A Língua Portuguesa no Oriente:
De Língua Franca a Língua das Cristandades Crioulas – o preconceito contra as línguas crioulas
II Crossings Brasil
Universidade de S. Paulo, 27 a 31 de Julho de 2015
Jorge Morbey
Professor convidado na Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau
1.
A língua portuguesa, as línguas
orientais e as cristandades crioulas
lusófonas
A
abordagem deste tema será sempre redutora se não incluir as formas por que a língua
portuguesa se metamorfoseou e sobrevive, de geração em geração, desde o século
XVI, como um dos dois pilares em que assenta a identidade das Cristandades Crioulas
Lusófonas no Oriente[1].
A filologia ensina que as línguas se alteram
inevitavelmente por acção de dois factores: o tempo e o espaço.
Ninguém contesta que nos Açores se fala português, apesar das diferenças existentes de ilha para ilha e das dificuldades sentidas pelos portugueses do Continente em perceberem os seus compatriotas insulares.
Do mesmo modo, não sofre contestação que no Brasil se fala português, não obstante alguma dificuldade dos brasileiros entenderem o português falado em Portugal que é tanto maior quando falado mais depressa.
No Brasil, ao contrário do que se passou nos Açores e na Madeira, o português travou contacto com outras línguas veículadas por índios e africanos dando-se o fenómeno que em filologia se conhece por lei da interinfluência que, naturalmente, é responsável por alterações mais profundas da língua.
Apesar disso, muitos portugueses do Continente reconhecem sentir mais
dificuldades em entender o português falado pelos açoreanos do que o português
falado pelos brasileiros.[2]
Os crioulos são fenómenos derivados da lei da interinfluência e do déficit de contacto com a língua padrão. Daquela lei resulta principalmente a simplificação da estrutura gramatical da língua padrão. O déficit de contacto advém de simples isolamento ou de escassez de pressão da língua padrão enquanto expressão de domínio económico.
Designam-se por crioulos de base portuguesa aqueles cujo léxico é, na sua maioria, de origem portuguesa. Mas podem encontrar-se crioulos com outras origens: de base inglesa (o Krio da Serra Leoa), de base francesa (o crioulo das Seychelles), de base árabe (o Kinubi do Uganda e do Quénia) e outros.
“Língua portuguesa padrão” e “crioulos de base portuguesa” são partes integrantes de um conceito patrimonial da Língua Portuguesa.
Em 1711,
Charles Lockier escreveu:
"Os Portugueses podem
justamente reclamar que criaram uma espécie de língua franca em todos os
portos marítimos na Ásia, de grande utilidade para outros europeus que teriam
dificuldades em muitos lugares para serem compreendidos sem outros". |
“The Portuguese may justly claim they have established a kind of línguafranca in all the
sea-ports in Asia, of great use to other Europeans who would find it
difficult in many places to be understood without others.[3] |
Na verdade, a língua portuguesa implantou-se fortemente em regiões costeiras do Oriente, entre os princípios do século XVI e os meados do século XIX.
Em relatos dos missionários protestantes de Trangabar, na costa oriental, datados de 1733 regista-se: “Há três espécies de língua portuguesa na Índia: a pura, a meio- deturpada e a completamente deturpada. A primeira é falada principalmente pelos portugueses da Europa e pelos seus descendentes; a segunda é falada pelos indivíduos de origem mista: os pretos também se servem dela na sua correspondência. Caracteriza-a a sua conjugação incompleta. A terceira é falada geralmente pelos Portugueses de origem mista e sobretudo pelos completamente pretos. Difere da segunda em não ter conjugação./.../. Esta língua é imprópria para correspondência e muito mais para o discurso. Por isso os Portugueses pretos se servem da segunda quando oram a Deus. É também nesta que se exprimem os Ingleses, os Dinamarqueses, os Holandeses e os Franceses quando se não podem entender nas suas línguas respectivas, mas estes também se servem da primeira na sua correspondência, se a sua instrução o permite.[4]
Sendo cristãos, e os únicos europeus no Oriente durante um século, os portugueses, a sua língua e a sua religião, deram origem à sinonímia entre cristão e português, no Oriente.[5] [6] Em Malaca, por exemplo, Kristang significa simultâneamente ser católico e ser português. O seu conteúdo é simultâneamente religioso e étnico.
A partir do século XVII, com a chegada de outros povos europeus ao Oriente, tornou-se prática indispensável a existência de falantes de português a bordo das suas embarcações, nomeadamente holandesas, dinamarquesas e inglesas. Estes intérpretes eram designados por Lingoas ou Jurubaças. E, assim, a língua portuguesa ganhou o estatuto de língua de comércio, no Oriente.
O prestígio de Portugal e da língua portuguesa no Oriente conferiu-lhe também o estatuto de língua de prestígio, pelo seu uso como língua diplomática.
Isso é testemunhado pelo segundo Tratado de Amizade e Comércio entre o Sião e o Reino Unido, de 31 de Junho de 1826, redigido em siamês, inglês, malaio e português[7].
Também o primeiro Tratado de Amizade e Comércio entre o Sião e os Estados Unidos da América, de 20 de Março de 1833, além das línguas siamesa e inglesa, foi redigido em chinês e português:
Do prefácio do tratado consta o seguinte parágrafo: O presente Tratado é celebrado na quarta-feira, a última do quarto mês do ano 1194, chamado Pi-Marong-chat-tavasok, ou o ano do Dragão, correspondente ao dia 20 de Março, no ano de nosso Senhor de 1833. Um original está escrito em Siamês, o outro em Inglês; mas como os siameses são ignorantes do Inglês, e os norte-americanos do Siamês, uma tradução em Português e outra em Chinês são anexadas, para servir de testemunho do conteúdo do Tratado. O conteúdo é do mesmo teor e data em todas as línguas acima mencionadas. É assinado por um lado, com o nome do Chau Phaya-Phraklang, e selado com o selo da flor de lótus, de vidro. Por outro lado, é assinado com o nome de Edmund Roberts, e selado com um selo que contém uma águia e estrelas.[8]
A pujança da língua portuguesa era tal que os holandeses, ainda no século XVI, em 1596, assinaram um Tratado de Paz e Comércio com o governador do reino de Bantam, Java, em língua portuguesa, contra os interesses dos portugueses.
A natureza missionária da Religião Católica e a vocação ecuménica dos povos ibéricos, que protagonizaram a primeira globalização, projectaram os jesuítas das Missões Portuguesas no Oriente na nobre missão de dar conteúdo científico à comunicação entre as línguas orientais e a língua portuguesa, nos primeiros estudos linguísticos dos idiomas asiáticos feitos por europeus e na elaboração de silabários, vocabulários, léxicos e dicionários.
As notas abundantes tomadas na fase de aprendizagem das línguas orientais constituíram fontes essenciais de que os jesuítas se socorreram para a elaboração dos primeiros estudos linguísticos luso-asiáticos.
Apresenta-se uma lista contendo cerca de tres dezenas e meia de dicionários e outros trabalhos linguísticos que estabelecem a relação entre a língua portuguesa e as línguas orientais, entre 1588 e 1999:
Dicionário Português-Chinês, de Matteo Ricci e Michele Ruggieri, ca. 1588[9];
Dictionarium Latinum Lusitanum ac Japonicum ex Ambrosi Calepini volumine depromptum, Amacusa, 1595[10];
Vocabulário da língoa de lapan com a declaração em Portugues, feito por alguns padres, e irmãos da Companhia de lesu. Com licença do Ordinario & Superiores em Nangasaqui no Collegio de lapan da Companhia de Jesus. Anno 1603[11];
Arte Breve da Língoa Japoa, do Padre João Rodrigues S.J., em 1620.
Dictionarium Annamiticum Lusitanum, et Latinum, editado em Roma, em 1651[12];
Dicionário da Língua Siamesa, do Padre Tomás Valguarnera, ca. 1670[13];
Dicionário Tamil-Português, de Antão de Proença (1679);
Léxico Português-Malaio (ca. 1700)[14];
Vocabulário dos termos usados pelos portugueses de Macau, 1751[15];
Arte China Constante de Alphabeto e Gramática, do Padre Joaquim Affonso Gonçalves, C.M., Macau, 1829;
Diccionario Portuguez-China,do Padre Joaquim Affonso Gonçalves, C.M., Macau, 1831;
Diccionario China-Portuguez,do Padre Joaquim Affonso Gonçalves, C.M., Macau, 1833;
Diccionario Komkani-Portuguez, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Bombaim, 1893;
Hitopadexa ou Instrucção Útil (tradução de Hitopadesa do Sânscrito original para Português, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado). Lisboa, 1897;
Dialecto Indo-Português de Ceylão, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Lisboa 1900;
Dialecto Indo-Português de Goa, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Porto, 1900;
Dialecto Indo-Português de Damão, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Lisboa, 1903;
Diccionario Portuguez- Komkani, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Bombaim, 1905;
Dialecto Indo-Português do Norte, (Dialecto Indo-Português de Bombaim e seus suburbios), de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Lisboa, 1906;
Influênia do Vocabulário Português em Línguas Asiáticas, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Coimbra, 1913;
Contribuição para a Lexicologia Luso-Oriental, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Coimbra, 1916;
História de Nala e Damyanti (tradução do Sânscrito original para Português, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Coimbra;
Dialecto Indo-Português de Negapatam,de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Porto, 1917;
Glossário Luso-Asiático, de Sebastião Rodolfo Dalgado, I Vol. Coimbra 1919, II Vol. Lisboa, 1921;
Rudimentos da Língua Sânscrita, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, 1920;
Glossário Luso-Asiático, de Sebastião Rodolfo Dalgado, I Vol. Coimbra 1919, II Vol. Lisboa, 1921;
Florilégio de Provérbios Concanis, de Sebastião Rodolfo Dalgado, Coimbra, 1922;
Dicionário Chinês-Português de Análise Semântica Universal do Padre
Joaquim A. de Jesus Guerra, S.J., Macau, 1981.
Dicionário Conciso Português-Chinês,
de Zhou Hanjun, Zhao Hongling, Cui Weixiao, Wang Zengyang, Pequim, 1992.
Dicionário Português-Tailandês e
Tailandês-Português, de Joana Vasconcelos e Pralom Boonrussamee, Bangkok,
1999.
O resultado de três séculos de convivência da língua portuguesa com as línguas orientais salda-se na existência de algumas bolsas de crioulos lusófonos na região do Indico e do Pacífico[16], na adopção de vocábulos portugueses pelo léxico das línguas orientais, em número variável que atinge a ordem das centenas no japonês, no malaio e no tamul[17], e na recepção de vocábulos das línguas orientais no léxico português.
2. A recriação do português: os crioulos de base portuguesa
A curiosidade e o interesse científico pelas línguas orientais, com as quais o português se relacionou, não aconteceram relativamente às formas em que a própria língua portuguesa se metamorfoseou e se recriou por esse mundo fora, excepção feita aos crioulos indo-portugueses[18] e ao crioulo de Cabo Verde[19].
Na verdade, os crioulos, historicamente, foram objecto de preconceito generalizado dos falantes do português padrão, de ridicularização, de chacota, de repressão e de perseguição política.
Lembro-me bem dos meus tempos de infância na minha ilha natal - S. Vicente, Cabo Verde - quando, no seio das famílias mais próximas dos padrões culturais portugueses-europeus, se reprovava o emprego de expressões do crioulo que involuntariamente entremeavam um discurso que se pretendia obediente às normas do português padrão[20]; a pressão exercida junto das criadas para não falarem senão em português com os meninos; a remissão feita pelos professores para o modo de exprimir e os conhecinentos directos sobre Portugal daqueles que tinham lá permanecido vários meses, em gozo de licença graciosa do progenitor[21]; a repressão do uso do crioulo nos intervalos das aulas; a estúpida identificação, pela polícia política, do crioulo a propósitos anti-portugueses e independentistas; enfim, toda uma atmosfera que visava cultivar a pureza do português e que tinha por resultado, muitas vezes, que o cordão sanitário contra a “contaminação” pelo crioulo resultasse razoavelmente até à idade de ingresso na escola primária. Aí, aprendiam-se as matérias leccionadas. Umas melhor, outras pior. Onde, porém, se registava melhor aproveitamento era na aprendizagem do crioulo, excelentemente treinado no recreio e nos percursos entre a casa e a escola...
Desde o séc. XV, os contactos dos portugueses com os povos da costa da Guiné propiciaram a existência de negros em Portugal. A escravatura era uma instituição existente em África desde tempos imemoriais. Esses africanos, esforçando-se para comunicar em português, usavam a chamada "Língua de Preto". Entre os próprios negros a designação usada era "Falá Guinee". O documento mais antigo, até agora encontrado, do "Falá Guinee"está no Cancioneiro Geral de Garcia de Resende, editado em 1516.É um poema escrito por um oficial da côrte, Fernam da Silveira[22], datado de 1455:
A mim rei de negro estar Serra Lioa,
lonje muito terra onde viver nós,
lodar caitbela[23], tubao
de Lixboa,
falar muao[24]
novas casar pera vós.
Querer a mim logo ver-vos como vai;
leixar molher meu, partir muito sinha,
porque sempre nós servir vosso pai,
folgar muito negro, estar vos raínha.
Aqueste gente meu taibo, terra nossa
nunca folgar, andar sempre guerra,
nam saber qui que balhar terra vossa,
balhar que saber como nossa terra.
Se logo vos quer mandar, a mim venha
fazer que saber, tomar que achar,
mandar fazer taibo lugar, Des mantenha!
e logo meu negro, Senhora, balhar. (RESENDE: I: 194:195)
Outro documento que se encontra no Cancioneiro Geral de Garcia de Resende é
de autoria de Anrique da Mota[25] e
contém um diálogo entre o patrão branco e a criada negra, sobre uma pipa de
vinho que se entornou:
... ... ... ... ...
Fala com a sua negra.
- Oo perra de Manicongo,
Tu entornaste este vinho!
Ũa posta de toucinho
t’hei-de de gastar nesse lombo!
- a mim nunca, nunca mim
Entornar,
mim andar auguá jardim,
a mim nunca sar roim,
porque bradar?
- Se nam fosse por alguem,
perra, eu te certefico
bradar com almexerico,
Alvaro Lopo também.
- Vós logo todos chamar,
vós beber,
vós pipo nunca tapar,
vós a mim quero pingar,
mim morrer!
- Ora, perra, cal-te ja,
Senam matar-t’-ei agora!
- Aqui star juiz no fora,
A mim logo vai té laa.
Mim tambem falar mourinho
sacrivam,
mim nam medo no toussinho,
guardar nam ser mais que vinho,
creligam (RESENDE: IV: 164:165)
... ... ... ... ...
No século XVI,
Gil Vicente (1461-1467 / 1536) em algumas das suas obras teatrais reproduz o "Falá Guinee", através de um personagem negro-africano: Fragoa d'amor (ca. 1524)
e Nau
d'amores (1527).
“Fragoa d'amor” (ca. 1524):
... ... ... ... ...
Poro que perguntá bos esso?
Mi bem la de Tordesilha;
que tem bos de ber co'esso,
qu'eu bai Bastilla, qu'eu bem Castilla? ...
... ... ... ... ...
