, 16 de Novembro de 2011. 

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