Sunday 27 June 2021



A Língua Portuguesa no Oriente:
De Língua Franca a Língua das Cristandades Crioulas – o preconceito contra as línguas crioulas














II Crossings Brasil

Universidade de S. Paulo, 27 a 31 de Julho de 2015

 

 

 

 

 

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jorge Morbey
Professor convidado na Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau

 

 



1.   A língua portuguesa, as línguas orientais e as cristandades crioulas  lusófonas

 

A abordagem deste tema será sempre redutora se não incluir as formas por que a língua portuguesa se metamorfoseou e sobrevive, de geração em geração, desde o século XVI, como um dos dois pilares em que assenta a identidade das Cristandades Crioulas Lusófonas no Oriente[1].

A filologia ensina que as línguas se alteram inevitavelmente por acção de dois factores: o tempo e o espaço.

Ninguém contesta que nos Açores se fala português, apesar das diferenças existentes de ilha para ilha e das dificuldades sentidas pelos portugueses do Continente em perceberem os seus compatriotas insulares. 

Do mesmo modo, não sofre contestação que no Brasil se fala português, não obstante alguma dificuldade dos brasileiros entenderem o português falado em Portugal que é tanto maior quando falado mais depressa. 

No Brasil, ao contrário do que se passou nos Açores e na Madeira, o português travou contacto com outras línguas veículadas por índios e africanos dando-se o fenómeno que em filologia se conhece por lei da interinfluência que, naturalmente, é responsável por alterações mais profundas da língua. 

Apesar disso, muitos portugueses do Continente reconhecem sentir mais dificuldades em entender o português falado pelos açoreanos do que o português falado pelos brasileiros.[2]

Os crioulos são fenómenos derivados da lei da interinfluência e do déficit de contacto com a língua padrão. Daquela lei resulta principalmente a simplificação da estrutura gramatical da língua padrão. O déficit de contacto advém de simples isolamento ou de escassez de pressão da língua padrão enquanto expressão de domínio económico.

Designam-se  por crioulos de base portuguesa aqueles cujo léxico é, na sua maioria, de origem portuguesa. Mas podem encontrar-se crioulos com outras origens: de base inglesa (o Krio da Serra Leoa), de base francesa (o crioulo das Seychelles), de base árabe (o Kinubi do Uganda e do Quénia) e outros.

 

“Língua portuguesa padrão” e “crioulos de base portuguesa” são partes integrantes de um conceito patrimonial da Língua Portuguesa. 

Em 1711, Charles Lockier escreveu:

"Os Portugueses podem justamente reclamar que criaram uma espécie de língua franca em todos os portos marítimos na Ásia, de grande utilidade para outros europeus que teriam dificuldades em muitos lugares para serem compreendidos sem outros".

“The Portuguese may justly claim they have established a kind of línguafranca in all the sea-ports in Asia, of great use to other Europeans who would find it difficult in many places to be understood without others.[3]

Na verdade, a língua portuguesa implantou-se fortemente em regiões costeiras do Oriente, entre os princípios do século XVI e os meados do século XIX.

Em relatos dos missionários protestantes de Trangabar, na costa oriental, datados de 1733 regista-se: “Há três espécies de língua portuguesa na Índia: a pura, a meio- deturpada e a completamente deturpada. A primeira é falada principalmente pelos portugueses da Europa e pelos seus descendentes; a segunda é falada pelos indivíduos de origem mista: os pretos também se servem dela na sua correspondência. Caracteriza-a a sua conjugação incompleta. A terceira é falada geralmente pelos Portugueses de origem mista e sobretudo pelos completamente pretos. Difere da segunda em não ter conjugação./.../. Esta língua é imprópria para correspondência e muito mais para o discurso. Por isso os Portugueses pretos se servem da segunda quando oram a Deus. É também nesta que se exprimem os Ingleses, os Dinamarqueses, os Holandeses e os Franceses quando se não podem entender nas suas línguas respectivas, mas estes também se servem da primeira na sua correspondência, se a sua instrução o permite.[4]

Sendo cristãos, e os únicos europeus no Oriente durante um século, os portugueses, a sua língua e a sua religião, deram origem à sinonímia entre cristão e português, no Oriente.[5] [6] Em Malaca, por exemplo, Kristang significa simultâneamente ser católico e ser português. O seu conteúdo é simultâneamente religioso e étnico.

A partir do século XVII, com a chegada de outros povos europeus ao Oriente, tornou-se prática indispensável a existência de falantes de português a bordo das suas embarcações, nomeadamente holandesas, dinamarquesas e inglesas. Estes intérpretes eram designados por Lingoas ou Jurubaças. E, assim, a língua portuguesa ganhou o estatuto de língua de comércio, no Oriente.

O prestígio de Portugal e da língua portuguesa no Oriente conferiu-lhe também o estatuto de língua de prestígio, pelo seu uso como língua diplomática.

Isso é testemunhado pelo segundo Tratado de Amizade e Comércio entre o Sião e o Reino Unido, de 31 de Junho de 1826, redigido em siamês, inglês, malaio e português[7].

Também o primeiro Tratado de Amizade e Comércio entre o Sião e os Estados Unidos da América, de 20 de Março de 1833, além das línguas siamesa e inglesa, foi redigido em chinês e português: 

Do prefácio do tratado consta o seguinte parágrafo: O presente Tratado é celebrado na quarta-feira, a última do quarto mês do ano 1194, chamado Pi-Marong-chat-tavasok, ou o ano do Dragão, correspondente ao dia 20 de Março, no ano de nosso Senhor de 1833. Um original está escrito em Siamês, o outro em Inglês; mas como os siameses são ignorantes do Inglês, e os norte-americanos do Siamês, uma tradução em Português e outra em Chinês são anexadas, para servir de testemunho do conteúdo do Tratado. O conteúdo é do mesmo teor e data em todas as línguas acima mencionadas. É assinado por um lado, com o nome do Chau Phaya-Phraklang, e selado com o selo da flor de lótus, de vidro. Por outro lado, é assinado com o nome de Edmund Roberts, e selado com um selo que contém uma águia e estrelas.[8]

A pujança da língua portuguesa era tal que os holandeses, ainda no século XVI, em 1596, assinaram um Tratado de Paz e Comércio com o governador do reino de Bantam, Java, em língua portuguesa, contra os interesses dos portugueses.

A natureza missionária da Religião Católica e a vocação ecuménica dos povos ibéricos, que protagonizaram a primeira globalização, projectaram os jesuítas das Missões Portuguesas no Oriente na nobre missão de dar conteúdo científico à comunicação entre as línguas orientais e a língua portuguesa, nos primeiros estudos linguísticos dos idiomas asiáticos feitos por europeus e na elaboração de silabários, vocabulários, léxicos e dicionários.

As notas abundantes tomadas na fase de aprendizagem das línguas orientais constituíram fontes essenciais de que os jesuítas se socorreram para a elaboração dos primeiros estudos linguísticos luso-asiáticos.

Apresenta-se uma lista contendo cerca de tres dezenas e meia de dicionários e outros trabalhos linguísticos que estabelecem a relação entre a língua portuguesa e as línguas orientais, entre 1588 e 1999:

Dicionário Português-Chinês, de Matteo Ricci e Michele Ruggieri, ca. 1588[9];

Dictionarium Latinum Lusitanum ac Japonicum ex Ambrosi Calepini volumine depromptum, Amacusa, 1595[10];

Vocabulário da língoa de lapan com a declaração em Portugues, feito por alguns padres, e irmãos da Companhia de lesu. Com licença do Ordinario & Superiores em Nangasaqui no Collegio de lapan da Companhia de Jesus. Anno 1603[11];

Arte Breve da Língoa Japoa, do Padre João Rodrigues S.J., em 1620.