“Nau
d'amores” (1527)
onde intervém um negro de Beni que quer ser tão galanteador como os brancos da Côrte e cuja comicidade é conseguida pelo modo impróprio como se exprime em português, no relato das suas desventuras:
quere boso que mi bae
buscaro poco de venturo
que a mi namoraro sae
de moça casa sua pae
que tem saia verde escuro
firalga masa de gavião
em boquinho tão sentira
eu chamar ele minha vira
e ele chama-mo cão
Apesar de filho de
rei (do Benim) é cómico o contraste entre a humildade com que se dirige à sua
amada e a altivez das respostas desta:
a mi disse a ele, Maria
que quebranta foi a meu
e na mão minha barete
mi risse a ela, minha rosa
minho oio de saramonete
más aturo mundo faramosa
falai-me por o bida bosso
ela disse, quesso cabrão
a riabo que te ro cão
Como os demais personagens,
procura a felicidade na nau:
Benturo quero buscai
Esse sancto caravela
Se bosso seoro mandai
Mas é na farsa de Gil Vicente intitulada “O Clérigo da Beira” (1526) que o negro e o seu modo de falar português ganham o apogeu da comicidade.
A comicidade
decorre do preconceito de que a expressão verbal de determinados grupos é
inferior à norma. Por outro lado, para legitimar a escravidão, atribuíram-se aos
negros características negativas. A despeito da intenção cómica ou crítica, a
expressão verbal do negro é assumida, na Renascença e no Barroco, como o avesso
da norma, e estrutura-se entre estereótipos e preconceitos. (Ver um excerto d’ O
Clérigo da Beira no apêndice A)
Veja-se esta Salvé Raínha posta na boca do Negro da farsa,[26] para
fazer rir a assistência:
"Falá Guinee" |
Latim |
Português |
Sabe à regina matoa
misercoroda nutra d’hum cego sável até que vamos. A
oxulo filho d’egoa alto soso peamos
ja mentes ja frentes vinágre qu’elle
quebrárão embalde ja ergo a quarte nossa ha ilhos tue busca cordas oculos nosso convento e geju com muito
fruta ventre tu ja tremes ja pias.
Seuro santa Maria dinhero me lá
darão que é vê esa carta dame mucho que furte cantara Furunando. |
Salve, Regina, mater
misericordiae, Vita, dulcedo, et spes nostra, salve.
in hac lacrimarum valle. Eia ergo, Advocata nostra,
Et Iesum, benedictum
fructum ventris tui,
Ut digniefficiamur promissionibus Christi. Amen. |
Salve Rainha, Mãe de Misericórdia, Vida, doçura e esperança nossa, salve!
neste vale de lágrimas.
E, depois desse desterro,
Mostrai-nos Jesus, bendito fruto do Vosso Ventre.
|
O preconceito contra as formas crioulas da língua portuguesa não tem escolhido tempo nem lugar privilegiado. Tanto desponta de um eurocentrismo racista, como brota neste magnífico mosaico étnico-cultural que é o Brasil, ou se manifesta no próprio seio de cristandades crioulas.
Deste lado do Atlântico registámos a opinião do
filólogo brasileiro Serafim da Silva Neto: “Os
falares crioulos são bastardos, irremissivelmente identificados com a mísera
situação dos falantes”.[27]
Esta visão dos crioulos é preconceituosa e parcial. Fixa-se no “crioulo, língua de escravos” ou nos crioulos dos estratos mais desfavorecidos de sociedades coloniais ou pós-coloniais. Esquece-se, todavia, que a “língua franca” que foi usada por todo o litoral do Oriente - por povos locais e europeus - e que tanto prestigiou Portugal por mais de dois séculos, outra coisa não era que um complexo de falares crioulos. E que foi esse português crioulo, e não o português padrão, a língua que tem permanecido mais duradouramente não só em comunidades de luso-descendentes pobres como Malaca, mas também entre outras bem prósperas como a de Hong Kong.
Valha-nos o Prof. Celso Cunha em “O Protocrioulo Português: Sua formação e
Sua Universalidade nos Séculos XVI, XVII e XVIII”, quando afirma: “tidos largo tempo como cicatrizes,
degenerescências linguísticas, sem força criadora; não sistemas entre si, mas
amálgamas ou desvios de outros sistemas” são conceitos que “como bem salienta Dell Hymes, se juntam a outros, numerosos, com
que o colonizador europeu procurou estigmatizar sempre as formas
culturais do colonizado”.
Do outro lado do Atlântico não temos estado melhor. Em 1844 escrevia Lopes de Lima, sobre o Crioulo de Cabo Verde: “crioulo... (giria ridícula, composto monstruoso de antigo Portuguez, e das Línguas da Guiné, que aquelle povo tanto présa, e os mesmos brancos se comprazem a imitar)...[28]
No extremo oriente, o Bispo de Macau, D. Alexandre Pedrosa Guimarães, em carta ao Rei D. José I, de 22 de Dezembro de 1774, refere que as mulheres macaenses “falam uma linguagem, que é mistura de todos os idiomas e gírias, imperceptível aos que não são criados no país, por culpa dos maridos e pais de família, que há dois séculos não cuidaram em introduzir o idioma português correcto.../.
O professor régio José dos Santos Baptista e Lima, natural de Alpedriz, Batalha, Portugal, em carta enviada à futura Raínha D. Maria I, escrita em 1775, ano em que chegou a Macau, a 23 de Abril, a bordo da fragata Nossa Senhora da Penha de França, informava que a língua portuguesa era ignorada totalmente pelos nacionais de Macau, “que só fallavão um idioma mixto de portuguez e chino corrupto”, a tal ponto que necessitava muitas vezes de intérprete para saber o que diziam os seus alunos. Sem indicação expressa de se tratar do crioulo macaense, não há dúvidas que o autor da carta se referia ao patuá de Macau. Mas cometeu um erro de recém-chegado ao designá-lo por idioma mixto de portuguez e chino corrupto.
Manuel da Silva Mendes,
natural do distrito do Porto, licenciado em direito, professor de Português e
Latim no Liceu de Macau durante vinte e cinco anos, escreveu em 1920 que nas
escolas de Macau “a matéria mais ingrata
de ensinar é a língua portuguesa e deitava as culpas para cima do patois macaísta [que] não é senão um português estragado pelo
contacto com a língua chinesa” (Macau
– Impressões e Recordações, 1979). Cometeu o mesmo erro que o professor
régio que escreveu à Raínha D. Maria I e a que se fez referência anteriormente.
Vejamos em seguida como e porquê as nossas
cristandades crioulas lusófonas se deixam contagiar pelo preconceito herdado
pelos portugueses, desde Gil Vicente:
Tenho visitado Malaca, vezes sem conta, desde 1985.
Procuro sempre falar com as pessoas da Cristandade Crioula de Malaca no meu Crioulo, esperando que o diálogo se faça em papiá-cristão de parte delas. Nunca consigo que o diálogo nos dois crioulos se prolongue. Há sempre qualquer coisa que os faz mudar para inglês. Às tantas cheguei a admitir que fosse o meu aspecto fisico a despertar algum sentimento colonial anti-britânico adormecido.
Descobri a causa em Damão.
Visitei Damão, em Fevereiro de 1989. Num almoço, em casa de uma família damanense, perguntei à dona da casa:
- Aqui em casa não se fala crioulo?
- Não, respondeu. E, após uma pausa, acrescentou:
- Temos uma criada hindú que fala. Se quiser,
depois do almoço, poderá ir à cozinha falar com ela.
Logo que terminou o almoço fui à cozinha. A criada
hindú correspondeu inteiramente ao meu desejo de falar crioulo com ela. Às
tantas, perguntei-lhe, em crioulo da minha ilha natal:
- Aqui em casa, só você fala crioulo?
- Não, respondeu, em crioulo de Damão. Todos falam.
Mas têm vergonha de falar à frente de visitas de fora, porque acham que crioulo
é língua de gente pobre.
O preconceito contra os crioulos desenvolveu-se mais nas regiões onde coexistiram longamente com o português-padrão veículado pelo poder exercido pelas autoridades coloniais portuguesas: Cabo Verde, Guiné-Bissau, S. Tomé e Príncipe, Damão, Diu e Macau.
Nas cristandades crioulas das
demais regiões – Índia, Sri-Lanka e Indonésia – os respectivos crioulos
seguiram o seu próprio destino e os seus falantes chegaram a intermediar as
relações entre os agentes dos poderes coloniais holandês e britânico e as
populações locais circundantes cujas línguas essas cristandades crioulas
dominam também.
No fim de contas, o crioulo e a religião católica são
os dois pilares principais sobre que se ergueram as identidades colectivas das
Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente.
3.
A identidade colectiva das cristandades crioulas lusófonas do Oriente
A transferência de domínios coloniais entre países
europeus – de Portugal católico para a Holanda protestante, principalmente -
constituiu o pano de fundo em que emergiram as Cristandades Crioulas Lusófonas
do Oriente.
Com a substituição da dominação portuguesa pela
holandesa, permanecendo nas terras que as viram nascer, deportadas para outras
paragens, ou forçadas à emigração, essas comunidades mestiças talharam a sua
identidade própria que perdurou até aos
nossos dias, assente em dois pilares principais: a religião católica e a língua
crioula.
A religião católica fora trazida pelos portugueses,
directamente de Portugal ou através de Goa – a Roma do Oriente. Convertidos ou nascidos nela, com ela haveriam de
morrer, geração após geração.
A sua língua – o crioulo - era a língua portuguesa na
formulação que lhe garantira o estatuto de língua
franca no litoral da Ásia e da Oceania, desde o Século XVI até à sua
substituição pelo inglês, no Século XIX. Holandeses, ingleses e
dinamarqueses não podiam prescindir de
um “língoa” ou “jurubaça” [intérprete] a bordo para poderem comerciar nos portos
do Oriente, na língua que era - nada mais, nada menos – aquela que as
Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente falavam e, muitas delas, ainda
falam. Tratados, entre esses países europeus e alguns poderes locais, foram
firmados em português, por ser a única língua a que os europeus podiam recorrer
para comunicar no Oriente, ainda que contra os interesses portugueses.
A forte identidade das Cristandades Crioulas Lusófonas do
Oriente cimentou-se em grande parte na adversidade. O conflito religioso
nascido na Europa, entre católicos e protestantes, ramificou-se por todas as
paragens do Oriente onde o poderio holandês derrubou o de Portugal e se firmou.
A profanação e a destruição de igrejas e mosteiros, a expulsão dos padres, a
proibição de qualquer acto de culto católico, as deportações maciças, a redução
de muitos à condição de escravos, compeliram os membros dessas cristandades à
clandestinidade, à resistência e à emigração: Macau, Índia, Insulíndia, Sião e
Indochina foram os seus destinos principais.
Os que teimavam em ficar, escondidos em suas casas ou
refugiados nas florestas, celebravam como podiam os actos de culto da religião
católica. Sem padres e sem igrejas, organizaram-se em irmandades clandestinas
que, ao fim de décadas, produziram fenómenos de cristalização cultural, de
natureza religiosa - e linguística – que impediriam, por séculos, a sua plena integração nas paróquias
criadas posteriormente. Tais irmandades permaneceram até aos nossos dias e
conservam determinadas prerrogativas que limitam a autoridade dos párocos, o que é visível em algumas
celebrações onde os sacerdotes se limitam à Eucaristia e à Confissão dos fiéis
porque, em tudo o mais, quem manda é a Irmandade.
Quando a dominação holandesa foi substituída pela
inglesa, as Comunidades Crioulas Lusófonas do Oriente foram ficando menos
oprimidas e, em alguns casos, foram as próprias autoridades coloniais britânicas
a tomar a iniciativa de lhes facultar padres portugueses.
Perdida a confiança que a Santa Sé depositara desde o
Século XV em Sua Magestade Fidelíssima o Rei de Portugal, na sequência do corte
de relações diplomáticas, por iniciativa do Governo liberal, em 1833, e a
extinção das ordens religiosas, por decreto de 31 de Maio de 1834, o Padroado
Português do Oriente sofreu um golpe mortal, na Índia, no Ceilão - hoje
Sri-Lanka -, no Sudeste Asiático, na China e na Oceania. Permanecendo - os que
podiam - nas suas missões, os missionários do Padroado não seriam substituídos
pelos seus confrades. O clero secular de Goa, numeroso e bem preparado, acorria
em socorro das Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente que iam ficando sem
religiosos. Quase sempre em vão. Os missionários da Propaganda Fidae e das
Missions Étrangères de Paris já as ocupavam e os respectivos vigários
apostólicos impediam-lhes o exercício do seu múnus. A expansão missionária
francesa no Oriente começara ainda no século XVII.
As Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente -
gente simples e temente a Deus - mantidas na ignorância dos conflitos entre
Portugal e a Santa Sé, lutaram anos sem fim contra as novas autoridades
eclesiásticas com quem conflituavam abertamente e às quais consideravam
estrangeiras. Durante décadas pagaram o elevado preço de lhes serem recusados
os sacramentos a que só esporadicamente tinham acesso quando aportava um navio
com um sacerdote, ainda que espanhol. Clamaram sempre pelo envio de clero. De
Portugal, de Goa ou de Macau. Em vão.
A firme identidade das Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente, ainda hoje, evita o casamento dos seus membros com indivíduos exteriores a elas e prefere que os futuros cônjuges provenham do seu seio ou de outras cristandades, ainda que distantes. Quando assim não acontece e o casamento une um membro da Comunidade a alguém que a ela não pertence, a regra é a conversão deste à religião católica e a aprendizagem da língua crioula.
Algumas dessas comunidades fruem um status social digno nos países onde vivem. Outras, porém, são socialmente desqualificadas e os seus membros são depreciativamente designados por “negros”, apesar da sua côr mais clara - da pele, do cabelo e dos olhos - relativamente aos naturais com outras origens étnicas. É o que acontece na Birmânia/Myanmar.
A nível individual, nos países onde vivem, podem encontrar-se indivíduos originários destas comunidades nos mais elevados estratos da sociedade: do mundo da política à actividade empresarial, nas mais elevadas funções da hierarquia eclesiástica ou como simples párocos de aldeia. Onde se verifique a existência de uma significativa percentagem de membros destas comunidades no clero católico, isso parece resultar da intensa discriminação de que são objecto no acesso ao ensino público e ao mercado de trabalho, público e privado. Em geral, dedicam-se a actividades modestas. São pequenos proprietários, simples trabalhadores agrícolas ou pescadores.
Mas a língua crioula falou-se também nas Cristandades
Crioulas Lusófonas da Tailândia – Ayutia e, posteriormente, Bangkok - até aos anos 50 do Século XX, onde
permanecem vocábulos de uso corrente no relacionamento familiar e nas práticas
da religião católica. Na Indonésia, além de Java, na ilha das Flores [Larantuka
e Sikka], nas ilhas de Ternate e Tidore e em Bali. Em Timor [Lifau e Bidau]. No
Bangladesh - Chittagong e Dhaka – até
aos anos 20 do século XX era muito viva a presença da língua crioula nas
Cristandades locais. Numa breve passagem
de poucas horas em Dacca pude certificar-me da existência de léxico crioulo
entre os católicos locais.
A pequena Cristandade Crioula Lusófona de Korlai [junto a
Chaúl], na Índia, somente em 1982 seria revelada ao Mundo por Laurentiu Theban.
O seu crioulo é designado por Kristi.
A Cristandade Crioula Lusófona da Birmânia – Myanmar
actualmente – já não usa a língua crioula e, ao contrário das demais, perdeu
com o tempo os próprios nomes e apelidos cristãos, apesar de permanecer fiel à
religião católica.
Com a descolonização das antigas colónias portuguesas de
África foi restituído aos seus povos o direito de decidirem sobre as suas
línguas nacionais. Em todas elas o português foi adoptado como língua oficial,
ao mesmo tempo que se reconheceu expontânea dignidade às línguas maternas dos
seus povos.
As Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente,
substituído o domínio português, permaneceram sob domínio colonial europeu que
as hostilizava ou, pelo menos, não dignificava. Assim permaneceram até à independência dos países em que se encontram,
onde constituem minorias com reputação variável em cada um deles. Por naturais
razões de unidade do Estado, esses países mantiveram como língua oficial o
inglês – a língua do último colonizador – e privilegiam uma ou mais das suas
línguas maternas como língua nacional.
O poder colonial inglês não descolonizou as Cristandades
Crioulas Lusófonas do Oriente, no sentido de restituir dignidade à sua
identidade colectiva, de que a língua crioula faz parte integrante, o que,
aliás, não era de esperar. Nem é de esperar que os poderes pós-coloniais de motu proprio venham a dedicar-lhes a
atenção a que têm direito.
A incapacidade de Portugal nesta matéria tem sido uma
evidência secular, filha da ignorância e do preconceito.
4. Línguas Crioulas: unidade ou diversidade?
Afirmou um
linguísta cujo nome não declino que os crioulos nada têm a ver uns com os
outros.
Não posso
deixar de nutrir o maior desacordo por semelhante afirmação. Se eu dialogo, no
meu Crioulo natal, com falantes dos outros crioulos, da costa ocidental de
África, da India, do Sri Lanka ou do Sudeste Asiático, sem dificuldade. Se nas nove ilhas povoadas de
Cabo Verde há falantes do crioulo de Santiago que dizem não entender patavina
do crioulo da ilha de Santo Antão, e falantes do Crioulo da ilha de S. Vicente que
acham o Crioulo da ilha do Fogo muito difícil de entender, a questão não se
coloca em termos de diversidade entre crioulos que nada têm a ver uns com os
outros.
Se
os próprios crioulos são fenómenos
derivados da lei da interinfluência e do déficit
de contacto com a língua padrão, é óbvio que a interinfluência de que foi
objecto o Crioulo da Guiné é produto do contacto do português com as línguas
africanas faladas naquela região, do mesmo modo que os crioulos do Oriente são
produto da interinfluência entre línguas orientais e o português.
O
peso da religião católica na vida das Cristandades Crioulas, em África e no
Oriente, por via da catequese e demais práticas religiosas, terá constituído
factor decisivo para robustecer a componente cultural portuguesa/católica
nessas Cristandades.
A
questão da unidade das línguas crioulas não se coloca aos falantes de um dos
crioulos no diálogo com falantes de outros crioulos. Ela é posta em dúvida ou mesmo
negada pelos que não são falantes de um dos crioulos desde criança.
Quem
aborda os crioulos por via de amostras recolhidas, habitualmente escassas,
enfrenta as maiores dificuldades. Pelo seguinte: entre os crioulos do Oriente,
o Crioulo do Sri Lanka é aquele que tem gerado maior produção de transcrições
efectuadas desde o tempo colonial.
A
influência portuguesa no Sri-Lanka teve início no início do século XVI e
manteve-se cerca de cento e cinquenta anos, até ao início da ocupação holandesa
em 1658. Em 1796, os ingleses ocuparam as regiões
costeiras que acabaram por lhes ser cedidas formalmente pelos holandeses em 1802. A ilha de Ceilão
foi integrada no Império Britânico até à independência, em 1972.
Assim,
boa parte das recolhas do crioulo do Sri Lanka a que há acesso, são grafadas, a
partir de fontes orais, segundo a ortografia da língua holandesa ou do inglês.
Mas
o Crioulo do Sri Lanka, apesar da substituição dos portugueses pelos holandeses
nos meados do século XVII, manteve a matriz da língua portuguesa dos séculos
XVI e XVII, até aos nossos dias, mesclada com léxico cingalês, com reduzida presença do léxico inglês e
escassíssimos vestígios do neerlandês. O mesmo acontece, aliás, nos crioulos da
Indonésia e de Malaca em que a sucessão dos poderes coloniais foi a mesma.
O
Prof. Kenneth David Jackson (Jackson:1990:35) dá alguns exemplos da
transcrição de palavras portuguesas com a utilização de ortografia holandesa (ou
inglesa):
Bonito: bonitoe,
bunitho,bunietoe, bonetoo, buneetoo, bunitoo;
Coração:
Korasang, korsáán, korasáán, corrassaan;
Devoção:
davasáán, davassan, thavassan;
Água: ahgoee,
agoe, agu, augu;
Vista: weeste,
wieste, veesta.
A
propósito do Manuscrito Nevill (Nevill Manuscript), o ilustre e respeitado
professor afirma:
Há
um interesse fonológico especial no manuscrito resultante do seu sistema
gráfico, ou aparente falta dele, em que a aplicação da ortografia de
influência holandesa em fala crioula produz uma aproximação mais precisa para
a pronúncia crioula no último quartel do século XIX do que fizeram as
transcrições por linguistas portugueses. Assim, os versos aqui apresentados
mostram menos contaminação do Português padrão, uma característica infeliz
dos investigadores europeus do passado. |
There is a special phonological
interest in the manuscript resulting from its graphic system, or seeming lack
of it, in which the application of Dutch-influenced orthography to creole
speech produces a more accurate approximation to creole pronunciation in the
last quarter of the nineteenth century than did transcriptions by Portuguese
linguists. Thus the verses presented here show less contamination from
standard Portuguese, an unfortunate characteristic of the European
researchers of the past. (Jackson:1990:38) |
No enorme respeito e admiração que tenho pelo Prof. Jackson assenta a minha discordância relativamente às suas afirmações seguintes:
a)
... a aplicação da ortografia
de influência holandesa em fala crioula produz uma aproximação mais precisa
para a pronúncia crioula no último quartel do século XIX do que fizeram as
transcrições por linguístas portugueses.
b)
... os versos aqui
apresentados mostram menos contaminação do Português padrão, uma característica
infeliz dos investigadores europeus do passado.
Enquanto falante de um dos crioulos, desde tenra idade, e com um grau de compreensão muito razoável dos outros crioulos com que tenho contactado, e, ainda, sendo absolutamente ignorante do neerlandês, a minha opinião é diametralmente oposta à do Prof. Jackson. As transcrições feitas com a aplicação da ortografia do neerlandês, serão certamente entendidas pelos falantes de crioulos que dominem também o neerlandês. A sua utilidade para quem não seja falante de nenhum crioulo é, obviamente, nula.
Talvez pelo hábito adquirido, desde a infância, de usar a ortografia portuguesa e, no ensino secundário, me ter familiarizado com as ortografias francesa e inglesa, as transcrições de textos em crioulo feitas com base na ortografia do neerlandês, dão-me a sensação de os deformarem e deturparem.
Por outro lado, sustentar que as transcrições constantes do Manuscrito Nevill mostram menos contaminação do Português padrão parece-me um lapso enorme, tendo em conta a origem histórica das línguas que intervieram na formação dos crioulos de base portuguesa.
Os holandeses chegaram ao Oriente um século depois dos portugueses. A influência directa dos portugueses decorreu entre 1505 e 1638 no Sri Lanka. Malaca esteve em poder dos portugueses entre 1511 e 1641. Quer a religião católica, quer os respectivos crioulos (de base portuguesa) tinham adquirido um grau de consolidação que nem o protestantismo, nem o neerlandês enfraqueceram. Antes pelo contrário. A repressão holandesa aos dois pilares principais da cultura das cristandades crioulas lusófonas – religião católica e crioulo – robusteceram-nos nessa adversidade.
De maneira que não me parece mesmo nada que:
a aplicação da ortografia de influência holandesa em fala crioula produz uma aproximação mais precisa para a pronúncia crioula no último quartel do século XIX do que fizeram as transcrições por linguístas portugueses.
nem que:
haja uma contaminação do Português padrão, uma vez que os crioulos de base portuguesa são precisamente filhos da convivência do português padrão com línguas africanas e orientais.
Vejamos a comparação de textos do Manuscrito Nevill com textos transcritos de outras origens, compilados pelo Prof. Jackson.
Manuscrito
Nevill |
Textos
transcritos de outras origens |
Rosa ne rosara |
Rosa na roseira (Dalgado, Norte) |
Pontia cavaloe Marra conda grandie Sie falta azatie Loda minhe sangie |
Amarai chendó grand Com ping du azeite Se não tem azeite, Butá
sangue do meu peit (Schuchardt,
Diu) |
Veeda da amoor Ja kai ne thenthasáán Ja larga minhe graya Ja perda davasáán |
Amor e paixam, Ta me cai na tentaçam Que largá minha igreya Depos a devoçam (Jackson, Field Notes) |
Amor nukoo da parmi Nee oen alagriya Laagri lastimadoe Anothy didiya |
Amor não me deu, Maquita Nenhuma alegria Senão lagre triste, Maquita De noite e dia (Schuchardt, Mahé) |
Marihana basoo de mangara Kee tha faeya Tha ganya Pankadoola |
Niguerinha baix de manguêr Qui tá fasê? Tá ganhá peccad (Quadros, Cartas de Diu) |
Sie Kerra canta Canta saen vargoiya Eau nuva Kappalla Per cuspi pessoya |
Si querré canta vers Cantá sem vergonh Eu não he cobr Que trize peçonh. (Schuchardt, Mangalore) |
(Jackson: 1990: 39 ss)
Conclusão
Os Crioulos de Cabo Verde, Guiné-Bissau e S. Tomé e Príncipe tornaram-se línguas nacionais dos respectivos países após a sua Independência, embora o Português tenha permanecido como língua oficial. Por compreensíveis razões de natureza política, os outros Crioulos tornaram-se línguas de minorias culturais.
O diferente estatuto político entre os Crioulos não priva aqueles que não são línguas nacionais do direito ao respeito e de receberem apoio dos governos dos países a cujo património cultural imaterial pertencem.
O robustecimento de cada Crioulo não é apenas, ou de todo, um assunto interno dos países onde são falados. Todos nós, falantes de Crioulo, temos o dever de iniciar um trabalho conjunto no entendimento da dimensão universal do nosso património comum.
Temos de unir as pontas desta teia tecida desde o século XV.
Devemos prestar homenagem a todos os crioulistas, de todas as nacionalidades, que nos legaram transcrições e outros materiais sem os quais o nosso património comum seria mais pobre.
Necessitamos reunir periodicamente os representantes das nossas comunidades para se conhecerem, para trocarem experiências e para inventariarem as nossas necessidades e as nossas capacidades.
Onde haja possibilidade de se criar uma cátedra de Crioulo, enderecemos-lhe o nosso apoio.
Até que isso aconteça, tiremos partido dos avanços registados nos meios de comunicação, dando início à recolha, gravação, transcrição e divulgação dos nossos crioulos, pela internet.
Por que não sonhar com grandeza? Estamos em S. Paulo, na maior cidade do mais populoso país de língua portuguesa, o Brasil!
[1] O outro pilar é a Religião Católica Romana.
[2] Esta situação pode ser verificada na telenovelaXailes Negros produzida pela Rádiotelevisão Portuguesa dos Açoresem1986:
www.acorestube.com/video/7878/Xailes-negros.
[3]LOCKYER, Charles:”An account of the trade in India: containing rules
for good government in trade, price
courants and tables...” London. 1711.
[4]LOPES, David: “A Expansão da Língua Portuguesa no Oriente Durante os Séculos
XVI, XVII e XVIII” 1ª Ed.
Companhia Editora do Minho. Barcelos, 1936. 2ª Ed., Portucalense Editora. Porto. 1969: Resumo extraído de relatos dos missionários protestantes
de Trangabar, na costa oriental, datados de 1733.
[5] No Verão de 1965, jovem estudante ainda, desembarquei em Hong
Kong pela primeira vez e aí pernoitei. O simpático empregado da recepção do
hotel que me acolheu perguntou a minha nacionalidade. Portuguesa, respondi-lhe.
Retorquiu ele, imediatamente: eu também sou cristão.
[6] Em 1985 num hotel em Malaca, durante uma conversa semelhante com uma jovem
malaia, ela exclamou: - Você está brincando! Você é alto, elegante e de cabelos
claros. Os portugueses são muito mais baixos e muito mais escuros. É claro que
ela estava se referindo aos descendentes dos portugueses que vivem no
Portuguese Settlement, em Malaca.
[7] Em 1822, John Crawfurd negoceia um primeiro tratado para estabelecer mais
garantias para o comércio britânico, com a redução das taxas alfandegárias, e a
autorização para o estabelecimento de um consulado no reino siamês. Este tratadofoipublicadoem: CRAWFURD,
John. Journal of an embassy from the governor-general of India to the courts of
Siam and Cochin China; exhibiting a view of the actual state of those kingdoms
(2ª ed). London: Henry Colburn & Richard Bentley, 1830, 2
vols. A primeira edição é de 1828.
[8]Edmund Roberts faleceu em Macau a 12 de Junho de 1836, no seu regresso de Bangkok e a
caminho do Japão onde iria assinar o tratado entre o Japão e os Estados Unidos
da América. Encontra-se sepultado no Cemitério Protestante.
[9] Pasquale M. d'Elia, S.J., Fonti Ricciane, Documenti Originali concernenti
Matteo Ricci e la Storia delle Prime Relazione tra l'Europa e la China
(1579-1615). Roma, Libreria dello Stato, 1949, 3 vol. Segundo este autor, o
dicionário terá sido elaborado entre 1584 e 1588.
[10] Foi o único dicionário da língua japonesa existente até à segunda metade
do Seculo XIX.
[11] No ano seguinte, foi publicado um Supplemento deste vocabulário,
impresso no mesmo Collegio da Cãpanhia de Jesu com a sobredita licença &
aprovao. Anno 1604.
[12] Se bem que Alexandre de Rhodes se tenha atribuído a autoria deste
dicionário, desde a primeira metade da passada decada de 80 pude identificar
documentos do Cartório dos Jesuitas da Ásia que não deixam margem para dúvidas
de que o seu autor foi o Padre Francisco de Pina, S.J., profundo conhecedor da
língua vietnamita, falecido no mar em 1605, e seus companheiros, os jesuitas
Gaspar de Amaral e António Barbosa.
[13] Carta de 1 de Fevereiro
de 1656 do Padre Valguarnera ao Superior da Companhia de Jesus, em Roma: ARSI,
JAP.SIN.162,F16, 17. Chegado a Ayuthaya em 1655, o Padre Valguarnera logo se
dedicou à aprendizagem da língua siamesa e ao ensino do português: De
momento, aplico-me a adquirir a compreensão assim como a dominar a escrita.
Para isso, vou a casa do Superior de um mosteiro entre os quatro de maior fama.
É surpreendente como ele deseja a minha amizade; espera aprender o português
durante o tempo em que me ensina o siamês.
O
Dicionário da Língua Siamesa estaria certamente concluído quando Valguarnera
partiu do Sião em 1670 para a este Reino voltar cinco anos depois e aqui
falecer, em 19 de Janeiro de 1677.
Até
ao presente, apesar das pesquisas efectuadas no ARSI - Arquivo Romano da
Companhia de Jesus - no Cartório dos Jesuítas na Asia, existente na Biblioteca
da Ajuda, em Lisboa, e no Arquivo Histórico de Macau, não foi possivel
encontrar nenhum exemplar manuscrito, visto que se julga nunca ter sido
impresso, como aconteceu com tantos outros dicionários, nomeadamente o de Ricci
e Ruggieri cujo manuscrito só viria a ser encontrado e identificado no ARSI, em
1934.
De todo o modo, os autores que se referem a Valguarnera
atribuem-lhe a autoria de vários escritos entre os quais os Opúsculos
Religiosos, em língua tailandesa, e o Dicionário da Língua Siamesa.
[14]A existência
de um léxico Português-Malaio não
datado mas que se admite ter sido elaborado cerca do ano 1700,
descoberto pelo Dr. Luís Filipe
Thomaz na Biblioteca Nacional de
Lisboa em 1978, vem relatada em:
LOMBARD, Denys
e THOMAZ, Luís Filipe F.R. — “Remarques préliminaires sur un lexique portugais-malais
inédite de la Bibliotèque Nationale de
Lisbonne”. Papers on Indonesian languages
and literatures edited by Nigel Philips
and Khaidir Anwar.1981. Cahier d’Archipel 18.