Dictionarium Annamiticum Lusitanum, et Latinum, editado em Roma, em 1651[12];

Dicionário da Língua Siamesa, do Padre Tomás Valguarnera, ca. 1670[13];

Dicionário Tamil-Português, de Antão de Proença (1679);

Léxico Português-Malaio (ca. 1700)[14];

Vocabulário dos termos usados pelos portugueses de Macau, 1751[15];

Arte China Constante de Alphabeto e Gramática, do Padre Joaquim Affonso Gonçalves, C.M., Macau, 1829;

Diccionario Portuguez-China,do Padre Joaquim Affonso Gonçalves, C.M., Macau, 1831;

Diccionario China-Portuguez,do Padre Joaquim Affonso Gonçalves, C.M., Macau, 1833;

Diccionario Komkani-Portuguez, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Bombaim, 1893;

Hitopadexa ou Instrucção Útil (tradução de Hitopadesa do Sânscrito original para Português, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado). Lisboa, 1897;

Dialecto Indo-Português de Ceylão, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Lisboa 1900;

Dialecto Indo-Português de Goa, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Porto, 1900;

Dialecto Indo-Português de Damão, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Lisboa, 1903;

Diccionario Portuguez- Komkani, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Bombaim, 1905;

Dialecto Indo-Português do Norte, (Dialecto Indo-Português de Bombaim e seus suburbios), de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Lisboa, 1906;

Influênia do Vocabulário Português em Línguas Asiáticas, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Coimbra, 1913;

Contribuição para a Lexicologia Luso-Oriental, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Coimbra, 1916;

História de Nala e Damyanti  (tradução do Sânscrito original para Português, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Coimbra;

Dialecto Indo-Português de Negapatam,de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, Porto, 1917;

Glossário Luso-Asiático, de Sebastião Rodolfo Dalgado, I Vol. Coimbra 1919, II Vol. Lisboa, 1921;

Rudimentos da Língua Sânscrita, de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado, 1920;

Glossário Luso-Asiático, de Sebastião Rodolfo Dalgado, I Vol. Coimbra 1919, II Vol. Lisboa, 1921;

Florilégio de Provérbios Concanis, de Sebastião Rodolfo Dalgado, Coimbra, 1922;

Dicionário Chinês-Português de Análise Semântica Universal do Padre Joaquim A. de Jesus Guerra, S.J., Macau, 1981.

Dicionário Conciso Português-Chinês, de Zhou Hanjun, Zhao Hongling, Cui Weixiao, Wang Zengyang, Pequim, 1992.

Dicionário Português-Tailandês e Tailandês-Português, de Joana Vasconcelos e Pralom Boonrussamee, Bangkok, 1999.

O resultado de três séculos de convivência da língua portuguesa com as línguas orientais salda-se na existência de algumas bolsas de crioulos lusófonos na região do Indico e do Pacífico[16], na adopção de vocábulos portugueses pelo léxico das línguas orientais, em número variável que atinge a ordem das centenas no japonês, no malaio e no tamul[17], e na recepção de vocábulos das línguas orientais no léxico português.

 

2. A recriação do português: os crioulos de base portuguesa

A curiosidade e o interesse científico pelas línguas orientais, com as quais o português se relacionou, não aconteceram relativamente às formas em que a própria língua portuguesa se metamorfoseou e se recriou por esse mundo fora, excepção feita aos crioulos indo-portugueses[18] e ao crioulo de Cabo Verde[19].

Na verdade, os crioulos, historicamente, foram objecto de preconceito generalizado dos falantes do português padrão, de ridicularização, de chacota, de repressão e de perseguição política.

Lembro-me bem dos meus tempos de infância na minha ilha natal - S. Vicente, Cabo Verde - quando, no seio das famílias mais próximas dos padrões culturais portugueses-europeus, se reprovava o emprego de expressões do crioulo que involuntariamente entremeavam um discurso que se pretendia obediente às normas do português padrão[20]; a pressão exercida junto das criadas para não falarem senão em português com os meninos; a remissão feita pelos professores para o modo de exprimir e os conhecinentos directos sobre Portugal daqueles que tinham lá permanecido vários meses, em gozo de licença graciosa do progenitor[21];  a repressão do uso do crioulo nos intervalos das aulas; a estúpida identificação, pela polícia política, do crioulo a propósitos anti-portugueses e independentistas; enfim, toda uma atmosfera que visava cultivar a pureza do português e que tinha por resultado, muitas vezes, que o cordão sanitário contra a “contaminação” pelo crioulo resultasse razoavelmente até à idade de ingresso na escola primária. Aí, aprendiam-se as matérias leccionadas. Umas melhor, outras pior. Onde, porém, se registava melhor aproveitamento era na aprendizagem do crioulo, excelentemente treinado no recreio e nos percursos entre a casa e a escola...

Desde o séc. XV, os contactos dos portugueses com os povos da costa da Guiné propiciaram a existência de negros em Portugal. A escravatura era uma instituição existente em África desde tempos imemoriais. Esses africanos, esforçando-se para comunicar em português, usavam a chamada "Língua de Preto". Entre os próprios negros a designação usada era "Falá Guinee". O documento mais antigo, até agora encontrado, do "Falá Guinee"está no Cancioneiro Geral de Garcia de Resende, editado em 1516.É um poema escrito por um oficial da côrte, Fernam da Silveira[22], datado de 1455:

A mim rei de negro estar Serra Lioa,

lonje muito terra onde viver nós,

lodar caitbela[23], tubao de Lixboa,

falar muao[24] novas casar pera vós.

Querer a mim logo ver-vos como vai;

leixar molher meu, partir muito sinha,

porque sempre nós servir vosso pai,

folgar muito negro, estar vos raínha.

 

Aqueste gente meu taibo, terra nossa

nunca folgar, andar sempre guerra,

nam saber qui que balhar terra vossa,

balhar que saber como nossa terra.

Se logo vos quer mandar, a mim venha

fazer que saber, tomar que achar,

mandar fazer taibo lugar, Des mantenha!

e logo meu negro, Senhora, balhar. (RESENDE: I: 194:195)

 

Outro documento que se encontra no Cancioneiro Geral de Garcia de Resende é de autoria de Anrique da Mota[25] e contém um diálogo entre o patrão branco e a criada negra, sobre uma pipa de vinho que se entornou:

... ... ... ... ...

Fala com a sua negra.

- Oo perra de Manicongo,

Tu entornaste este vinho!

Ũa posta de toucinho

t’hei-de de gastar nesse lombo!

- a mim nunca, nunca mim

Entornar,

mim andar auguá jardim,

a mim nunca sar roim,

porque bradar?

- Se nam fosse por alguem,

perra, eu te certefico

bradar com almexerico,

Alvaro Lopo também.

- Vós logo todos chamar,

vós beber,

vós pipo nunca tapar,

vós a mim quero pingar,

mim morrer!

 - Ora, perra, cal-te ja,

Senam matar-t’-ei agora!

- Aqui star juiz no fora,

A mim logo vai té laa.

Mim tambem falar mourinho

sacrivam,

mim nam medo no toussinho,

guardar nam ser mais que vinho,

creligam (RESENDE: IV: 164:165)

... ... ... ... ...

 

No século XVI, Gil Vicente (1461-1467 / 1536) em algumas das suas obras teatrais reproduz o "Falá Guinee", através de um personagem negro-africano: Fragoa d'amor (ca. 1524) e Nau d'amores (1527).

 

 “Fragoa d'amor” (ca. 1524):

... ... ... ... ...

Poro que perguntá bos esso?

Mi bem la de Tordesilha;

que tem bos de ber co'esso,

qu'eu bai Bastilla, qu'eu bem Castilla? ...

... ... ... ... ...

 

“Nau d'amores” (1527)

 

onde intervém um negro de Beni que quer ser tão galanteador como os brancos da Côrte e cuja comicidade é conseguida pelo modo impróprio como se exprime em português, no relato das suas desventuras:

 

quere boso que mi bae

buscaro poco de venturo

que a mi namoraro sae

de moça casa sua pae

que tem saia verde escuro

firalga masa de gavião

em boquinho tão sentira

eu chamar ele minha vira

e ele chama-mo cão

 

Apesar de filho de rei (do Benim) é cómico o contraste entre a humildade com que se dirige à sua amada e a altivez das respostas desta:

 

a mi disse a ele, Maria

que quebranta foi a meu

e na mão minha barete

mi risse a ela, minha rosa

minho oio de saramonete

más aturo mundo faramosa

falai-me por o bida bosso

ela disse, quesso cabrão

a riabo que te ro cão

 

Como os demais personagens, procura a felicidade na nau:

 

Benturo quero buscai

Esse sancto caravela

Se bosso seoro mandai

 

Mas é na farsa de Gil Vicente intitulada “O Clérigo da Beira” (1526) que o negro e o seu modo de falar português ganham o apogeu da comicidade.


A comicidade decorre do preconceito de que a expressão verbal de determinados grupos é inferior à norma. Por outro lado, para legitimar a escravidão, atribuíram-se aos negros características negativas. A despeito da intenção cómica ou crítica, a expressão verbal do negro é assumida, na Renascença e no Barroco, como o avesso da norma, e estrutura-se entre estereótipos e preconceitos. (Ver um excerto d’ O Clérigo da Beira no apêndice A)

                                                                                             

Veja-se esta Salvé Raínha posta na boca do Negro da farsa,[26] para fazer rir a assistência: 

"Falá Guinee"

Latim

Português

Sabe à regina matoa misercoroda

nutra d’hum cego sável

 

até que vamos. A oxulo filho d’egoa

 

alto soso peamos ja mentes ja frentes

 

vinágre qu’elle quebrárão embalde

ja ergo a quarte nossa ha ilhos tue busca cordas oculos nosso convento

 

 

 

 

e geju com muito fruta ventre tu

 

ja tremes ja pias.

Seuro santa Maria

 

dinhero me lá darão que é vê esa carta

dame mucho que furte cantara Furunando.

Salve, Regina, mater misericordiae,

Vita, dulcedo, et spes nostra, salve.


Ad te clamamus, exsules, filii evae.


Ad te suspiramus, gementes et flentes



in hac lacrimarum valle.


Eia ergo, Advocata nostra,
illos tuos misericordes oculos ad nos converte.


nobis post hoc exsilium ostende.

 

Et Iesum, benedictum fructum ventris tui,


O clemens, O pia, O dulcis Virgo Maria.

Ora pro nobis sancta Dei Genetrix.

 

Ut digniefficiamur promissionibus Christi. Amen.

Salve Rainha, Mãe de Misericórdia,

Vida, doçura e esperança nossa, salve!


A Vós bradamos, os degredados filhos de 
Eva.


A Vós suspiramos, gemendo e chorando

neste vale de lágrimas.

Eia, pois, 
advogada nossa,
Esses Vossos olhos misericordiosos a nós volvei,



E, depois desse desterro,


Mostrai-nos Jesus, bendito fruto do Vosso Ventre.


Ó Clemente, Ó Piedosa, Ó Doce 
Virgem Maria.

Rogai por nós Santa Mãe de Deus,


Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.
Amém.


O preconceito contra as formas crioulas da língua portuguesa não tem escolhido tempo nem lugar privilegiado. Tanto desponta de um eurocentrismo racista, como brota neste magnífico mosaico étnico-cultural que é o Brasil, ou se manifesta no próprio seio de cristandades crioulas.

 

Deste lado do Atlântico registámos a opinião do filólogo brasileiro Serafim da Silva Neto: “Os falares crioulos são bastardos, irremissivelmente identificados com a mísera situação dos falantes”.[27]

Esta visão dos crioulos é preconceituosa e parcial. Fixa-se no “crioulo, língua de escravos” ou nos crioulos dos estratos mais desfavorecidos de sociedades coloniais ou pós-coloniais. Esquece-se, todavia,  que a “língua franca” que foi usada por todo o litoral do Oriente - por povos locais e europeus - e que tanto prestigiou Portugal por mais de dois séculos, outra coisa não era que um complexo de falares crioulos. E que foi esse português crioulo, e não o português padrão, a língua que tem permanecido mais duradouramente não só em comunidades de luso-descendentes pobres como Malaca, mas também entre outras bem prósperas como a de Hong Kong.

Valha-nos o Prof. Celso Cunha em “O Protocrioulo Português: Sua formação e Sua Universalidade nos Séculos XVI, XVII e XVIII”, quando afirma: “tidos largo tempo como cicatrizes, degenerescências linguísticas, sem força criadora; não sistemas entre si, mas amálgamas ou desvios de outros sistemas” são conceitos que “como bem salienta Dell Hymes, se juntam a outros, numerosos, com que o colonizador europeu procurou estigmatizar sempre as formas culturais do colonizado”.

Do outro lado do Atlântico não temos estado melhor. Em 1844 escrevia Lopes de Lima, sobre o Crioulo de Cabo Verde: “crioulo... (giria ridícula, composto monstruoso de antigo Portuguez, e das Línguas da Guiné, que aquelle povo tanto présa, e os mesmos brancos se comprazem a imitar)...[28]

No extremo oriente, o Bispo de Macau, D. Alexandre Pedrosa Guimarães, em carta ao Rei D. José I, de 22 de Dezembro de 1774, refere que as mulheres macaenses “falam uma linguagem, que é mistura de todos os idiomas e gírias, imperceptível aos que não são criados no país, por culpa dos maridos e pais de família, que há dois séculos não cuidaram em introduzir o idioma português correcto.../.

O professor régio José dos Santos Baptista e Lima, natural de Alpedriz, Batalha, Portugal, em carta enviada à futura Raínha D. Maria I, escrita em 1775, ano em que chegou a Macau, a 23 de Abril, a bordo da fragata Nossa Senhora da Penha de França, informava que a língua portuguesa era ignorada totalmente pelos nacionais de Macau, “que só fallavão um idioma mixto de portuguez e chino corrupto”, a tal ponto que necessitava muitas vezes de intérprete para saber o que diziam os seus alunos. Sem indicação expressa de se tratar do crioulo macaense, não há dúvidas que o autor da carta se referia ao patuá de Macau. Mas cometeu um erro de recém-chegado ao designá-lo por idioma mixto de portuguez e chino corrupto.

Manuel da Silva Mendes, natural do distrito do Porto, licenciado em direito, professor de Português e Latim no Liceu de Macau durante vinte e cinco anos, escreveu em 1920 que nas escolas de Macau “a matéria mais ingrata de ensinar é a língua portuguesa e deitava as culpas para cima do patois macaísta [que] não é senão um português estragado pelo contacto com a língua chinesa” (Macau – Impressões e Recordações, 1979). Cometeu o mesmo erro que o professor régio que escreveu à Raínha D. Maria I e a que se fez referência anteriormente.

Vejamos em seguida como e porquê as nossas cristandades crioulas lusófonas se deixam contagiar pelo preconceito herdado pelos portugueses, desde Gil Vicente:

Tenho visitado Malaca, vezes sem conta, desde 1985.

Procuro sempre falar com as pessoas da Cristandade Crioula de Malaca no meu Crioulo, esperando que o diálogo se faça em papiá-cristão de parte delas. Nunca consigo que o diálogo nos dois crioulos se prolongue. Há sempre qualquer coisa que os faz mudar para inglês. Às tantas cheguei a admitir que fosse o meu aspecto fisico a despertar algum sentimento colonial anti-britânico adormecido.

Descobri a causa em Damão.

Visitei Damão, em Fevereiro de 1989. Num almoço, em casa de uma família damanense, perguntei à dona da casa:

- Aqui em casa não se fala crioulo?

- Não, respondeu. E, após uma pausa, acrescentou:

- Temos uma criada hindú que fala. Se quiser, depois do almoço, poderá ir à cozinha falar com ela.

Logo que terminou o almoço fui à cozinha. A criada hindú correspondeu inteiramente ao meu desejo de falar crioulo com ela. Às tantas, perguntei-lhe, em crioulo da minha ilha natal:

- Aqui em casa, só você fala crioulo?

- Não, respondeu, em crioulo de Damão. Todos falam. Mas têm vergonha de falar à frente de visitas de fora, porque acham que crioulo é língua de gente pobre.

O preconceito contra os crioulos desenvolveu-se mais nas regiões onde  coexistiram longamente com o português-padrão veículado pelo poder exercido pelas autoridades coloniais portuguesas: Cabo Verde, Guiné-Bissau, S. Tomé e Príncipe, Damão, Diu e Macau.

Nas cristandades crioulas das demais regiões – Índia, Sri-Lanka e Indonésia – os respectivos crioulos seguiram o seu próprio destino e os seus falantes chegaram a intermediar as relações entre os agentes dos poderes coloniais holandês e britânico e as populações locais circundantes cujas línguas essas cristandades crioulas dominam também.

No fim de contas, o crioulo e a religião católica são os dois pilares principais sobre que se ergueram as identidades colectivas das Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente.