[15]ZHONG Wu Lam e YAN Kuong Yam : “Ao Men Ji
Lue” [Monografia de Macau]. 1751. Esta obra foi editada váriasvezes em chinês. Traduzida para português por Luis
Gonzaga Gomes com o título “Ou-Mun Kei-Leok”[Momografia de Macau, em
cantonês]. Macau. Imprensa Nacional, 1950. Foi reeditada: Ed. da Quinzena
de Macau. Outubro de 1979. Lisboa.
O vocabulário, situado nas
últimas páginas da obra, contém os termos usados pelos portugueses em Macau transliterados para
caracteres chineses e, naturalmente, o seu significado em chinês. Com o
objectivo de estudar o português
do Séc. XVIII em Macau, sobre esse
vocabulário incidiram, pelo menos, os seguintes estudos: BAWDEN, C. R. - “An eighteenth century
Chinese source for the Portuguese dialect of Macao” in: Silver Jubilee Volume of the Zinbun-Kagaku-Kenkyusho Kyoto. Kyoto University Press. 1954. THOMPSON, R W. -”Two
synchronic Cross-Sections in the
Portuguese Dialect of Macao”. Orbis
8.1959.
[16]São as
formas crioulas da língua Portuguesa,
o português crioulo ou “dialectos ultramarinos do português”:
Indo-português:
Bombaim/Dialecto norteiro* (Baçaim,
Bandra, Cavel, Chaúl-Korlai, Dadar, Guirgão, Mahim, Mazagão, Parel, Salsete,Taná,Tecelaria), Calcutá,
Calecute, Cananor,Cochim (Vaipin),
Damáo, Diu, Goa/Português de Goa*,
Mahé, Mangalor, Negapatão e Trangabar/Português
da costa de Coromandel*;
Sri-Lanka;
Malaio-português*;
Malaca, Penang, Singapura;
Bornéo, Celebes, Ceram, Djacarta (Pekan
Tugu)/Java*, Flores, Molucas (Amboina e Ternate), Pekan Tugu, Solor, Sumatra;
Chittagong, Hughli e
Patna;
Hong Kong, Macau,
Xangai;
* Designação dada por Leite de Vasconcelos no ”Esquisse d’une Dialectologie
Portugaise”. Lisboa. 1901.
[17] Outras línguas orientais
que receberam vocábulos portugueses no seu léxico: Bengali, Birmanês, Cingalês,
Concani, Gujaráti, Hindi, Marata, Tamul, Teto, Urdu,
Vietnamita.
De uma maneira geral, as línguas orientais faladas por comunidades entretanto convertidas ao
catolicismo receberam vocábulos portugueses por via da catequese. Mesmo as
línguas historicamente menos permeáveis, como é o caso do chinês, preservam
vocábulos de origem portuguesa no contexto da tradição religiosa católica,
Segundo o Dr. Jin Guo Ping, ex-professor de português do Instituto de Línguas
Estrangeiras de Pequim, serão cerca de 35 os vocábulos chineses de origem
portuguesa, predominantemente no mandarim. Segundo a mesma fonte, o cantonense contaria com 6 e o xanganês com 1. Não tenho elementos sobre
os dialectos de Ningpo (Liampó) e Min Nam (dialecto do sul da Província de
Fujian, onde chegou a haver um importante estabelecimento português em Zhanzhou
(Chinchéu). Mas é natural que
estes dialectos do litoral da China tenham acolhido maior número de vocábulos
portugueses, especialmente o Min Nam, em resultado da prolongada convivência de
portugueses e chineses originários de Fujian, desde a tomada de Malaca em 1511.
[18]Dialecto Indo-Português de Ceylão, Lisboa 1900; Dialecto Indo-Português de Goa, Porto,
1900; Dialecto Indo-Português de Damão,
Lisboa, 1903; Dialecto Indo-Português do
Norte, (Dialecto Indo-Português de Bombaim e seus suburbios, Lisboa, 1906; Dialecto Indo-Português de Negapatam,Porto,
1917, todos de autoria de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado.
[19]BOTELHO DA COSTA, Joaquim Vieira e DUARTE,
Custódio José: O CREÔLO DE CABO VERDE: Boletim da Sociedade de Geografia de
Lisboa: 6.ª Série: N.º 6: pp. 325-388: LISBOA: Imprensa Nacional: 1886.
[20] Em crioulo de Cabo Verde designa-se “português inchado” ao uso de um português situado
a meio caminho entre o português
padrão e o crioulo.
[21]A licença graciosa consistia no benefício
concedido aos funcionários oriundos de Portugal de poderem gozar seis meses de
férias pagas no seu
País, incluindo as viagens para o respectivo agregado familiar, por cada período de quatro
anos de serviço. Essa longa permanência, a que podia acumular-se um mês da
licença anual, implicava, para os filhos em idade escolar, a necessidade de
frequentarem o ano lectivo em
Portugal. De modo que, ao regressarem,
as crianças traziam um português mais “puro”
e um invejável acervo de conhecimentos sobre Portugal adquiridos por
observação directa. Invejável na medida
em que, nunca tendo visto um
comboio, um rio ou uma serra, os
programas escolares exigiam que as
crianças decorassem as linhas de caminho
de ferro, os rios e todo o sistema montanhoso de
Portugal, por exemplo. Ao mesmo
tempo, à realidade local - o universo
conhecido da nossa infância - pouca ou
nenhuma atenção era dispensada pelos mesmos
programas escolares.
[22]Fernam da Silveirafoi um dos poetas
palacianos mais apreciados pela graça das suas sátiras. Tornou-se inimigo de D. João II, e
entrou na conspiração do duque de Viseu. Quando esta se descobriu, escondeu-se
em Setúbal. Uma escrava negra, ouvindo gemidos vindos do esconderijo onde se
encontrava, foi muito assustada avisar o amo e este, receando alguma
indiscrição, atirou a escrava a um poço, quando ela estava a tirar
água. Fugiu para Espanha e depois para França. Foi morto nas ruas de
Avignon a 8 de Setembro de 1489, a mando de D. João II.(Portugal - Dicionário
Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e
Artístico, Volume VI, pág. 944).
[23]Caravela
[24] Muito
[25]Terá nascido no Bombarral, entre 1470 e
1480. Formado em Direito, foi escudeiro do rei D. Manuel em 1499 e exerceu as
funções de juíz dos Orfãos em Óbidos, tendo falecido em data posterior a 1545.
Como "escrivão da corte" o seu nome encontra-se ligado a numerosos
documentos, alguns dos quais importantes para a história do teatro português,
como seja a carta de privilégio para Baltazar Dias, dramaturgo cego da Ilha da
Madeira, redigida em Évora, a 20 de Fevereiro de 1537. Filho de uma família
possuidora de "vinhas, pomares e pinhais", foi ele próprio
comerciante de vinhos e na sua obra o tema do vinho encontra-se no Pranto do Clérigo e em diversas trovas.
Ler mais: http://visao.sapo.pt/a-invencao-teatral-de-anrique-da-mota=
[26]A farsa tem por palco o Paço Real, a Côrte, que é uma feira. Os
intervenientes e adereços na farsa são: Gonçalo: o protagonista, que representa
o Povo; Clérigo: representa o papado e, concretamente, o Papa Clemente VII;
Francisco: é o Rei de França, Francisco I, e filho do Clérigo; Almeida e Duarte (moços do Paço); Negro: é o
personagem que intervém com expressões orais e corporais destinadas a fazer rir
os espectadores; Velha; Cezília Pedreanes; Lebre: significa a liberdade que foi
roubada a Gonçalo (o Povo); Capões: são os “eunucos”, isto é, aqueles que o
Povo fornece para formarem as guardas militares dos grandes senhores que
dominam o governo e o Estado; Marmelos: os mercenários contratados,
seleccionados entre o Povo e sempre prontos a entrar em acção; Patos: os
mobilizados à força para os exércitos; Limões: são os mantimentos para as
tropas; Bolsa e roupas: são os bens e haveres pessoais de Gonçalo (o Povo).
O enredo e a acção resumidamente: Gonçalo (o Povo) quando
ia para a côrte vender produtos de outrem (uma lebre, uns capões e um cabaz de fruta) é roubado por um Negro e dois moços do Paço.
Não conhece as manhas do Clérigo (o Papa) nem do Paço (o Império). Acaba sem
nada. A Lebre (a liberdade) não serviu para nada a quem ficou com ela porque
está guardada em casa de um alfaiate. Os capões (guardas militares), logo após
terem sido roubados a Gonçalo (o Povo) estão a ser cozinhados (aproveitados,
treinados) por quem os roubou. Os marmelos (mercenários) estão sempre prontos a
intervir na defesa dos interesses de quem os roubou. Os patos (mobilizados à
força para os exércitos) também teriam sido roubados a Gonçalo (o Povo), se ele
os tivesse levado à feira. O mesmo que aconteceu com os limões (os mantimentos
para as tropas) e com a sua bolsa e suas roupas (os seus bens e haveres
pessoais).
O enquadramento da farsa na política europeia é dado pelo
Papa (o Clérigo) e o rei de França (Francisco) que lideram a luta de libertação
da Península Itálica e da Igreja, contra os espanhóis, Carlos V e a banca
alemã.
[27] NETO, Serafim da Silva: “Falares Crioulos”. Rio de Janeiro. 1950:
[28] LIMA, José Joaquim Lopes de: ”Ensaios sobre a Statística das Possessões Portuguesas no Ultramar...”. ImprensaNacional deLisboa, 1844.
APÊNDICE A
“Clérigo da Beira”, farsa de Gil Vicente
O registo mais antigo que encontrei na literatura
portuguesa àcerca do “português mal
falado” ou “pretoguês” está na
sátira de Gil Vicente “Clérigo da Beira”,
/...representada ao muito poderoso e
christianissimo Rei D. João, o terceiro do nome em Portugal, em Almeirim, era
do Senhor de 1526”.
Gil Vicente revela nesta sátira uma memória auditiva
admirável e um conhecimento apreciável do proto-crioulo falado pelos negros da
costa da Guiné levados para Portugal.
Nesta “farça de
folgar”, entre outros personagens, há o Clérigo e seu filho Francisco;
Gonçalo, filho de um lavrador, que leva produtos do campo para vender na Côrte;
dois moços da Côrte, Duarte que rouba a Gonçalo dois capões e um cesto com
marmelos e limões, e Almeida, que rouba uma lebre; e um Negro da costa da Guiné
cujo papel é fazer rir a audiência pelo modo como fala português.
“Clérigo da Beira”, farsa de Gil Vicente
Excerto
“Clérigo: .../Se topares lá em fundo
Hum negro, põe-te a recado,
Porque he um perro malvado,
O maior ladrão do mundo.
Não olhes no que fallar,
Qu’he muito falso o cabrão...
Olha por teu chapeirão,
Porque ele há-te d’atentar
Se tens tu olhos ou não.
II Parte
4. Episódio
Indo Gonçalo seu caminho, apartando-se do Clerigo,
topa um Negro, grande ladrão, e entra cantando buscando hum mulato: e diz
Gonçalo depois de cantar o Negro:
GONÇALO.
Dize, Negro, es da Côrte?
Neg. Qu’esso?
GON. S’es da Côrte?
Neg. Ja a mi forro, nam! Sá
catibo.
Boso conhecê Maracoto?
Corregidor Tibao he.
Elle comprai mi
primeiro;
Quando já pagá a
rinheiro,
Deitá a mi fero na pé.
É masa tredora aquele,
Aramá que té ro
Maracote.
GON. Mais tredoro era o rascote
Quem me a mi furtou a
lebre.
Neg. Qu’he quesso que te
furtai?
GON. Hữa lebre de meu pae,
De meu cunhado uns
capões,
E marmelos e limões;
Abonda tudo la
vae.
Neg. Jesu, Jesu, Deoso consabrado!
Aramá tanta ladrão!
Jesu, Jesu, um
caralasão:
Furunando sá sapantado.
Jesu! Cralasam.
Pato nosso santo paceto ranho tu e figo
valente tu e sinco cego salva tera pão nosso quanto dão dá noves caro he
debrite noses ja libro nosso gallo. Amen Jeju, Jeju, Jeju.
Sa pantaru
Furunando.
Dize, rogo-te, fallai:
Conhece tu que furtai?
Porque tu nam
bruguntando?
GON. Perguntarei por meu pae.
NEG. Cal-te: Deoso cima sai,
Que furtai ere oiai.
Deoso nunca vai dormi,
Sempre abre oio assi
Tamanha tu sapantai.
Guarda mar esso mal,
E senhora Prito santo.
Nunca rirá homem branco
Furunando furta real.
Não sabe mi essa
careira:
Para que? Para comê?
Muto comê, muto bebê,
Turo turo sa canseira;
Vira mundo turo
canseira:
Senhor grande, canseira;
Home prove, canseira;
Muiere fermoso,
canseira;
Muiere feio, canseira;
Negro cativo, canseira;
Senhoro de negro,
canseira;
Vai missa, canseira;
Prégação longo,
canseira;
Crerigo nam tem muiere,
canseira;
Crerigo tem muiere,
canseira;
Grande canseira;
Firalgo sôlto, canseira;
Chovere muto, canseira;
Não póde chovere,
canseira:
Muito filho, canseira;
Nunca pariro, canseira;
Papa na Roma, canseira;
Essa ratinho, canseira;
Não vamo paraiso, grande
canseira:
Vira resa mundo turo
turo he
Canseira.
Mi nam falla zombaria.
Pos para que furtai?
Que riabo sempreza!
Abre oio tudo ria.
Mi busca mulato bai,
Ficar abora, ratinho.
...
... ... ... ... ... ... ...
Espreita o negro como Gonçalo esconde o
chapeirão e o al, e tanto que se vai entra dizendo:
NEGRO.
A mi abre oio e ve
Ratinho tira besiro:
Ere dexa aqui condiro:
Não sei onde elle mettê.
Senhora Santo Francico,
Santa Antonia, San
Furunando!
Pois mi ha d’andar
buscando
E levare elle na bico
O servo Santa Maria.
Sabe a regina Matho misercoroda nutra d’hum
cego sável até que vamos. A oxulo filho d’egoa alto soso peamos ja mentes ja
frentes vinágre qu’elle quebrárão embalde ja ergo a quante nossa ha ilhos tue
busca cordas oculos nosso convento e geju com muito fruta ventre tu ja tremes
ja pias. Seuro santa Maria dinhero me la darão e ve esa carta da me mucho que
furte cantara Furunando.
Acabada assim esta salve regina, acha o Negro
o que Gonçalo leixou escondido, e diz:
Ei-lo aqui sa! Deoso
graça.
Graça Deoso esse he
capote;
Nunca dexa aqui palote:
Ratinho quem te forcasse!
Aramá que te ero vilão!
Que palote saba sam,
Barete tambem bo era.
Mi cansai e á deradera
A mior fica sua mão.
Vejamos bolsa que tem:
Hum pente para que bo?
Tres ceitil sa qui so:
Ratinho nunca bitem.
O riabo ladarão!
Corpo re reos consabrado!
Essa vilão murgurado
Sa masa prove que cão.
Quando bolsa mi achase
Fernão d’Alvaro, esse si;
Nunca pente sa alli.
Ah reos! Quem te furtasse
Bolsa Nuna Ribeiro!
Home bai busca rinheiro:
A toro ere rise:
Ja rinheiro feito he.
Aramá que tu ero
gaiteiro!
Fernão d’Alvaro m’acontenta;
Elle nunca risse nam.
Logo chama ca crivam,
- Crivaninhae
esormenta;
Toma rinheiro, vas
embora.
Boso, home de bem, que
buscae?