 


3.   A identidade colectiva das cristandades crioulas lusófonas do Oriente

 

A transferência de domínios coloniais entre países europeus – de Portugal católico para a Holanda protestante, principalmente - constituiu o pano de fundo em que emergiram as Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente.

Com a substituição da dominação portuguesa pela holandesa, permanecendo nas terras que as viram nascer, deportadas para outras paragens, ou forçadas à emigração, essas comunidades mestiças talharam a sua identidade própria que  perdurou até aos nossos dias, assente em dois pilares principais: a religião católica e a língua crioula.

A religião católica fora trazida pelos portugueses, directamente de Portugal ou através de Goa – a Roma do Oriente. Convertidos ou nascidos nela, com ela haveriam de morrer, geração após geração.

A sua língua – o crioulo - era a língua portuguesa na formulação que lhe garantira o estatuto de língua franca no litoral da Ásia e da Oceania, desde o Século XVI até à sua substituição pelo inglês, no Século XIX. Holandeses, ingleses e dinamarqueses  não podiam prescindir de um “língoa” ou “jurubaça” [intérprete] a bordo para poderem comerciar nos portos do Oriente, na língua que era - nada mais, nada menos – aquela que as Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente falavam e, muitas delas, ainda falam. Tratados, entre esses países europeus e alguns poderes locais, foram firmados em português, por ser a única língua a que os europeus podiam recorrer para comunicar no Oriente, ainda que contra os interesses portugueses.

A forte identidade das Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente cimentou-se em grande parte na adversidade. O conflito religioso nascido na Europa, entre católicos e protestantes, ramificou-se por todas as paragens do Oriente onde o poderio holandês derrubou o de Portugal e se firmou. A profanação e a destruição de igrejas e mosteiros, a expulsão dos padres, a proibição de qualquer acto de culto católico, as deportações maciças, a redução de muitos à condição de escravos, compeliram os membros dessas cristandades à clandestinidade, à resistência e à emigração: Macau, Índia, Insulíndia, Sião e Indochina foram os seus destinos principais.

Os que teimavam em ficar, escondidos em suas casas ou refugiados nas florestas, celebravam como podiam os actos de culto da religião católica. Sem padres e sem igrejas, organizaram-se em irmandades clandestinas que, ao fim de décadas, produziram fenómenos de cristalização cultural, de natureza religiosa - e linguística – que impediriam, por  séculos, a sua plena integração nas paróquias criadas posteriormente. Tais irmandades permaneceram até aos nossos dias e conservam determinadas prerrogativas que limitam a autoridade  dos párocos, o que é visível em algumas celebrações onde os sacerdotes se limitam à Eucaristia e à Confissão dos fiéis porque, em tudo o mais, quem manda é a Irmandade. 

Quando a dominação holandesa foi substituída pela inglesa, as Comunidades Crioulas Lusófonas do Oriente foram ficando menos oprimidas e, em alguns casos, foram as próprias autoridades coloniais britânicas a tomar a iniciativa de lhes facultar padres portugueses.

Perdida a confiança que a Santa Sé depositara desde o Século XV em Sua Magestade Fidelíssima o Rei de Portugal, na sequência do corte de relações diplomáticas, por iniciativa do Governo liberal, em 1833, e a extinção das ordens religiosas, por decreto de 31 de Maio de 1834, o Padroado Português do Oriente sofreu um golpe mortal, na Índia, no Ceilão - hoje Sri-Lanka -, no Sudeste Asiático, na China e na Oceania. Permanecendo - os que podiam - nas suas missões, os missionários do Padroado não seriam substituídos pelos seus confrades. O clero secular de Goa, numeroso e bem preparado, acorria em socorro das Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente que iam ficando sem religiosos. Quase sempre em vão. Os missionários da Propaganda Fidae e das Missions Étrangères de Paris já as ocupavam e os respectivos vigários apostólicos impediam-lhes o exercício do seu múnus. A expansão missionária francesa no Oriente começara ainda no século XVII.

As Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente - gente simples e temente a Deus - mantidas na ignorância dos conflitos entre Portugal e a Santa Sé, lutaram anos sem fim contra as novas autoridades eclesiásticas com quem conflituavam abertamente e às quais consideravam estrangeiras. Durante décadas pagaram o elevado preço de lhes serem recusados os sacramentos a que só esporadicamente tinham acesso quando aportava um navio com um sacerdote, ainda que espanhol. Clamaram sempre pelo envio de clero. De Portugal, de Goa ou de Macau. Em vão.

A firme identidade das Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente, ainda hoje, evita o casamento dos seus membros com indivíduos exteriores a elas e prefere que os futuros cônjuges provenham do seu seio ou de outras cristandades, ainda que distantes. Quando assim não acontece e o casamento une um membro da Comunidade a alguém que a ela não pertence, a regra é a conversão deste à religião católica e a aprendizagem da língua crioula.

Algumas dessas comunidades fruem um status social digno nos países onde vivem. Outras, porém, são socialmente desqualificadas e os seus membros são depreciativamente designados por “negros”, apesar da sua côr mais clara - da pele, do cabelo e dos olhos - relativamente aos naturais com outras origens étnicas.  É o que acontece na Birmânia/Myanmar.

A nível individual, nos países onde vivem, podem encontrar-se indivíduos originários destas comunidades nos mais elevados estratos da sociedade: do mundo da política à actividade empresarial, nas mais elevadas funções da hierarquia eclesiástica ou como simples párocos de aldeia. Onde se verifique a existência de uma significativa percentagem de membros destas comunidades no clero católico, isso parece resultar da intensa discriminação de que são objecto no acesso ao ensino público e ao mercado de trabalho, público e privado. Em geral, dedicam-se a actividades modestas. São pequenos proprietários, simples trabalhadores agrícolas ou pescadores.

Mas a língua crioula falou-se também nas Cristandades Crioulas Lusófonas da Tailândia – Ayutia e, posteriormente,  Bangkok - até aos anos 50 do Século XX, onde permanecem vocábulos de uso corrente no relacionamento familiar e nas práticas da religião católica. Na Indonésia, além de Java, na ilha das Flores [Larantuka e Sikka], nas ilhas de Ternate e Tidore e em Bali. Em Timor [Lifau e Bidau]. No Bangladesh -  Chittagong e Dhaka – até aos anos 20 do século XX era muito viva a presença da língua crioula nas Cristandades locais. Numa breve  passagem de poucas horas em Dacca pude certificar-me da existência de léxico crioulo entre os católicos locais.

A pequena Cristandade Crioula Lusófona de Korlai [junto a Chaúl], na Índia, somente em 1982 seria revelada ao Mundo por Laurentiu Theban. O seu crioulo é designado por Kristi.

A Cristandade Crioula Lusófona da Birmânia – Myanmar actualmente – já não usa a língua crioula e, ao contrário das demais, perdeu com o tempo os próprios nomes e apelidos cristãos, apesar de permanecer fiel à religião católica.

Com a descolonização das antigas colónias portuguesas de África foi restituído aos seus povos o direito de decidirem sobre as suas línguas nacionais. Em todas elas o português foi adoptado como língua oficial, ao mesmo tempo que se reconheceu expontânea dignidade às línguas maternas dos seus povos.

As Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente, substituído o domínio português, permaneceram sob domínio colonial europeu que as hostilizava ou, pelo menos, não dignificava. Assim permaneceram até à  independência dos países em que se encontram, onde constituem minorias com reputação variável em cada um deles. Por naturais razões de unidade do Estado, esses países mantiveram como língua oficial o inglês – a língua do último colonizador – e privilegiam uma ou mais das suas línguas maternas como língua nacional.

O poder colonial inglês não descolonizou as Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente, no sentido de restituir dignidade à sua identidade colectiva, de que a língua crioula faz parte integrante, o que, aliás, não era de esperar. Nem é de esperar que os poderes pós-coloniais  de motu proprio venham a dedicar-lhes a atenção a que têm direito.

A incapacidade de Portugal nesta matéria tem sido uma evidência secular, filha da ignorância e do preconceito.

 

4.   Línguas Crioulas: unidade ou diversidade?

 

Afirmou um linguísta cujo nome não declino que os crioulos nada têm a ver uns com os outros.