- Mi da cureiro agarba
sae.
- Boso que buscae corte
agora?
Buscae a Rei jam João,
Paga minha casaramento.
Dá ca, moso, trae esormento;
Crivaninhae boso,
crivão:
Home, tomae hum dos
quatro sete:
Vas embora turo turo.
Sua rinheiro sa segura,
Mioro que elle promete.
Marco Estevez
moladeiro
Elle risse: Santa Maria!
Rinheiro boso queria?
Bai bai dormir paeiro. –
Boso que pedir, muieiro?
- Tanta filho mi tem
qui...
- Quem manda boso pari,
Boso grande parideiro?
- Boso seria muito bô:
Vaca ne Francisco paia;
Tenha seis fillho e mi
so
Nam temo comere ni
migaia.
Elle rise:
Que culpo tem a Rei jam
João?
Boso parir como porco,
Bai buscai sua pae
torto,
Que dai a sua fio pão.
Velha, que boso querê?
- Molla, que a mi pobre
sai.
Elle rise:
Porque boso nam guardai
Rinheiro que bosso bebê?
–
Jesu! Jesu! Moladeiro
Sa riabo aquella home;
Quando a mi more da fome
Nunca buscai sua
rinheiro.
Porém graça a Reos, a mi
Nunca minga que furtá;
Pouco ca, pouco relá,
Pouco requi, pouco reli,
Grão e grão gallo fartá.
Quem furta, home sesuro:
E louvar a Reos com turo
E senhoro Prito Santo.
A mi bai furta emtanto
Camisa que esta na muro.
Vem Gonçalo tremedo de frio e diz:
GONÇALO.
Mui mao nadar faz verão
Até meado o Janeiro;
Mas agora he o ribeiro
Que corta homem como
cão.
Jesu! E o meu chapeirão
E o cinto e a esmoleira?
Pois esta era a mouteira
E este he o mesmo chão.
Agora merecia eu
Hum par de trochadas
boas,
Porque fiar nas pessoas
Nunca outro fructo deu.
Bem vi eu que o guinéu
Me vio tudo aqui leixar;
Mas o seu negro prégar
Me levou a mi o meu
APÊNDICE B
Crioulos de base
portuguesa: colectânia de textos e respectivas versões em português padrão e
notícia de outras cristandades crioulas lusófonas:
APÊNDICE B1:
Bangla Desh: Dhaka e Chittagong
APÊNDICE B2:
Birmânia / Mianmar
APÊNDICE B3: Cabo
Verde
APÊNDICE B4: Guiné-Bissau, Senegal, Serra
Leoa e Gâmbia
APÊNDICE B5: India
APÊNDICE B6: Indonésia
APÊNDICE B7: Japão: Nagasáki
APÊNDICE B8: Macau
APÊNDICE B9: Malásia: Malaca, AlorStar, Penang, Perak, Kuala Lumpur,
Seremban e Johor Baru
APÊNDICE B10: São Tomé e Príncipe e Guiné Equatorial
APÊNDICE B11: Sri Lanka: Batticaloa, Trincomalee e Puttalam
APÊNDICE B12: Tailândia: Bangkok
APÊNDICE B13: Timor
Existem referências, na obra de José Maria Braga, ao
crioulo falado no, então, Paquistão
Oriental, hoje, Bangla Desh.
Em 1986, quando presidia ao Instituto Cultural de Macau,
desenhei o projecto de investigação denominado “Crioulos do Oriente” onde
incluí o crioulo do Bangla Desh:
“Trata-se de um
projecto de investigação de grande porte cujo objectivo é proceder ao
levantamento dos crioulos de origem portuguesa no Índico e no Pacífico, quer do
ponto de vista da investigação documental e bibliográfica sobre cada um dos
crioulos, quer no trabalho de campo incidindo em inquéritos linguísticos e
gravações.
Este projecto,
solicitado a uma linguísta residente em Macau, no primeiro trimestre de 1987,
por desistência de sua iniciativa, acabou por ser aprovado em Agosto de 1988 e
a sua duração prevista é de 24 meses (de 1.9.88 a 31.8.90).
O seu custo total é de
MOP 636.000,00.
Foi este projecto
entregue à Dra. Isabel Tomás cujo curriculum se junta e que o vem executando
com elevado rigor científico e exemplar profissionalismo.[1]
No planeamento das viagens para a execução do trabalho de
campo, a Dra. Isabel Tomás sugeriu-me que se deveria eliminar a deslocação ao
Bangla Desh (Crioulos de Dhakha e Chittagong) que, em sua opinião, estariam já
extintos. Anuí, com pena, tanto mais que, em virtude de se encontrarem cortadas
as relações diplomáticas entre Portugal e a Indonésia, o projecto não poderia
incluir os crioulos deste país.
Anos mais tarde, nos primeiros dias de Janeiro de 1999,
numa curta escala de apenas algumas horas em Dhaka, desloquei-me à Igreja do
Santo Rosário que se localiza em Tejgaon, zona urbana central da capital do
Bangla Desh, que estava prestes a receber trabalhos de preservação organizados
e pagos pela Fundação Calouste Gulbenkian.
A Igreja Velha, como também é
conhecida, estava encerrada. Junto à Igreja Nova, muito próxima, encontrei dois
jovens a quem perguntei como poderia visitar a Igreja Velha. O jovem mais alto virou-se para o mais miúdo e
disse-lhe:
Bá busca chábi |
Vai buscar a chave |
Este registo do crioulo do Bangla Desh, recolhido de um
jovem de 12/13 anos, deu-me a alegria de saber que se entre os jovens católicos
de Dhaka se fala crioulo, isto significa que esse crioulo está vivo e terá o
futuro assegurado.
Para quem puder lá chegar, ficam os seguintes contactos:
Igreja do Santo Rosário, Tejgaon, Dhaka, Bangladesh:
Parish Priest: Fr. Albert T. Rozario Mobile
:(0088) 01715020250
Assist. Priest : Fr. Ignatius Parimal
Rozario Mobile : (0088) 01710895238
Assist. Priest : Fr. Mintu L.
Palma Mobile : (0088) 01715038067 Chittagong
Catedral de Nossa
Senhora do Santo Rosário, Bandel Road, Patharghatta, Old Chittagong: A igreja é parte do mais
antigo bairro cristão/português em Bengala, remontando ao século XVI.
Bishop Moses Costa, C.S.C.
Telephone: (031) 632266
Crioulo
extinto
Cerca de 1510, após se estabelecerem em Goa, os
portugueses passaram a comerciar nos portos de Mergui, Tavoy, Serião, e Akyab
permutando apoios com o rei do Pegu.
As relações comerciais entre os portugueses e o Rei
Bayinaung do Pegu cresceram intensamente e, em 1556, havia cerca de mil
portugueses, soldados e marinheiros, comandados por António Ferreira de
Bragança, ao serviço daquele rei.
Cerca de 1595, tiveram início sérios problemas entre os
reis dos diversos reinos da Birmânia. O rei do Arracão encarregou Filipe de
Brito, comandante de um bando de mercenários, de capturar o porto de Serião.
Este executou a tarefa mas recusou entregar o referido porto ao rei do Arracão.
Obtendo o beneplácito do Vice-Rei da Índia, foi conferido
a Filipe de Brito o título de Capitão-Geral e Governador do Serião que se fez
coroar Rei do Pegu e governou como rei absoluto entre 1600 e 1613.
No norte da Birmânia, o Rei Anaukphelun sucedeu no trono
de Ava em 1610 e deu início imediato à unificação do reino. Conquistou Prome e
Toungoo e marchou em direcção ao sul com o seu exército vitorioso.
Filipe de Brito aliou-se a um rei insignificante, Nat
Shin Naung, e resistiu ao Rei Anaukphelun mas sem sucesso. Foi condenado à
morte por empalamento que durou dois dias.
O resto da guarnição com suas esposas e filhos num total
de 5000 pessoas foram levados como prisioneiros para o Norte. Estes
prisioneiros tiveram um tempo duro quando chegaram ao reino de Ava.
O Rei Thalun, que sucedeu a Anaukphelun era um bom
administrador e fez uso dos serviços dos prisioneiros de acordo com as suas
qualificações. Quando o reino de Ava entrava em guerra, o rei recorria a estes
prisioneiros que eram verdadeiros “senhores da Guerra”. Deu-lhes parcelas de terra para seu próprio uso e permitiu-lhes
construir uma igreja. Fr. Agostinho de Jesus de Lisboa escreveu dizendo que em
sua visita a Ava encontrou mais de 4.000 cristãos, os quais haviam sido
aprisionados na fortaleza de Serião.
As Cartas Ânuas dos jesuítas na Índia mencionam alguns
dados muito valiosos sobre o crescimento do Cristianismo no reino de Ava. A Carta
Ânua de 1644, incluiu estatísticas da Igreja Católica na Birmânia. Havia 8 aldeias
católicas:
1) Ava: Padroeira: Nossa Senhora da Esperança: 150
cristãos.
2) Para o sul de Ava fica Nabaca, à distancia de 30 léguas: Padroeiro: São João Baptista: 300 cristãos.
3) Latora (Chuang U): 400 Cristãos.
4)
Tabayam (Tabayin): 400 Cristãos.
5)
Machobo (Shwebo) 70.
6) Alla
(Halin) 60.
7)
Sikim: 200.
8) Simguem: 80[2]
É esta a origem da Cristandade Crioula Lusófona da
Birmânia.
Visitei-a em Janeiro de 1998. Reparte-se por seis aldeias
rurais, na Província de Mandalay. Partindo,
demanhã cedo, do aeroporto de Mandalay, consegui visitar apenas uma das
aldeias, já a tarde ia avançada: Chantha Village, com 1.500 habitantes, todos
de origem portuguesa. Algumas partes do percurso têm de ser feitas através de
campo aberto, sem estrada. Honram-se de constituir a 14.ª geração de
portugueses, desde 1613. Ao todo serão cerca de 20.000. Apesar da cor, da pele,
dos olhos e do cabelo, ser mais clara do que nas demais etnias da Birmânia, são
designados por kala (negros). À força
da discriminação social e profissional que sofreram durante gerações, perderam
o hábito de usar a sua identificação com nomes cristãos. Os mais idosos ainda
se recordam dos nomes próprios dos avós (p.ex. Carlos e Zagai). Dois terços
convertem-se à religião católica pelo casamento. Uma elevada percentagem do
clero católico é de origem portuguesa. Na aldeia de Chantha a escassez de água
é um sério problema que estará na origem de alguma lepra. Nesta aldeia, o
reservatório de água da chuva era uma vala junto a uma das paredes exteriores
do cemitério. Um modesto apoio recebido do exterior é proveniente da Propaganda Fide... Filipe de Brito (Cassenga, em birmane) é muito popular na
Birmânia.
Contacto:
Fr. PETER U MYA
AUNG
PARISH PRIEST
ASSUMPTION CHURCH
CHANTA VILLAGE
YE U P.O. SAGAING DIVISION
MYANMAR
APÊNDICE B3: Cabo Verde
Designação: Crioulo de Cabo Verde (com variantes em cada Ilha)
Variante da Ilha de Santo Antão
Designação: Criol de Sintanton
Tchgá, entrá, rastá
kêdera e bo sentá, nem que for um czutchutch. Durante bo estada, sinti
um puquin da ilha (sê gosto, sê tchêr, sê alma...) éssim, quónd bo sei,
bo'n de bé dzemorêve. |
Chega, entra, arrasta [uma] cadeira e senta-te, nem que seja um bocadinho. Enquanto estiveres,
sente um pouquinho da ilha (seu gosto, seu cheiro, sua alma...) assim, quando saíres,
não vais ao desamparinho. |
|
Dzemoréve = sem nada, de
mãos vazias, de mãos a abanar. É uma
expressão exclusiva do crioulo de
Santo Antão e usada quando os donos da casa recebem alguém que não esperavam
e nada têm para oferecer (normalmente algo para comer). Ó meu filho, hoje vais saír daqui ao desamparinho (de
mãos a abanar, de mãos vazias). |
Variante da Ilha de
Santo Antão/Criol de Santanton |
Informante, sobre o
vocábulo dzemorêve: Dr. Carlos Alberto Duarte Almeida,natural do Paúl - Ilha
de Santo Antão, Licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra e
professor liceal na Ilha de S. Vicente
. |
K’ri i! ‘So! Pardal! Rbá na top ‘Ce na kovada! Manel Gonsal Mandá pe dze-b Oz e min M’ná ê bo! K’ri
i! ‘So!
Pardal! |
Corre aí! Xô! Pardal! Arriba no topo Desce na covada! Manuel Gonçalo Mandou para dizer-te Hoje sou eu Amanhã és tu! K’ri
i! ‘So!
Pardal! |
Variante de Santo
Antão: Cantiga de guarda de sementeiras:
Osório, Oswaldo: “Cantigas de
trabalho – Tradições orais de Cabo Verde”: 1980
Ilha de S.