 

Não posso deixar de nutrir o maior desacordo por semelhante afirmação. Se eu dialogo, no meu Crioulo natal, com falantes dos outros crioulos, da costa ocidental de África, da India, do Sri Lanka ou do Sudeste Asiático,  sem dificuldade. Se nas nove ilhas povoadas de Cabo Verde há falantes do crioulo de Santiago que dizem não entender patavina do crioulo da ilha de Santo Antão, e falantes do Crioulo da ilha de S. Vicente que acham o Crioulo da ilha do Fogo muito difícil de entender, a questão não se coloca em termos de diversidade entre crioulos que nada têm a ver uns com os outros.

 

Se os próprios crioulos são fenómenos derivados da lei da interinfluência e do déficit de contacto com a língua padrão, é óbvio que a interinfluência de que foi objecto o Crioulo da Guiné é produto do contacto do português com as línguas africanas faladas naquela região, do mesmo modo que os crioulos do Oriente são produto da interinfluência entre línguas orientais e o português.

 

O peso da religião católica na vida das Cristandades Crioulas, em África e no Oriente, por via da catequese e demais práticas religiosas, terá constituído factor decisivo para robustecer a componente cultural portuguesa/católica nessas Cristandades.

 

A questão da unidade das línguas crioulas não se coloca aos falantes de um dos crioulos no diálogo com falantes de outros crioulos. Ela é posta em dúvida ou mesmo negada pelos que não são falantes de um dos crioulos desde criança.

 

Quem aborda os crioulos por via de amostras recolhidas, habitualmente escassas, enfrenta as maiores dificuldades. Pelo seguinte: entre os crioulos do Oriente, o Crioulo do Sri Lanka é aquele que tem gerado maior produção de transcrições efectuadas desde o tempo colonial.

 

A influência portuguesa no Sri-Lanka teve início no início do século XVI e manteve-se cerca de cento e cinquenta anos, até ao início da ocupação holandesa em 1658.   Em 1796, os ingleses ocuparam as regiões costeiras que acabaram por lhes ser cedidas formalmente  pelos holandeses em 1802. A ilha de Ceilão foi integrada no Império Britânico até à independência, em 1972.

 

Assim, boa parte das recolhas do crioulo do Sri Lanka a que há acesso, são grafadas, a partir de fontes orais, segundo a ortografia da língua holandesa ou do inglês.

 

Mas o Crioulo do Sri Lanka, apesar da substituição dos portugueses pelos holandeses nos meados do século XVII, manteve a matriz da língua portuguesa dos séculos XVI e XVII, até aos nossos dias, mesclada com léxico cingalês, com  reduzida presença do léxico inglês e escassíssimos vestígios do neerlandês. O mesmo acontece, aliás, nos crioulos da Indonésia e de Malaca em que a sucessão dos poderes coloniais foi a mesma.

 

O Prof. Kenneth David Jackson (Jackson:1990:35) dá alguns exemplos da transcrição de palavras portuguesas com a utilização de ortografia holandesa (ou inglesa):

 

Bonito: bonitoe, bunitho,bunietoe, bonetoo, buneetoo, bunitoo;

 

Coração: Korasang, korsáán, korasáán, corrassaan;


Devoção: davasáán, davassan, thavassan;

 

Água: ahgoee, agoe, agu, augu;

 

Vista: weeste, wieste, veesta.

 

A propósito do Manuscrito Nevill (Nevill Manuscript), o ilustre e respeitado professor afirma:

 

Há um interesse fonológico especial no manuscrito resultante do seu sistema gráfico, ou aparente falta dele, em que a aplicação da ortografia de influência holandesa em fala crioula produz uma aproximação mais precisa para a pronúncia crioula no último quartel do século XIX do que fizeram as transcrições por linguistas portugueses. Assim, os versos aqui apresentados mostram menos contaminação do Português padrão, uma característica infeliz dos investigadores europeus do passado.

There is a special phonological interest in the manuscript resulting from its graphic system, or seeming lack of it, in which the application of Dutch-influenced orthography to creole speech produces a more accurate approximation to creole pronunciation in the last quarter of the nineteenth century than did transcriptions by Portuguese linguists. Thus the verses presented here show less contamination from standard Portuguese, an unfortunate characteristic of the European researchers of the past. (Jackson:1990:38)

 

 

No enorme respeito e admiração que tenho pelo Prof. Jackson assenta a minha discordância relativamente às suas afirmações seguintes: 

a)   ... a aplicação da ortografia de influência holandesa em fala crioula produz uma aproximação mais precisa para a pronúncia crioula no último quartel do século XIX do que fizeram as transcrições por linguístas portugueses.

b)   ... os versos aqui apresentados mostram menos contaminação do Português padrão, uma característica infeliz dos investigadores europeus do passado.

Enquanto falante de um dos crioulos, desde tenra idade, e com um grau de compreensão muito razoável dos outros crioulos com que tenho contactado, e, ainda, sendo absolutamente ignorante do neerlandês, a minha opinião é diametralmente oposta à do Prof. Jackson. As transcrições feitas com a aplicação da ortografia do neerlandês, serão certamente entendidas pelos falantes de crioulos que dominem também o neerlandês. A sua utilidade para quem não seja falante de nenhum crioulo é, obviamente, nula.

Talvez pelo hábito adquirido, desde a infância, de usar a ortografia portuguesa e, no ensino secundário, me ter familiarizado com as ortografias francesa e inglesa, as transcrições de textos em crioulo feitas com base na ortografia do neerlandês, dão-me a sensação de os deformarem e deturparem.

Por outro lado, sustentar que as transcrições constantes do Manuscrito Nevill mostram menos contaminação do Português padrão parece-me um lapso enorme, tendo em conta a origem histórica das línguas que intervieram na formação dos crioulos de base portuguesa.

Os holandeses chegaram ao Oriente um século depois dos portugueses. A influência directa dos portugueses decorreu entre 1505 e 1638 no Sri Lanka. Malaca esteve em poder dos portugueses entre 1511 e 1641. Quer a religião católica, quer os respectivos crioulos (de base portuguesa) tinham adquirido um grau de consolidação que nem o protestantismo, nem o neerlandês enfraqueceram. Antes pelo contrário. A repressão holandesa aos dois pilares principais da cultura das cristandades crioulas lusófonas – religião católica e crioulo – robusteceram-nos nessa adversidade.

De maneira que não me parece mesmo nada  que:

a aplicação da ortografia de influência holandesa em fala crioula produz uma aproximação mais precisa para a pronúncia crioula no último quartel do século XIX do que fizeram as transcrições por linguístas portugueses.

nem que:

haja uma contaminação do Português padrão, uma vez que os crioulos de base portuguesa são precisamente filhos da convivência do português padrão com línguas africanas e orientais.

Vejamos a comparação de textos do Manuscrito Nevill com textos transcritos de outras origens, compilados pelo Prof. Jackson.

 

Manuscrito Nevill

Textos transcritos de outras origens

Rosa ne rosara

Rosa na roseira (Dalgado, Norte)

Pontia cavaloe

Marra conda grandie

Sie falta azatie

Loda minhe sangie

Amarai chendó grand

Com ping du azeite

Se não tem azeite,

Butá sangue do meu peit       (Schuchardt, Diu)

Veeda da amoor

Ja kai ne thenthasáán

Ja larga minhe graya

Ja perda davasáán

Amor e paixam,

Ta me cai na tentaçam

Que largá minha igreya

Depos a devoçam

(Jackson, Field Notes)

Amor nukoo da parmi

Nee oen alagriya

Laagri lastimadoe

Anothy didiya

Amor não me deu, Maquita

Nenhuma alegria

Senão lagre triste, Maquita

De noite e dia

(Schuchardt, Mahé)

Marihana basoo de mangara

Kee tha faeya

Tha ganya Pankadoola

Niguerinha baix de manguêr

Qui tá fasê?

Tá ganhá peccad

(Quadros, Cartas de Diu)

Sie Kerra canta

Canta saen vargoiya

Eau nuva Kappalla

Per cuspi pessoya

Si querré canta vers

Cantá sem vergonh

Eu não he cobr

Que trize peçonh.

(Schuchardt, Mangalore)

 (Jackson: 1990: 39 ss)

 

Conclusão

Os Crioulos de Cabo Verde, Guiné-Bissau e S. Tomé e Príncipe tornaram-se línguas nacionais dos respectivos países após a sua Independência, embora o Português tenha permanecido como língua oficial.  Por compreensíveis razões de natureza política, os outros Crioulos tornaram-se línguas de minorias culturais.

O diferente estatuto político entre os Crioulos não priva aqueles que não são línguas nacionais do direito ao respeito e de receberem apoio dos governos dos países a cujo património cultural imaterial pertencem.

O robustecimento de cada Crioulo não é apenas, ou de todo, um assunto interno dos países onde são falados. Todos nós, falantes de Crioulo,  temos o dever de iniciar um trabalho conjunto no entendimento da dimensão universal do nosso património comum.

Temos de unir as pontas desta teia tecida desde o século XV.

Devemos prestar homenagem a todos os crioulistas, de todas as nacionalidades, que nos legaram transcrições e outros materiais sem os quais o nosso património comum seria mais pobre.

Necessitamos reunir periodicamente os representantes das nossas comunidades para se conhecerem, para trocarem experiências e para inventariarem as nossas necessidades e as nossas capacidades.

Onde haja possibilidade de se criar uma cátedra de Crioulo, enderecemos-lhe o nosso apoio.

Até que isso aconteça, tiremos partido dos avanços registados nos meios de comunicação, dando início à recolha, gravação, transcrição e divulgação dos nossos crioulos, pela internet.   

Por que não sonhar com grandeza? Estamos em S. Paulo, na maior cidade do mais populoso país de língua portuguesa, o Brasil!



[1] O outro pilar é a Religião Católica Romana.

[2] Esta situação pode ser verificada na telenovelaXailes Negros produzida pela Rádiotelevisão Portuguesa dos Açoresem1986: www.acorestube.com/video/7878/Xailes-negros.

[3]LOCKYER, Charles:”An account of the trade in India: containing  rules for good government in trade, price courants and tables...” London. 1711.

[4]LOPES, David: “A Expansão da Língua Portuguesa no Oriente Durante os Séculos XVI, XVII e XVIII” 1ª Ed. Companhia Editora do Minho. Barcelos, 1936. 2ª Ed., Portucalense Editora. Porto. 1969: Resumo extraído de relatos dos missionários protestantes de Trangabar, na costa oriental, datados de 1733.

[5] No Verão de 1965,  jovem estudante ainda, desembarquei em Hong Kong pela primeira vez e aí pernoitei. O simpático empregado da recepção do hotel que me acolheu perguntou a minha nacionalidade. Portuguesa, respondi-lhe. Retorquiu ele, imediatamente: eu também sou cristão.

[6] Em 1985 num hotel em Malaca, durante uma conversa semelhante com uma jovem malaia, ela exclamou: - Você está brincando! Você é alto, elegante e de cabelos claros. Os portugueses são muito mais baixos e muito mais escuros. É claro que ela estava se referindo aos descendentes dos portugueses que vivem no Portuguese Settlement, em Malaca.

[7] Em 1822, John Crawfurd negoceia um primeiro tratado para estabelecer mais garantias para o comércio britânico, com a redução das taxas alfandegárias, e a autorização para o estabelecimento de um consulado no reino siamês.  Este tratadofoipublicadoem: CRAWFURD, John. Journal of an embassy from the governor-general of India to the courts of Siam and Cochin China; exhibiting a view of the actual state of those kingdoms (2ª ed). London: Henry Colburn & Richard Bentley, 1830, 2 vols. A primeira edição é de 1828.

[8]Edmund Roberts faleceu em Macau a 12 de Junho de 1836, no seu regresso de Bangkok e a caminho do Japão onde iria assinar o tratado entre o Japão e os Estados Unidos da América. Encontra-se sepultado no Cemitério Protestante.

[9] Pasquale M. d'Elia, S.J., Fonti Ricciane, Documenti Originali concernenti Matteo Ricci e la Storia delle Prime Relazione tra l'Europa e la China (1579-1615). Roma, Libreria dello Stato, 1949, 3 vol. Segundo este autor, o dicionário terá sido elaborado entre 1584 e 1588.

[10] Foi o único dicionário da língua japonesa existente até à segunda metade do Seculo XIX.

[11] No ano seguinte, foi publicado um Supplemento deste vocabulário, impresso no mesmo Collegio da Cãpanhia de Jesu com a sobredita licença & aprovao. Anno 1604.

[12] Se bem que Alexandre de Rhodes se tenha atribuído a autoria deste dicionário, desde a primeira metade da passada decada de 80 pude identificar documentos do Cartório dos Jesuitas da Ásia que não deixam margem para dúvidas de que o seu autor foi o Padre Francisco de Pina, S.J., profundo conhecedor da língua vietnamita, falecido no mar em 1605, e seus companheiros, os jesuitas Gaspar de Amaral e António Barbosa.

[13] Carta de 1 de Fevereiro de 1656 do Padre Valguarnera ao Superior da Companhia de Jesus, em Roma: ARSI, JAP.SIN.162,F16, 17. Chegado a Ayuthaya em 1655, o Padre Valguarnera logo se dedicou à aprendizagem da língua siamesa e ao ensino do português: De momento, aplico-me a adquirir a compreensão assim como a dominar a escrita. Para isso, vou a casa do Superior de um mosteiro entre os quatro de maior fama. É surpreendente como ele deseja a minha amizade; espera aprender o português durante o tempo em que me ensina o siamês.

O Dicionário da Língua Siamesa estaria certamente concluído quando Valguarnera partiu do Sião em 1670 para a este Reino voltar cinco anos depois e aqui falecer, em 19 de Janeiro de 1677.

Até ao presente, apesar das pesquisas efectuadas no ARSI - Arquivo Romano da Companhia de Jesus - no Cartório dos Jesuítas na Asia, existente na Biblioteca da Ajuda, em Lisboa, e no Arquivo Histórico de Macau, não foi possivel encontrar nenhum exemplar manuscrito, visto que se julga nunca ter sido impresso, como aconteceu com tantos outros dicionários, nomeadamente o de Ricci e Ruggieri cujo manuscrito só viria a ser encontrado e identificado no ARSI, em 1934.

De todo o modo, os autores que se referem a Valguarnera atribuem-lhe a autoria de vários escritos entre os quais os Opúsculos Religiosos, em língua tailandesa, e o Dicionário da Língua Siamesa.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                               

[14]A existência de um léxico Português-Malaio não datado mas que se admite ter sido elaborado cerca do ano 1700, descoberto pelo Dr. Luís Filipe Thomaz na Biblioteca Nacional de Lisboa em 1978, vem relatada em:

LOMBARD, Denys e THOMAZ, Luís Filipe F.R. — “Remarques préliminaires sur un lexique portugais-malais inédite de la Bibliotèque Nationale de Lisbonne”. Papers on Indonesian languages and literatures edited by Nigel Philips and Khaidir Anwar.1981. Cahier d’Archipel 18.

[15]ZHONG Wu Lam e YAN Kuong Yam : “Ao Men Ji Lue” [Monografia de Macau]. 1751. Esta obra foi editada váriasvezes em chinês. Traduzida para português por Luis Gonzaga Gomes com o título “Ou-Mun Kei-Leok”[Momografia de Macau, em cantonês].  Macau. Imprensa Nacional, 1950. Foi reeditada: Ed. da Quinzena de Macau. Outubro de 1979. Lisboa.
O vocabulário, situado nas últimas páginas da obra, contém os termos usados pelos portugueses em Macau transliterados para caracteres chineses e, naturalmente, o seu significado em chinês. Com o objectivo de estudar o português do Séc. XVIII em Macau, sobre esse vocabulário incidiram, pelo menos, os seguintes estudos: BAWDEN, C. R. - “An eighteenth century Chinese source for the Portuguese dialect of Macao” in: Silver Jubilee Volume of the Zinbun-Kagaku-Kenkyusho Kyoto.
Kyoto University Press. 1954. THOMPSON, R W. -”Two synchronic Cross-Sections in the Portuguese Dialect of  Macao”. Orbis 8.1959. 