Vicente
Designação: Criol
de Soncent
CRIÔL DE
MALÁCA: BRAÇA ETERNE DE CULTURA PORTUGUÉZA NA SUDÊSTE D’ÁZIA Primêr
que tude, m’crê gradecê tude gente na organizaçon que cunvdóme pa assisti e
partecipá nesse Confrénça. Dum manera especial, m’crê manifestá nha admiraçon
e gradecimente pa Joan Margaret Marbeck. S’esse Confrénça e sê livre “UM
HERÁNÇA, defésa d’ heránça de gente de Malaca” encontrá um vôz fôrte e um
pilar, que ca ê sô pa gardá sês valor de tempe antigue, má tambê - e más
importante - pa futurá uns estratégia nôve pa guindás e fazês fcá pa sempre. Sobre
téma desse Confrénça, m’ca tê duveda que tude gente li ta num posiçon medjor
do que mi pa pontá o que ê más drête. M’crê sô fazê uns pergunta e uns
sugeston: Ta parcê
obvie que conservá Criôle de Maláca ê um queston de vida ô de môrte se gente
de Maláca crê vivê na sê prôpre Cultura. Era importánte sabê evoluçon de
numere de gente de Maláca que ta falá criôle nesse última década, não sô na
Maláca má tambê na tude bánda de Malásia e
Singapura. Tambê ê
importánte espiá mudánça na cada grupe
de idáde. Quês que tem menes de déz óne tita diminuí? Se rasposta ê sim, isse
ê um avise. Um soluçon em parte podria sê fundá uns crêche de mergui total na
Criôl de Maláca. Segunde
composiçon étnica e linguística de populaçon de Malásia, tê algun manêra de
Criôl de Maláca bê ta tê um posiçon de línga oficial? Confôrme
Sistéma de Educaçón de Malásia, tê algum manêra de Criôl de Maláca sê um
linga de opçon quande e ondê um mínime de estudánte pedi pa prendêl? De que
manêra ta podê ranjá professor pa ês? Estaçons
de rádie podría concordá na emiti um parte na Criôl de Maláca, ô tê algum
manêra de fundá estaçons de rádie li pa fazêl? Nô
podê fazê esses mésma pergunta sobre
estaçons de televisão. Nascide na Cábe Verde, mi tambê m’ê herdêr desse heránça de nôs tude: Línga Portuguéza que vrá “Linga Franca” ta fazê uns quinhent óne. Criôl de Maláca e Criôle de Cabe Verde, c’m ta falá com orgui côme nha linga matérna, son lingas irmãs c’um data d’ôtes com mésma origem: Criôl indo-português de Diu, Damão, Korlai, Mangalor, Cananor, Mahé, Cochim, Criôl de Sri-Lanka, Criôl de Macau, Criôl de Java e Criôle de Guinê e San Tomê e Prince. Criôl de
Cabe Verde, Guinê e San Tomê e Princepe vrá linga nacional na sês país depôs
de Independénça, se bê que Português fecá come línga oficial. Divide a
problémas de política que tude gente ta compreendê, quês ôte Criôl fecá linga de minoria
cultural. Esse
difrénça de posição entre Criôl d’ ôtes banda ca ta trá quês que ca ê línga
nacional sê drête de ser respeitóde e de recebê juda de governe naquês país
em que ês ê patrimone nacional. Guindá cada Criôl ca ê assunte sô de cada país onde ês ê falóde. Tude nós que ta falá Criôl nô tê que largá num trabói fincóde pa compreendê tamónhe de Munde dêsse herança de nôs tude. Nô tê que juntá nôs gente nesse mésma heránça e estruturá interesse de tude nôs. Num futur
pert, m’ta esperá que representánt de tude nôs gente podê encontrá pa conchê
e ser conchide uns d’ôtes, pa trocá experiénça e pa inventariá tude nôs
nescidade. Isse nô podê dzê que ê construçon de nosse comunidade de interesse
de nôs tude. Obrigód pa bocês tude |
PAPIÁ-CRISTÃO: O ETERNO ABRAÇO DA CULTURA PORTUGUESA AO SUDESTE
ASIÁTICO Em primeiro lugar, quero agradecer aos organizadores que me
convidaram para assistir e participar nesta Conferência. De modo especial,
quero manifestar a minha admiração e o meu agradecimento a Joan Margaret
Marbeck. Com esta Conferência e o livro de sua autoria “UMA HERANÇA”, a
defesa do Património da Comunidade
Cristã de Malaca encontrou uma voz muito forte e um pilar, não só na
preservação dos valores do passado, mas também - e principalmente - na
futuração de novas estratégias para robustecer e tornar perenes esses mesmos
valores. No que se refere ao tema desta
Conferência, não tenho dúvidas de que todos os participantes estão em melhor
posição do que eu para apontar as medidas
mais correctas. Apenas quero fazer algumas perguntas e sugestões: Parece óbvio que a preservação do Papiá-Cristão é vital se a Comunidade Cristã de Malaca quiser manter-se fiel à sua própria Cultura. Seria importante conhecer a evolução do número de falantes de Papiá-Cristão nas últimas décadas, não só em Malaca como também nas diversas partes da Malásia e de Singapura. É importante também observar as
mudanças verificadas segundo os escalões etários. O estrato correspondente
aos falantes com menos de dez anos está a diminuir? Se a resposta é
afirmativa, isso constitui um aviso. Uma solução parcial poderia ser a criação de jardins infantis
onde o Papiá-Cristão fosse ministrado em regime de imersão total. De acordo com a composição
étnica e linguística da população da Malásia, há alguma hipótese de o
Papiá-Cristão obter o estatudo de língua oficial? Com relação ao Sistema
Educativo da Malásia, há alguma hipótese de o Papiá-Cristão ser reconhecido
como língua de opção quando e onde um mínimo de estudantes deseje aprendê-lo?
Como providenciar professores para essas turmas? As estações de rádio
concordariam em produzir emissões parcialmente em Papiá-Cristão ou existem
possibilidades de serem criadas estações de rádio locais para o fazer? As mesmas perguntas podem ser
feitas em relação às estações de televisão. Nascido em Cabo Verde, sou
herdeiro do património comum de todos nós: a Língua Portuguesa que se tornou
“Língua Franca” há quinhentos anos. O Papiá-Cristão e o Crioulo que tenho o
orgulho de falar como língua materna são línguas irmãs entre várias outras
com a mesma origem: os Crioulos indo-portugueses em Diu, Damão, Korlai,
Mangalor, Cananor, Mahé e Cochim, o Crioulo do Sri-Lanka, o patois macaense,
o Crioulo de Java e os Crioulos da Guiné-Bissau e S. Tomé e Príncipe. Os Crioulos de Cabo Verde, Guiné-Bissau e S. Tomé e Príncipe tornaram-se línguas nacionais dos respectivos países após a sua Independência, embora o Português tenha permanecido como língua oficial. Por compreensíveis razões de natureza política, os outros Crioulos tornaram-se línguas das minorias culturais. O diferente estatuto político
entre os Crioulos não priva aqueles que não são línguas nacionais do direito
ao respeito e de receberem apoio dos governos dos países a cujo património
nacional pertencem. O robustecimento de cada
Crioulo não é apenas um assunto interno dos países onde são falados. Todos
nós, falantes de Crioulo, temos de iniciar um trabalho conjunto no
entendimento da dimensão universal do
nosso património comum. Temos de unir as nossas comunidades na mesma herança
e estruturar os nossos interesses comuns. Num futuro próximo, espero que
representantes das nossas comunidades se encontrem para se conhecerem, para
trocarem experiências e para inventariarem as nossas necessidades. Isto
significa a construção da nossa comunidade de interesses comuns. Obrigado a todos. |
Variante de S. Vicente/Criol de
Soncent: Palavras proferidas pelo autor na Conferência “A Revival and Development of Spoken
Kristang and the Malaca-Portuguese Heritage towards the year 2000."
Malaca, 1996.
Designação: Criol de Saninclau
F’rá pardal, u-u-u! Gindá na lombu, u-u-u! Têê na kovoada, u-u-u! Antonn kovoada,
u-u-u! Mandá faló-b,
u-u-u! S’bo kme’l se midje,
u-u-u! El ta mató-b,
u-u-u! Dia da oz, u-u-u! |
Foge pardal Sobe aos montes Desce para a covoada António Covoada Mandou dizer-te Se lhe comeres o milho Ele mata-te Hoje mesmo |
Variante de S.
Nicolau: Cantiga de guarda de sementeiras:
Osório, Oswaldo: “Cantigas de
trabalho – Tradições orais de Cabo Verde”: 1980
Blén, blén, blén, N ca ta cazá ma ‘Ntona Cuzinha – ca tin-tin-ten, ca
tin-ten Blén, blén, blén, ‘Ntona Cuzinha
ca ten cuzinha[3] – ca tin-tin-ten, ca tin-ten Blén, blén, blén, Mi pó-m cazá ê má Ana Chiquinha – ca tin-tin-ten,ca
tin-ten Lúsiu d’Mari d’Cont Pó-m kria d’bós d’nha sobók - ca tin-tin-ten, ca
tin-ten Blén, blén, blén, N ta cazá nha Lúsia - N
ten un cóch d’banana na Racantin - ca tin-tin-ten, ca tin-ten Un
sóc d’batata ma un garafon d’grog -ca tin-tin-ten, ca tin-ten Blén, blén, blén, Dobrada, dobrada, dobrada, dobrada…[4] |
Não caso com a Antónia Cozinha... Antónia Cozinha não tem coisinha... Eu para casar é com a Ana Chiquinha... Lúcio da Maria do Cândido É para eu criar debaixo das minhas asas... Eu caso a minha Lúcia – Tenho um cacho de bananas no Recantinho... Um saco de batatas e um garrafão de groque |
Variante de S.
Nicolau: Cantiga de pescadores: Recolha
de Ildo Lobo: Repertório de “Os
Tubarões”: Osório, Oswaldo: “Cantigas
de trabalho – Tradições orais de Cabo Verde”: 1980
Ilha da Boavista
Designação: Criol
de Bubista
Un pai tinha dôs fije. Aquel’
más nôbo pedil’
sê parte qu’á tocâb'el de sê ardança, el despedi
d’el e el ba morâ n’un terra don el gastâ na ‘strabagança de rapaz sê parte
d’ardança. Qande el gastâ tude quél tinha el f’câ
n’un am’zêra tão grande, que qu’an el câ sabia comô el bê
passâ, el bâ pedi e el ôchâ un algar na casa d’un hôme rico, que mandal’ pa un horta de seu gardâ
porc. N’ês ‘stado assin triste é qu’el conxê sê desgraça e el flâ: Ah! Qante criado á ‘stâ farto gorinhassim na nôs casa, e mi um ‘stâ li tâ morrê de fome . Jam ca podê saportâ nhê desgraça. Um tâ bâ pô de zoêje diante de papá, um tâ flal’. É bardade q’um offendê papá assim com’um offendê Noss’Senhor: Jam câ tâ dêbé ser tratado comô bôcê fije, mâ um tâ pedi papá pa dam’gasajo na bôcê casa, nin q’um tratado comâ un qalquer criado más 'spresibe. Conforme el flâ assin el fazê; el anfiâ pa casa de sê pai. El ‘stâba inda longe qan sê pai conxel’, e comâ un pai nunca câ tâ garbâ de sê fije, assin qu'el ojal' el 'squecê tudo qu'el tinha el fête, el corrê, el ba braçal’ e el purdoal’. El brâ el flâ sês criado: Bôcês bâ b'scâ un rôpa más amejor que tên pâ nhê fije, e bôcês ranjâ un bon jantar, parquê um q’rê fazê un festôna pa nôs tudo 'stâ sâbe. Má logo que sê pai sub’q’zê qu’el ‘stâ tâ pensâ, dê’na el, el mostral’comâ un pai tâ ‘stimâ sês fije tud’un, e el flâl: Nhê fidje. Bô armon ‘staba môrte, e agora el tornâ dâ bida; el stâba perdido e nô tornâ ôchâl; pris’é que nô ‘stâ contente. |
Um pai tinha
dois filhos. O mais novo pediu-lhe a
parte que lhe cabia da herança, despediu-se dele e foi morar numa terra em
que gastou em extravagâncias de rapaz a sua parte da herança Quando gastou tudo o que tinha, ficou numa miséria tão
grande que não sabia como viria a passar, foi pedir e encontrou um lugar em
casa de um homem rico, que o mandou para uma horta sua guardar porcos. Nesse estado
assim triste é que conheceu a sua desgraça, e disse: Ah! Quantos criados
estão fartos agora mesmo na nossa casa, e eu estou aqui a morrer de
fome. Já não posso suportar a minha desgraça. Vou pôr-me de
joelhos diante do meu pai, [e] digo-lhe: É verdade que ofendi o meu pai assim
como ofendi Nosso Senhor: Já não devo ser tratado como vosso filho , mas peço
pai para dar-me agasalho na sua casa,
nem que tratado como um qualquer criado mais desprezível. Conforme disse,
assim fez; seguiu para casa de seu pai. Ele estava ainda longe quando seu pai
o [re]conheceu, e como um pai nunca deixa de se compadecer de seu filho,
assim que o viu, esqueceu-se de tudo o que ele lhe tinha feito, correu, foi
abraçá-lo e perdoou-lhe. Voltou-se e
disse aos criados: vão buscar a melhor roupa que há para o meu filho, e
arranjem um bom jantar, porque eu quero uma grande festa para todos ficarmos
felizes. O irmão mais velho, que sempre tinha vivido como
um bom filho, ficou quase compadecido quando regressou do campo e encontrou
tanta festa em casa porque o seu irmão que tinha abandonado a casa
deles, e que se tinha regressado era
porque já não tinha mais meios de passar a sua vida. Mas logo que seu pai soube o
que ele estava a pensar, dirigiu-se a ele, mostrou-lhe como um pai estima os
seus filhos igualmente, e disse-lhe:
Meu filho. O teu irmão estava morto, e agora voltou à vida; estava
perdido e nós tornámos a achá-lo. Por isso é que nós estamos contentes. |
Variante da Ilha
da Boavista / Criol de Bubista: Parábola do Filho Pródigo: BOTELHO DA
COSTA, Joaquim Vieira e DUARTE, Custódio José:
O CREÔLO DE CABO VERDE:
Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa: 6.ª Série: N.º 6: pp. 325-388:
LISBOA: Imprensa Nacional: 1886. Versão
portuguesa do autor.
Ilha do Maio
Designação: Criol
di Djar Mai
"tard di cau iém" |
“tarde calma”, cau=
lugar, iém = mudo, silencioso |
"sol na ceu sangra laranja ba ta cai trás di santiag tard di cau iém djarmai para na temp sem um muviment ka bom sinal um corv fazé um arc al ba poisa la riba na cruz di igreja
al bem pal da fidje di terra barc grand ka risisti Mar di nort i vida i morte kela nka ta intendé
|
[o] sol no céu sangra Laranja [o alaranjado do entardecer] vai caindo Por de trás [da ilha] de Santiago Tarde calma [a] ilha de Maio parou no tempo Sem um movimento Não é bom sinal Um corvo fez um arco [e] foi poisar La em cima na cruz da igreja Notícia, notícia triste Veio para dar Filhos da terra, [o] barco grande não resistiu Mar de Janeiro Mar do norte E vida e morte Isso eu não entendo Notícia... notícia... |
Variante da Ilha
de Maio/Kriol di Djar Mai, composição
musical de Betú,
cantada por Ildo Lobo: “ Notícia”.
O poema canta a Ilha do Maio e os seus filhos que emigram para
trabalhar nos navios mercantes holandeses. Nos árduos e longos anos de trabalho, alguns
morrem. A morte é simbolizada pelo corvo que voa
descrevendo arcos e poisa na
cruz que encima a fachada principal da
Igreja. O poema foi escrito em Crioulo da Ilha do Maio, mas o saudoso Ildo Lobo cantou-o em Crioulo da Ilha de Santiago. A expressão "tard
di cau iém" é de uso exclusivo na Ilha de Maio.
Informante: Márcia Silva, nascida e educada na Ilha de Maio e radicada em
Macau, onde se licenciou em Estudos
Ingleses, na Universidade de Macau.
Ilha de Santiago
Designação: Criolu
di Santiago
Ôi Cábu Vêrdi, |
Oi Cabo Verde, |
Variante da Ilha de Santiago/Criolu di Santiago: Excerto do poema Dôci Guérra, de
autoria de Antero Simas.
Designação: Criolu
de Djarfogo
Oh, Pamode?! M´ obiba noba de nhá? |
Oh, Porquê?! Já ouvira novas de si? Que as novas são como [o] vento Que anda por todo [o] mundo Sem parar um só momento? Ouvi novas tão boas Que comecei a gostar muito de si? Que era a cara mais formosa Que o Senhor Deus mandou do céu! Tinha, deixe-me falar-lhe claro, Tanta gana de a conhecer Que desejei ser pássaro Para ter vindo no ar a voar Vi agora que é verdade Aquilo que disseram, [e] muito mais!... Oh Deus! Oh mundo! Oh porquê! Quem me dera ser ainda rapaz?! |
Variante da Ilha
do Fogo/Criolu de Djarfogo: Poema de Pedro
Cardoso
Designação: Criolu
de Djabraba
Força de Cretcheu Ca tem nada na es bida Más grande que amor Se Deus ca tem medida Amor inda é maior.
Maior que mar, que céu Ó força de cretcheu, Que abrim nha asa em flôr |
A
Força do Amor Não há nada nesta vida Maior que o mar, que o céu Mas, entre todo o cretcheu [amor] O meu inda é maior
Cretcheu más sabe, [amor mais gostoso] É aquele que é o meu
Ele é que é a chave Ó força do amor, |
Variante da Ilha Brava / Criol de Djabraba: Poema de
Eugénio Tavares.
APÊNDICE B4: Guiné-Bissau, Senegal, Serra Leoa e Gâmbia
Designação: Kriol ou Kriulo
Fijus di Terra |
Filhos
da terra/Crioulos locais |
Deus
ku lebri Lebri
ba pidi Deus pa dal ma djireza inda. Deus falal: Lebri kuda te, i kôsa kabesa, i lanta i buska dus kabas ku un po kumpridu, i pega kaminhu.
I
ka tarda, i odja kau ku lifanti sinta,
i na mamanta si fidju. I kunsa na
papia el sõ: Si liti mas e kabas, bu ka fia me, ma i bardadi. Otcha
ki tchiga pertu di lifanti, kil puntal: -
Ku kin ku bu na djusia sin?
Lebre tira sõ un bias, i inchi kabas; i gardisi lifanti; Kil falal: -
Ki santchu dudu, no na mostral. -Tisino ki santchu. Ku
ken ku bu na porfia sin? Deus
falal: |
Deus
e a Lebre [A] Lebre foi pedir [a] Deus para lhe dar ainda mais esperteza. Deus disse-lhe: - Vai buscar-me três coisas ao mundo: Leite de elefanta, mel de abelha e [um] deus cego. A Lebre pensou, coçou a cabeça, levantou-se, [foi] buscar duas cabaças e um pau comprido e meteu-se a caminho. Não
tardou, viu [um] lugar em que [a] elefanta
amamentava [a] sua cria. Começou a falar sozinha: [O] seu o leite nesta cabaça, tu não
acreditas, mas é verdade. Quando
chegou perto da elefanta, esta perguntou-lhe: - Com quem estás tu a discutir? Ela [lebre] disse-lhe: - É com aquele macaco que teima que o teu leite não enche esta cabaça. [A] elefanta disse-lhe: - Precisamente por isso, não há-de chegar. Tira o leite [e] verás. A Lebre fez só uma pressão e encheu a cabaça; agradeceu à elefanta que lhe disse: - Traz-me esse macaco. A Lebre foi [-se embora], andou, andou até que viu abelhas e começou a falar sozinha: - [O] seu mel enche esta cabaça. - Não enche. [As] abelhas perguntaram-lhe: - Com quem estavas a falar assim? Ela [lebre] disse-lhes: É com aquele macaco que, como é parecido com as pessoas, sabe todas as coisas. [Diz que] o vosso mel não enche esta cabaça. [As] abelhas riram e disseram-lhe: - Aquele macaco é doido, vamos mostrar-lhe. Entraram na cabaça e encheram-na com mel. E disseram à lebre: -Traz-nos esse macaco. [A] lebre agradeceu-lhes, e pôs-se a caminho. Andou, andou, andou e não viu rasto de irã cego, e começou a falar sozinha: - Eu é que te digo, tu não acreditas, mas é mais comprido que este pau. [O] irã cego perguntou-lhe: - Com quem é que tu discutes assim? A [A] lebre disse-lhe: - É com aquele macaco; que este pau , que é pequenino, é mais comprido que tu. [O] irã cego disse-lhe: - Esse não chega precisamente; mede-nos e vê. A lebre disse-lhe: - Para que o macaco acredite, levo-te onde ele está; amarramo-lo com esta corda. [A] lebre ficou a mostrar-lhe como amarrar o macaco, mas só amarrou o irã ao pau. Mal acabou, apanhou as duas cabaças e pôs-se a caminho. Andou, andou, andou até que chegou à porta do céu; bateu, abriram-lhe a porta. Entregou a Deus as duas cabaças e o irã cego. Deus disse-lhe: - Eu não te acrescentarei esperteza, [porque] virás enganar-me um dia a mim próprio; mas vou puxar-te as orelhas que ficarão mais compridas agora. |
BULL, Benjamim Pinto:
"Crioulo da Guiné -
Bissau. Sabedoria e Filosofia".Tradução do autor revista e corrigida pelos Engenheiros
António Emerenciano Estácio e Malam Sambu.
APÊNDICE B5: INDIA
Damão– Designação: Crioulo de Damão
Antú vi. Eu tem contan pór-óss
um chistoz histór. Mim mãe tim fallan quand tinh piquinin. Tinha naquel temp um velh morteng. E’ll tinh doi creád mulher e bastant barzúc. Esse doi mulher, um tinh nõm
Gitrud e ôt Análl. Bem cêd aquell velh tinh fazen cordá sú criad quand tinh
cantan gáll. Anall já fallou pú Gitrud: Ess
nóss don munt rabjent; qui cêd jà tem fazen launtá; num tem dixan durmi mesmo tud nôt. Gitrud já
respondeu: Bai Anall, bam nós fazê um coiz; voss turcê gargant de gall e falla pú velh; Gall tinh gemen-gemen; já isticou canell. Qui ha fazê Bai? Anall já fazeu qui lai Bai
Gitrud tinh fallan. Velh já ficou mữnt mortificad. Mas óss tem saben, éll qui coiz
ja fez? E’ll n’um tinh durmin e tá fazen cordá mê-not. Qui disgrass! Amb já ficou arrependend munt,
mas qui á fazê? Tard arrependid infern tem chê. |
António venha. Eu vou contar-lhe uma história
engraçada. Minha mãe contou-me quando eu era pequenino. Havia naquele tempo uma velha macilenta. Ela
tinha duas criadas e muita riqueza. [barzuc:
moeda antiga de Damão]. Essas duas mulheres, uma tinha o nome de
Gertrudes outra Anália. Bem cedo aquela velha acordava as suas criadas quando
o galo cantava. Anália disse a Gertrudes: Esta nossa dona [é]
muito rabujenta; tão cedo tem de fazer-nos levantar; não nos deixa dormir
todas as noites. Gertrudes respondeu:
Vai Anália, vamos fazer uma coisa; você torce o
pescoço ao galo e diz à velha; o galo estrebuchava; já esticou as canelas. Vamos a isto? Anália fez como Gertudes disse. A
velha ficou para morrer. Mas sabem o que ela fez? Ela nunca dormia e fazia-nos acordar à meia-noite. Que desgraça! Ambas ficaram muito arrependidas, mas que fazer?
De arrependidos está o inferno cheio.
|
MONIZ, António Francisco: Notícias e documentos para a História de Damão: Uma fábula de
Esopo: A velha e o galo. Tradução do
autor
Diu – Designação: Crioulo de Diu
Niguerinha baix de manguêr Qui tá fasê Tá buli cadêr Niguerinha, cum port fichad Qui tá fazê Tá ganhá peccad Niguerinha, cum barrig inchad Qui já comê Batat limpád |
Negrinha de baixo da mangueira O que estás a fazer A rebolar os quadris Negrinha com [a] porta fechada O que estás a fazer A cometer pecado Negrinha com [a] barriga inchada O que comeu Batata descascada |
QUADROS, Jeronymo: Cartas de Diu, 1907
Korlai
Designação: Kristi
Um
rêi su kabel ki korta ani su barb ki fêje um barber tivi kad suman di
rêi ja punto ki barber mi rênad su jent ki lei tem? tud jent
kumen beben tã fart. Dapai
rêi ja punto ki barber sus pert ki tẽ Dapai
barber ja falô ki rêi sus pert tẽ vac, boi ani
bufl rapad dakal kumen beben fart tem. Dapai rêi ja falô “a sim”? tar barber ja falô “sim” Dapai barber ja kortô rêi su kabel ja fejeu su barb ani barber ja foi su kaj torn. Dapai
rêi ja camô ki pradan ani ja falô ki pradam ki mi pert barber ki te tavi mi
kabel ki korta ani mi barb ki fêje io p’el punto ki mi reanad su jent kumen beben kile
tem? Tar barber ja falô par mi ki tud jent kumen beben
fart tem. Dapai
rêi ja falô ki pradan ki vai ani ulia barber su pert ki tem. Dapai
pradan ja tumô doi soladad su kosid
ani ja vo alde ani punto ki
jent ki uzo kumen beben kile di pasan? Dapai jent falô ki no jent su servis feje ani ak diyer kit enkotra no ta teje anako saman ki no fil famil ki kumen. Ta bom. Dapai
elo ja voi maiaj ani punto ki um om: uzo kumen beben kile tem? El falô agu di
not feje raro sukãy ani asi no di feje pasa. Dapai
elo trai pisom ja voy barber su kaj ani punto ki barber: vo ani vo fil famil
kumen beben kiley tem? Tar barber ja
falô: no kumen beben fart tem. Dapai pradan ja punto ki barber: vo pert ki tem. Asi?
ki pradan ja falô rapad dakal me vo ta falan ki rêi ki tud gent kumen beben
fart tem. Dapai pradan ani soladad ja ve torn ani falô ki rêi ki barber su pert tem vac, boi ani bufl ani rapad dakal el falan ki tud gent reanad su kumen beben fart tem Dapai rêi ja de ord ki pradam ki vai ani barber su tud animal pega ani puja da trank. Sigun
di barber ki ja ve rêi su kabel ki corta ani barb ki feje, rêi punto ki
barber: ki mi reanad su jent kumen beben hilei tem? Dapai ja falô ki rêi: ki tud jent muren fom. Pelo nute ki kume ani ag ki bebe Dapai
rêi p’el ja falô ki vo kumen beben fart ti,
tar tud jent kumen beben fart tem asi vo tim falan. Ago vo animal tud
dent trank ja pujo tar vo ta falan ki tud jent fom muren Dakal
so su nusta moro nu pesa, tud mun su pesa kere. Agor
ja kabo ye istor. Muit
obrigad |
Um
rei que cortava o cabelo e que fazia a barba [com] um barbeiro que tinha cada
semana, [semanalmente] [um] dia [o] rei perguntou [ao] barbeiro: no meu reino, a gente como vai? Então o barbeiro [disse] falou que toda
a gente come e bebe à farta. Depois
o rei perguntou ao barbeiro os
pertences que tinha Depois o barbeiro [disse] falou ao rei [os] pertences que tinha: vaca[s], boi[s] e búfalo[s]; por isso que [se] come e bebe com fartura. Depois o rei [disse] falou: “Ah sim?” e então o barbeiro [disse] falou: “sim!” Depois
[de] o barbeiro [ter] cortado [ao] rei o
cabelo [e] feito a barba foi
[-se embora], de regresso a casa. Depois [o] rei chamou o ministro [e] falou ao ministro que [o] meu barbeiro que aí esteve a cortar [-me o] cabelo e fazer [a] barba eu perguntei para ele: o que no meu reino a
gente come e bebe? Então
o barbeiro falou para mim que toda a gente come e bebe à farta. Depois
o rei falou que [o] ministro fosse ver os pertences que o barbeiro tinha. Depois [o] ministro tomou dois soldados consigo e foi à aldeia e perguntou àquela gente [o] que costumavam comer [e] beber [e] como passavam os dias. Depois [a] gente falou que: a nossa gente o seu serviço [que] faz e é com [o] dinheiro que cada um encontra [que] nós temos em cada semana que [os] nossos filhos [e] famíla comem. Está bom. Depois
já havia mais gente e perguntou a um homem: [o que] costumam comer e beber?
Ele falou [disse] água à noite é raro, cana de açucar e assim fazemos passar
os nossos dias. Depois os três foram a casa do barbeiro e
perguntaram: você e [os] vossos filhos [e] família o que é que têm para comer
e beber? Então [o] barbeiro falou: nós comêmos e bebemos à farta. Depois
[o] ministro perguntou ao barbeiro: você que pertences tem?. Depois
[o] barbeiro falou ao ministro: [os] meus pertences são vaca[s], boi[s] e
búfalo[s] Ah
sim? O ministro falou, por isso mesmo você tem falado ao rei, que toda a gente come e bebe à farta. Depois [o] ministro e [os] soldados vieram de volta e falaram ao rei que o barbeiro tinha vaca[s], boi[s] e búfalo[s] e, por isso, ele falou que toda a gente no reino comia [e] bebia à farta Depois
o rei deu ordem para o ministro ir e, [do]
barbeiro, todos [os] animais tomasse e pusesse trancados. [No] dia seguinte o barbeiro veio para [ao] rei cortar o cabelo e [a] barba fazer, [o] rei perguntou ao barbeiro: o quê, no meu reino, a gente come [e] bebe, [e] como passam? Depois
falou o rei: que toda [a] gente morre de fome. Pela noite, o que come e que
água bebe? Depois
[o] rei para ele falou: quando você
comia [e] bebia à farta, toda a gente comia e bebia à farta, assim você falava. Agora os vossos animais todos dentro
[das] trancas, já pode então falar que toda [a] gente morre de fome . Onde
está a
sua moral: não pense [que] todo o mundo quer o seu pensamento [pensa
como você]. Agora acabou a história. Muito
obrigado |
Recolha e tradução do autor (1989), revista e corrigida por John Álvaro
Libano, natural de Damão.
APÊNDICE B6:
Indonésia
Tugu (Java) |
Iste
figura yo bende ku ele |
Este
quadro/pintura eu vendi a ele |
Batavia/Jakarta |
Kantu
kere da ake londra kum yo |
Se quiser dar essa honra
a mim |
Tugu – Canção em Krontjong Morisco:
Pasa na bordi di mar Ola nabiu Kêrê nabiga Vilu vilu nang korsan mal Nungku atja di d’justisa Anda-anda na bordi di mar Minie Korsan nunka contenti Io buska ja minia amada Nunka sabi ela ja undi Io buska minia amada Ia minia noiba, minia amor Io busca até tuda banda Isti korsan teng tantu dor Io prunta fula strela Bosoter nunka ola un tenti Fula e strela nunka resposta Minia Korsan nunka contenti O bie aki minia amada Minia noiba, ó moler bonito Io espara com esparansa E canta kontigu Moresco |
Passeia
na beira mar Olha
os navios, quer navegar Filho,
filho não [tem] mau coração Nunca encontres [o] dia da justiça Passeio
à beira mar Meu
coração nunca [está] contente Procurei
a minha amada Nunca
sei onde ela [foi] Procuro
[a] minha amada Ela
[a] a minha noiva, [o] meu amor Procuro
por todo [o] lado Este
coração tem tanta dor Pergunto
[às] flores, [às] estrelas Vós
outras nunca a vêem [As]
flores e [as] estrelas nunca respondem Meu coração
nunca [está] contente Oh,
vem aqui minha amada Minha
noiva, oh mulher bonita Eu
espero com esperança E
canto contigo [o] Morisco* |
*O Krontjong Morisco é um
género de música popular indonésia, de raiz portuguesa
Japão – Nagasáki - Extinto
Traslado
do despacho q. o Governador de Nangasaque; Cavanguchi Goenzeimon Sama; mandou
ao Navio, pr. Escripto, segunda-feira pela manhãa; aos seis de Agosto; e
explicado pelo Jurubaça [intérprete]: Guichizaimon; com as mesmas palavras
dittas, e explicadas p.r elle, na mesma maneira q. afsima tenho ditto; em
minha prezença, e dos quatro Jurubaças; cujos nomes acharaõ ao pé do d.° despacho; e dos
mais q. prezentes estavaõ. |
Copia do despacho q. o Governador de
Nangasaque, mandou ao Navio, p.r escripto, e foy explicado em Portuguez, pelo
Jurubaça [intérprete]; q. p.r
naõ estar em modo q. todos o poçaõ entender: eu Manoel de Aguiar
Pereira, o traduzi, tirado do seu próprio original, q. declarou o Jurubaça:
Guichizaimon; e me reporto ao proprio.
|
Portuguezes fallarão neste tempo a
Macao Japaõ, já acharaõ tromenta, já chegaraõ, p.r ifso já mandá doze pefsoas
até Nangasaque, já chegou o Senhor Governador, já tomá Portuguezes p.ª Japaõ;
no misté fazé viagem p.ª Japaõ, este tempo já achá tromento de gente p.ª trazè aqui, p.r q.
sombra de Christaõ, não insiná, agora já tem despacho do Governador de
Nangasaque, p.ª Navio com gente vay p.ª Macao; daqui p.r diante no misté vem
mais, agora mandá torná p.ª Macao; quando chega lá, avizá p.ª cabeça de
Governo, no misté mandá Navio p.ª Nangasaque, p.r. q. este já trazê estes
doze Japões, torná vay; agora Governador de Nangasaque já tem fazê tudo este,
elle ligo mandá avizo p.ª Corte de Emdó,
p.ª o secretário informá p.ª Emperador, como Gov.ºr de Nangasaque já dá este despacho, p.ª
Navio q. veyo de Macao, trezê doze Japaõ. O Governador logo dá todo necefsário
p.ª viagem de Macao, quando for tempo de bom vento, e monçaõ p.ª fazê sua
viagem p.ª Macao. Dado em sete de Setembro da setima
Lua; em Segunda feira, seis de Agosto de 1685 an.ºs. |
Por
dizerem os Portuguezes, q. p.r cauza das tormentas, fora portar a Macao, huã
Embarcaçaõ com doze Japões, p.r esta cauza, os madaraõ a Nangasaque a
entregar; o Governador tomou entrega delles; e de hoje p.r diante, naõ venhaõ
mais Portuguezes a Japaõ, p.r q. com a sua vinda, padece a gente tormentos;
rezaõ p.r q. naõ querem q. haja sombra de Christaõs, pelo ensino q. daõ a sua
gente: p.r agora o Governador de Nangasaque dá este despacho; q. o Navio, e a
gente volte p.ª Macao; e chegando lá, advirta ao cabeça do Governo, q. naõ
mande mais Navio a Nangasaque; q. este, p.r ter trazido os d.ºs doze Japões,
torna a hir; e toma sobre si este despacho, q. elle fará avizo desta sua
determinaçaõ, ao secretário da Corte de Emdó, p.ª de tudo fazer Informe ao
Emperador, do despacho q. deu ao Navio q. veyo de Macao a trazer os doze
Japões; e q. dará todo o necefsario p.ª a partida do d.º, p.ª Macao, quando
for tempo, e monção de bom vento. Dado
em sete de Setembro, da setima Lua; em segunda feira, seis de Agosto de 1685
an.ºs. |
Arquivo Histórico de Macau: Assento
e memória de hum Barco q. veyo de Japaõ, desgarrado, p.r força dos temporaes; a
estas Ilhas da China: Em Março de 1685. Breve, e sucinto Relatorio q. dou, ao
Governo da Nobre Cidade; da viagem q. fiz a Japaõ, a levar os doze Japões, q.
os temporais os trouxeraõ a este Cidade, na sua Embarcaçaõ; p.ª os entregar ao
Governador de Nangasaque: com carta p.ª o mesmo.