[16]São as formas crioulas da língua Portuguesa, o português crioulo ou “dialectos ultramarinos do português”:

 Indo-português:
 Bombaim/Dialecto norteiro* (Baçaim, Bandra, Cavel, Chaúl-Korlai, Dadar, Guirgão, Mahim, Mazagão, Parel, Salsete,Taná,Tecelaria), Calcutá, Calecute, Cananor,Cochim (Vaipin), Damáo, Diu, Goa/Português de Goa*, Mahé, Mangalor, Negapatão e Trangabar/Português da costa de Coromandel*;

Sri-Lanka;

Malaio-português*;

Malaca, Penang, Singapura;

Bornéo, Celebes, Ceram, Djacarta (Pekan Tugu)/Java*, Flores, Molucas (Amboina e Ternate), Pekan Tugu, Solor, Sumatra;

Chittagong, Hughli e Patna;

Hong Kong, Macau, Xangai;

* Designação dada por Leite de Vasconcelos no ”Esquisse d’une Dialectologie Portugaise”. Lisboa. 1901.

 

[17] Outras línguas orientais que receberam vocábulos portugueses no seu léxico: Bengali, Birmanês, Cingalês, Concani, Gujaráti, Hindi, Marata, Tamul, Teto, Urdu, Vietnamita.
De uma maneira geral, as línguas orientais faladas  por comunidades entretanto convertidas ao catolicismo receberam vocábulos portugueses por via da catequese. Mesmo as línguas historicamente menos permeáveis, como é o caso do chinês, preservam vocábulos de origem portuguesa no contexto da tradição religiosa católica,
Segundo o Dr. Jin Guo Ping, ex-professor de português do Instituto de Línguas Estrangeiras de Pequim, serão cerca de 35 os vocábulos chineses de origem portuguesa, predominantemente no mandarim. Segundo a mesma fonte, o cantonense contaria com 6  e o xanganês com 1. Não tenho elementos sobre os dialectos de Ningpo (Liampó) e Min Nam (dialecto do sul da Província de Fujian, onde chegou a haver um importante estabelecimento português em Zhanzhou (Chinchéu). Mas é natural que estes dialectos do litoral da China tenham acolhido maior número de vocábulos portugueses, especialmente o Min Nam, em resultado da prolongada convivência de portugueses e chineses originários de Fujian, desde a tomada de Malaca em 1511.

[18]Dialecto Indo-Português de Ceylão, Lisboa 1900; Dialecto Indo-Português de Goa, Porto, 1900; Dialecto Indo-Português de Damão, Lisboa, 1903; Dialecto Indo-Português do Norte, (Dialecto Indo-Português de Bombaim e seus suburbios, Lisboa, 1906; Dialecto Indo-Português de Negapatam,Porto, 1917, todos de autoria de Monsenhor Sebastião Rodolpho Dalgado.

[19]BOTELHO DA COSTA, Joaquim Vieira e DUARTE, Custódio José:  O CREÔLO DE CABO VERDE: Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa: 6.ª Série: N.º 6: pp. 325-388: LISBOA: Imprensa Nacional: 1886.

[20] Em crioulo de Cabo Verde designa-se “português inchado” ao uso de um português situado a meio caminho entre o português padrão e o crioulo.

[21]A licença graciosa consistia no benefício concedido aos funcionários oriundos de Portugal de poderem gozar seis meses de férias pagas no seu País, incluindo as viagens para o respectivo agregado familiar, por cada período de quatro anos de serviço. Essa longa permanência, a que podia acumular-se um mês da licença anual, implicava, para os filhos em idade escolar, a necessidade de frequentarem  o ano lectivo em Portugal.  De modo que, ao regressarem, as crianças traziam um português mais “puro” e um invejável acervo de conhecimentos sobre Portugal adquiridos por observação directa. Invejável na medida em que, nunca tendo visto um comboio, um rio ou uma serra, os programas escolares exigiam que as crianças decorassem as linhas de caminho de ferro, os rios e todo o sistema montanhoso de Portugal, por exemplo. Ao mesmo tempo, à realidade local - o universo conhecido da nossa infância -  pouca ou nenhuma atenção era dispensada pelos mesmos programas escolares.

[22]Fernam da Silveirafoi um dos poetas palacianos mais apreciados pela graça das suas sátiras.  Tornou-se inimigo de D. João II, e entrou na conspiração do duque de Viseu. Quando esta se descobriu, escondeu-se em Setúbal. Uma escrava negra, ouvindo gemidos vindos do esconderijo onde se encontrava, foi muito assustada avisar o amo e este, receando alguma indiscrição, atirou a escrava a um poço, quando ela estava a tirar água. Fugiu para Espanha e depois para França. Foi morto nas ruas de Avignon a 8 de Setembro de 1489, a mando de D. João II.(Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico, Volume VI, pág. 944).

[23]Caravela

[24] Muito

[25]Terá nascido no Bombarral, entre 1470 e 1480. Formado em Direito, foi escudeiro do rei D. Manuel em 1499 e exerceu as funções de juíz dos Orfãos em Óbidos, tendo falecido em data posterior a 1545. Como "escrivão da corte" o seu nome encontra-se ligado a numerosos documentos, alguns dos quais importantes para a história do teatro português, como seja a carta de privilégio para Baltazar Dias, dramaturgo cego da Ilha da Madeira, redigida em Évora, a 20 de Fevereiro de 1537. Filho de uma família possuidora de "vinhas, pomares e pinhais", foi ele próprio comerciante de vinhos e na sua obra o tema do vinho encontra-se no Pranto do Clérigo e em diversas trovas.
Ler mais: 
http://visao.sapo.pt/a-invencao-teatral-de-anrique-da-mota=

[26]A farsa tem por palco o Paço Real, a Côrte, que é uma feira. Os intervenientes e adereços na farsa são: Gonçalo: o protagonista, que representa o Povo; Clérigo: representa o papado e, concretamente, o Papa Clemente VII; Francisco: é o Rei de França, Francisco I, e filho do Clérigo;  Almeida e Duarte (moços do Paço); Negro: é o personagem que intervém com expressões orais e corporais destinadas a fazer rir os espectadores; Velha; Cezília Pedreanes; Lebre: significa a liberdade que foi roubada a Gonçalo (o Povo); Capões: são os “eunucos”, isto é, aqueles que o Povo fornece para formarem as guardas militares dos grandes senhores que dominam o governo e o Estado; Marmelos: os mercenários contratados, seleccionados entre o Povo e sempre prontos a entrar em acção; Patos: os mobilizados à força para os exércitos; Limões: são os mantimentos para as tropas; Bolsa e roupas: são os bens e haveres pessoais de Gonçalo (o Povo).

O enredo e a acção resumidamente: Gonçalo (o Povo) quando ia para a côrte vender produtos de outrem (uma lebre, uns capões e um cabaz de fruta) é roubado por um Negro e dois moços do Paço. Não conhece as manhas do Clérigo (o Papa) nem do Paço (o Império). Acaba sem nada. A Lebre (a liberdade) não serviu para nada a quem ficou com ela porque está guardada em casa de um alfaiate. Os capões (guardas militares), logo após terem sido roubados a Gonçalo (o Povo) estão a ser cozinhados (aproveitados, treinados) por quem os roubou. Os marmelos (mercenários) estão sempre prontos a intervir na defesa dos interesses de quem os roubou. Os patos (mobilizados à força para os exércitos) também teriam sido roubados a Gonçalo (o Povo), se ele os tivesse levado à feira. O mesmo que aconteceu com os limões (os mantimentos para as tropas) e com a sua bolsa e suas roupas (os seus bens e haveres pessoais).

O enquadramento da farsa na política europeia é dado pelo Papa (o Clérigo) e o rei de França (Francisco) que lideram a luta de libertação da Península Itálica e da Igreja, contra os espanhóis, Carlos V e a banca alemã.

[27] NETO, Serafim da Silva: “Falares Crioulos”. Rio de Janeiro. 1950:

[28] LIMA, José Joaquim Lopes de: ”Ensaios sobre a Statística das Possessões Portuguesas no Ultramar...”.  ImprensaNacional deLisboa, 1844. 



APÊNDICE A

Clérigo da Beira”, farsa de Gil Vicente

O registo mais antigo que encontrei na literatura portuguesa àcerca do “português mal falado” ou “pretoguês” está na sátira de Gil Vicente “Clérigo da Beira”, /...representada ao muito poderoso e christianissimo Rei D. João, o terceiro do nome em Portugal, em Almeirim, era do Senhor de 1526”.

Gil Vicente revela nesta sátira uma memória auditiva admirável e um conhecimento apreciável do proto-crioulo falado pelos negros da costa da Guiné levados para Portugal.