(Arquivos de Macau: Vol. I: N.°4: Setembro de 1929: 232:233).
Breve enquadramento histórico:
A intriga holandesa contra os portugueses no Japão pôs termo ao comércio
de Macau naquele país em 1610. A perseguição religiosa contra os cristãos que
confessavam a sua fé tinha por resultado a sua tortura e morte nas décadas
seguintes. A proibição definitiva aos
portugueses de residirem no Japão ocorreu em 1636 e foi repetida anualmente, até 1639. Em
1640 foi organizada uma embaixada em Macau para ir ao Japão tratar do
reatamento do comércio com aquele país. Composta por 74 pessoas, a embaixada
chegou a Nagasaki no princípio de Julho de 1640. A 3 de Agosto seguinte, 61
membros dessa missão foram decapitados, a embarcação em que viajaram foi
queimada e os 13 sobreviventes enviados de volta a Macau.
A cessação do comércio com o Japão colocou a economia de Macau em
situação ruinosa.
A 10 de Março de 1685, foi localizada, na ponta da Macareira, uma embarcação com 12 japoneses a bordo, aí arrojada pela força de um temporal. A notícia causou grande alvoroço na cidade por se vislumbrar a possibilidade de reabertura do comércio entre Macau e o Japão, passados 47 anos, tirando partido da sua repatriação devidamente organizada.
Partiram os náufragos japoneses, devidamente acompanhados por séquito de 47 pessoas, adequado ao fim em vista, na fragata S. Paulo, propriedade de Pedro Vaz de Sequeira, que chegou a Nagasaki em 3 de Julho de 1685. Tiveram de partir de regresso a Macau em 20 de Agosto seguinte, face à recusa taxativa das autoridades japonesas em reatar as relações com os portugueses.
Chefiou esta missão Manuel de Aguiar Pereira, viúvo e natural de Macau.
No relatório da missão apresentado ao Governo da Nobre Cidade (de Macau), com data de 3 de Outubro de 1685[5], Manuel de Aguiar Pereira refere: o Intérpetre antigo dos Portuguezes, quando hiaõ a Japaõ (p. 220); com estes vinhaõ quatro Japões, q. todos fallavaõ Portuguez; hum deles era o Jurubaça antigo dos Portuguezes; home’ já velho; e lhe perguntey pela hidade; ao q. me referio, dizendo-me q. tinha, setenta, e sete annos (p. 221); cujo nome era Guichi Zaymon (p. 232).
Os documentos que se reproduzem acima contêm o despacho do Governador de Nagasáki. Do lado esquerdo, trata-se da tradução para português feita pelo velho intérprete dos portugueses sobre o original escrito em japonês. Do lado direito é a mesma tradução corrigida por Manuel de Aguiar Pereira por não estar em modo que todos o possam entender.
Nascido em Macau, Manuel de Aguiar Pereira exprimir-se-ia correctamente em português padrão e em maquista ou patuá, como aconteceu com várias gerações de macaenses, filhos de pai nascido em Portugal e de mãe macaense, de que recordo José dos Santos Baptista de Miranda e Lima, poeta clássico e satírico, em patuá, (10.11.1782 - 22.1.1842) e José dos Santos Ferreira, escritor e poeta (28.7.1919 – 24.3.1993).
Que português falava o intérprete Guichi Zaymon? Certamente não seria o português padrão. Esse, todos os portugueses entendiam. E Manuel de Aguiar Pereira entendia ambos. O intéprete japonês falava, muito provavelmente, um crioulo de base portuguesa: o maquista ou patuá, presente em Macau enquanto a mãe dos macaenses tinha origem malaqueira, indo-portuguesa, do Ceilão, timorense, em suma, era asiática não chinesa.
A análise de conteúdo da tradução do texto japonês do Governador de Nagasáki feita por Guichi Zaymon contém modos de exprimir arcaicos que persistem nos crioulos de base portuguesa mas desapareceram no uso atual da língua portuguesa:
já mandá doze pefsoas |
Mandaram doze pessoas |
no misté fazé viagem p.ª Japaõ |
Não precisam de viajar para o Japão |
daqui p.r diante no misté vem mais |
Daqui por diante não é preciso virem
mais |
mandá torná p.ª Macao |
Mandou regressar a Macau |
quando chega lá, avizá p.ª cabeça de
Governo, no misté mandá Navio p.ª Nangasaque |
Quando chegarem lá, avisem a cabeça
do Governo, [que] não é preciso mandar Navio a Nagasáki |
Macau
Designação: Maquista ou Patuá
Excertos de um diálogo
entre dois primos
macaenses, Augusta e João Fernandes,
(ca. 1860*):
Antes
de eu vae pra Hongkong De onze anno para dose Eu já estudá garmática Na
escola de Padre Jorje. (*) A: Pergunto se o primo ainda JF: Eu nom pode lembrá tudo, Ja perdê bastante pratica. A: Primo falIa erradamente JF: Masqui patuá, tudo gente Entendê cusa eu falIa A: Sendo algum portuguez novo JF: Com minha zápi
catápe, Logo fazê comprendê A: Primo é rico, tem
dinheiro, JF: Portuguez oze em dia Só serve pra pobretão Quem más podê,
prendê inglez Pra podê ganhá sua pão. A: Primo não sabe avaliar
JF: Só serve pra ovi missa Com livro dentro d’igreza Papá fálá são asnera Querê prendê portuguez, Que unga lingu tão inutil Devê esquecê de unga vez. N’ Hongkong tudo prendê inglez Nôs, china, como estranzero A:
Primo se assim continua Fica sendo malaqueiro |
[Antes
de eu ir para Hong Kong] [Dos
onze anos para os doze] [Estudei gramática] [Na escola do Padre Jorge] [Não posso lembrar tudo] [Perdi bastante
prática] [Embora “patois”, toda a gente] [Entende o que eu digo] [Com os meus trejeitos (?)] [Faço-me entender] [O
português hoje em dia] [Só
serve ao pobretão] [Quem
tem meios, aprende inglês] [Para ganhar o pão] [Serve apenas
para ouvir missa] [O pai disse que é asneira] [Querer aprender
português,] [Deve esquecer-se de vez] [Em
HK todos aprendem inglês] [Nós,
os chinas e os estrangeiros] |
(*)
Se bem
que datado de 1895 (“Renascimento” III,
n°1, Imprensa Nacional. Macau. 1945) este diálogo humorístico retrata uma situação que me parece
ter lugar uns quarenta anos antes.
Afirmo isto, pela referência à “escola
de Padre Jorje”. Trata-se
da Escola Principal de Instrução Primária de que o Padre Jorge António Lopes da Silva (8-5-1817/14-7-1870), natural deMacau,
foi director e mestre de português, entre 1847 e 1854 (V.TEIXEIRA, Pe. Manuel - ”A Educação em Macau”.Direcção dos
Serviços de Educação e Cultura Macau 1992, p. 40). Seja uma ou outra a idade deste documento, não
deixa de ser estranho que tenha sido publicado pela
primeira vez em 1945 mercê do trabalho notável de Leopoldo Danilo Barreiros de salvar tudo o
que existia do “Dialecto Português de
Macau”.
APÊNDICE B9:
Malásia - Malaca, Alor Star, Penang, Perak, Kuala Lumpur, Seremban e Johor Baru
Designação: Kristang,
Papiá kristang, Portugis
Pai Nosso |
Avé Maria |
Pai nussa nussa Pai Pai nussa ki teng na seu Na terra assi kuma na seu |
Ave Maria Ave Maria cheu di grasa |
DA
SILVA,
Patrick, Revista de Cultura,
Macau: 1988, n.º 5, pp. 105-110.
APÊNDICE B10:
São
Tomé e Príncipe e Guiné Equatorial
Designações:
Ilha de S. Tomé:
Forro ou
Fôlo,
São-Tomense ou Santome
Língua dos angolares: Lungua N'golá
Ilha do
Príncipe: Lunguyê
Guiné Equatorial
– Ilhas de Fernando Pó e Ano Bom: Fá d’Ambô ou Flá d’Ambu
Forro ou Fôlo
Declaraçón Universal di
Dirêtu di Hómé Artigo 1º Tudu nguê di mundu ca nancê livli e igual ni dignidade
e ni dirêtu. Punda nen ca pensá e nen tê cunxensa, selá nen fé tudu cuá cu
tençón de lumón. |
Declaração Universal dos
Direitos Humanos
Artigo 1° Todos os seres humanos nascem livres
e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem
agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. |
Seja lovadu! |
Seja louvado!; olá |
Bom dja ô |
Bom dia |
Bos tadji ô |
Boas tardes |
Boj notxi
ô |
Boas noites |
Que nomi bo
e? |
Que nome você tem?/Como se
chama? |
Nomi mu
sa Pedro |
O meu nome é Pedro |
Quá mandá bô scá fugi
um? Quá mandá bô scá fugi
mun? |
Para que foges tu de mim? Para que foges daqui? |
Poema de Fancisco Stokler, com tradução de Jerónimo Pontes
Lungua N'golá
Ê ra Têtêuga ua
kiba palaxu |
Ele deu à Tartaruga uma parte deste palácio |
Lunguyê, Língua da Ilha ou
Principense
Poonomi pesoali / Pronomes Pessoais
Ami |
Eu |
Kua mi |
Comigo |
Atxi |
Tu |
Kua txi |
Contigo |
Ê |
Ele/Ela |
|
|
No |
Nós |
Ki no |
Connosco |
Ouo |
Vós |
Kôli – Ki (k’)ouo |
Consigo - Convosco |
Eles/Elas |
Ine |
|
|
Poonomi
Posesivu / Pronomes Possessivos
Ki me |
Meu |
Ki tê |
Teu |
Ki sê |
Seu |
Ki no |
Nossos/Nossas |
Ki (k’)ouo |
Vossos/Vossas |
Ki ine |
Seus/Suas |
Verbos:
Abrir: Bi; Acender: Sêndê; Andar: Ndan; Apagar: Pagá; Cair: Kiê; Chorar: Gô;
Comer: Kume; Comprar: Kopa; Correr: Kuê; Cozinhar: Kuxi; Dar: De; Defecar: Gbô;
Descer: Dêssê; Dormir: Dimi; Entrar: Lenta; Escolher: Sanu; Fazer: Fêzê; Fechar:
Fissa; Ficar: Fika; Ganhar: Gan; Lavar: Lava; Levar: Tan ue; Olhar: Pia; Passear:
Paxa; Pedir: Pidi; Perder: Pêdê; Pôr: Puê; Precisar/Querer: Mêssê; Rezar: Reza;
Rir: Rin; Sacudir: Vani; Semear: Ximia; Sentar: Tussan; Separar: Zo; Subir: Subi;
Tirar: Txa; Tomar: Tama; Trazer: Daka; Ver: Vê; Virar: Viá; Zangar: Vôlô.
Guiné Equatorial – Designação do Crioulo: Fá d’Ambô ou Flá d’Ambu
Ilhas de Ano
Bom e Fernando Pó |
Malía da pe-d’eli
tabaku |
Maria deu ao pai dela tabaco |
APÊNDICE B11:
Sri Lanka - Batticaloa, Trincomalee e Puttalam
Designação: Burgher
Portugis, Portugis de Ceilam
Eau tanda Bengal Riva de gammala Lo trissa oen noiva Charoe de marmala Eau tanda Bengal Riva de oen
cheecha Lo trissa oen noiva Kie bonitoe oen beecha |
Eu vou a Bengala Em cima de [um camelo] Trarei uma noiva Cheiro de marmelo Eu vou a Bengala Em cima de uma lagartixa Trarei uma noiva Que é bonita [como] uma manceba |
JACKSON,
Kenneth David: CANTHA SEN VARGONYA –
TRADIÇÕES ORAIS EM VERSO CRIOLO
INDO-PORTUGUÊS, 1996.
Tailândia (Bangkok)
No período em que estive em Bangkok, como Conselheiro
Cultural da Embaixada de Portugal, entre 1995 e 1999, os euro-asiáticos de
origem portuguesa mantinham um cerimonial que designam por “Visita ao Avô” e ocorre todos os
anos, no primeiro dia de Janeiro, e a que tive oportunidade de assistir no
Bairro da Imaculada Conceição, o núcleo mais antigo dos portugueses em
Bangkok: As crianças e seus pais entram em casa do avô que se
mantém de pé no hall de entrada,
ajoelham-se todos de mãos dadas e dirigem-lhe a seguinte saudação: - “LOVADO SEJA
JESU CHRISTO” O avô responde: - “Par sempre. Amen” |
APÊNDICE B13:
Timor
Designação: Crioulo
de Bidau
Canção
"Pasterinho verde”
Pasterinho verde Senta na catapa. Velho olha velha, Senta tapa-tapa. Pástero de lamuca, Pena girà-sol. Culpa não foi minha. Culpa foi de vós. Peixe matà-ôi Manére no coilão Tanto fala fala, Doe de còração. |
Passarinho
verde Pousa
na amendoeira. O
velho espreita a velha, Sentado
escondido. Pomba
verde, Penas
de girassol. A
culpa não foi minha. A
culpa foi sua. O
peixe mata-olhos Pescado
na rede Tanta
conversa, Dói
o coração. |
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[1] MORBEY, Jorge: I.C.M. RELATÓRIO DE ACTIVIDADES DE 1988: pp. 177-178
[2] The Catholic Directory of Myanmar 1995: 13-14.
[3] O mesmo que cachinha
(vulva).
[4] Peixe dos mares de Cabo Verde.
[5] Arquivos de Macau: Vol. I: N.°4: Setembro de 1929: 220:234.
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