Nesta “farça de folgar”, entre outros personagens, há o Clérigo e seu filho Francisco; Gonçalo, filho de um lavrador, que leva produtos do campo para vender na Côrte; dois moços da Côrte, Duarte que rouba a Gonçalo dois capões e um cesto com marmelos e limões, e Almeida, que rouba uma lebre; e um Negro da costa da Guiné cujo papel é fazer rir a audiência pelo modo como fala português.

Clérigo da Beira”, farsa de Gil Vicente

Excerto

“Clérigo: .../Se topares lá em fundo

                  Hum negro, põe-te a recado,

                  Porque he um perro malvado,

                  O maior ladrão do mundo.

                 

                  Não olhes no que fallar,

                  Qu’he muito falso o cabrão...

                  Olha por teu chapeirão,

                  Porque ele há-te d’atentar

                  Se tens tu olhos ou não.

                  

                  II Parte

          4. Episódio

 

Indo Gonçalo seu caminho, apartando-se do Clerigo, topa um Negro, grande ladrão, e entra cantando buscando hum mulato: e diz Gonçalo depois de cantar o Negro:

                  GONÇALO.

                  Dize, Negro, es da Côrte?

                  Neg. Qu’esso?

                  GON. S’es da Côrte?

                  Neg. Ja a mi forro, nam! Sá catibo.

                         Boso conhecê Maracoto?

                         Corregidor Tibao he.

                         Elle comprai mi primeiro;

                         Quando já pagá a rinheiro,

                         Deitá a mi fero na pé.

                         É masa tredora aquele,

                         Aramá que té ro Maracote.

                GON. Mais tredoro era o rascote

                          Quem me a mi furtou a lebre.

                 Neg. Qu’he quesso que te furtai?

                GON. Hữa lebre de meu pae,

                         De meu cunhado uns capões,

                         E marmelos e limões;

                         Abonda tudo la vae.

                                                     

                 Neg. Jesu, Jesu, Deoso consabrado!

                         Aramá tanta ladrão!

                         Jesu, Jesu, um caralasão:

                         Furunando sá sapantado.

                         Jesu! Cralasam.

Pato nosso santo paceto ranho tu e figo valente tu e sinco cego salva tera pão nosso quanto dão dá noves caro he debrite noses ja libro nosso gallo. Amen Jeju, Jeju, Jeju.

                        Sa pantaru Furunando.

                        Dize, rogo-te, fallai:

                        Conhece tu que furtai?

                        Porque tu nam bruguntando?

               GON. Perguntarei por meu pae.

               NEG. Cal-te: Deoso cima sai,

                       Que furtai ere oiai.

                       Deoso nunca vai dormi,

                       Sempre abre oio assi

                       Tamanha tu sapantai.

                       Guarda mar esso mal,

                       E senhora Prito santo.

                       Nunca rirá homem branco

                       Furunando furta real.

                       Não sabe mi essa careira:

                       Para que? Para comê?

                       Muto comê, muto bebê,

                       Turo turo sa canseira;

                       Vira mundo turo canseira:

                       Senhor grande, canseira;

                       Home prove, canseira;

                       Muiere fermoso, canseira;

                       Muiere feio, canseira;

                       Negro cativo, canseira;

                       Senhoro de negro, canseira;

                       Vai missa, canseira;

                       Prégação longo, canseira;

                       Crerigo nam tem muiere, canseira;

                       Crerigo tem muiere, canseira;

                       Grande canseira;

                       Firalgo sôlto, canseira;

                       Chovere muto, canseira;

                       Não póde chovere, canseira:

                       Muito filho, canseira;

                       Nunca pariro, canseira;

                       Papa na Roma, canseira;

                       Essa ratinho, canseira;

                       Não vamo paraiso, grande canseira:

                       Vira resa mundo turo turo he

                       Canseira.

                       Mi nam falla zombaria.

                       Pos para que furtai?

                       Que riabo sempreza!

                       Abre oio tudo ria.

                       Mi busca mulato bai,

                       Ficar abora, ratinho.

                        ... ... ... ... ... ... ... ...

Espreita o negro como Gonçalo esconde o chapeirão e o al, e tanto que se vai entra dizendo:

                                                    NEGRO.

                      A mi abre oio e ve

                      Ratinho tira besiro:

                      Ere dexa aqui condiro:

                      Não sei onde elle mettê.

                      Senhora Santo Francico,

                      Santa Antonia, San Furunando!

                      Pois mi ha d’andar buscando

                      E levare elle na bico

                      O servo Santa Maria.

 

Sabe a regina Matho misercoroda nutra d’hum cego sável até que vamos. A oxulo filho d’egoa alto soso peamos ja mentes ja frentes vinágre qu’elle quebrárão embalde ja ergo a quante nossa ha ilhos tue busca cordas oculos nosso convento e geju com muito fruta ventre tu ja tremes ja pias. Seuro santa Maria dinhero me la darão e ve esa carta da me mucho que furte cantara Furunando.

 

Acabada assim esta salve regina, acha o Negro o que Gonçalo leixou escondido, e diz:

                      Ei-lo aqui sa! Deoso graça.

                      Graça Deoso esse he capote;

                      Nunca dexa aqui palote:

                      Ratinho quem te forcasse!

                      Aramá que te ero vilão!

                      Que palote saba sam,

                      Barete tambem bo era.

                      Mi cansai e á deradera

                      A mior fica sua mão.

                      Vejamos bolsa que tem:

                      Hum pente para que bo?

                      Tres ceitil sa qui so:

                      Ratinho nunca bitem.

                      O riabo ladarão!

                      Corpo re reos consabrado!

                      Essa vilão murgurado

                      Sa masa prove que cão.

                      Quando bolsa mi achase

                      Fernão d’Alvaro, esse si;

                      Nunca pente sa alli.

                      Ah reos! Quem te furtasse

                      Bolsa Nuna Ribeiro!

                      Home bai busca rinheiro:

                       A toro ere rise:

                       Ja rinheiro feito he.

                       Aramá que tu ero gaiteiro!

                       Fernão d’Alvaro m’acontenta;

                       Elle nunca risse nam.

                       Logo chama ca crivam,

                       - Crivaninhae esormenta;                     

                       Toma rinheiro, vas embora.

                       Boso, home de bem, que buscae?

                       - Mi da cureiro agarba sae.

                       - Boso que buscae corte agora?

                       Buscae a Rei jam João,

                       Paga minha casaramento.

                       Dá ca, moso, trae esormento;

                       Crivaninhae boso, crivão:

                       Home, tomae hum dos quatro sete:

                       Vas embora turo turo.

                       Sua rinheiro sa segura,

                       Mioro que elle promete.

                       Marco Estevez moladeiro  

                       Elle risse: Santa Maria!

                       Rinheiro boso queria?

                       Bai bai dormir paeiro. –

                       Boso que pedir, muieiro?

                       - Tanta filho mi tem qui...

                       - Quem manda boso pari,

                       Boso grande parideiro?

                       - Boso seria muito bô:

                       Vaca ne Francisco paia;

                       Tenha seis fillho e mi so

                       Nam temo comere ni migaia.

                       Elle rise:

                       Que culpo tem a Rei jam João?

                       Boso parir como porco,

                       Bai buscai sua pae torto,

                       Que dai a sua fio pão.

                       Velha, que boso querê?

                       - Molla, que a mi pobre sai.

                       Elle rise:

                       Porque boso nam guardai

                       Rinheiro que bosso bebê? –

                       Jesu! Jesu! Moladeiro

                       Sa riabo aquella home;

                       Quando a mi more da fome

                       Nunca buscai sua rinheiro.

                       Porém graça a Reos, a mi

                       Nunca minga que furtá;

                       Pouco ca, pouco relá,

                       Pouco requi, pouco reli,

                       Grão e grão gallo fartá.

                       Quem furta, home sesuro:

                       E louvar a Reos com turo

                       E senhoro Prito Santo.

                       A mi bai furta emtanto

                       Camisa que esta na muro.

Vem Gonçalo tremedo de frio e diz:

                       GONÇALO.

                       Mui mao nadar faz verão

                       Até meado o Janeiro;

                       Mas agora he o ribeiro

                       Que corta homem como cão.

                       Jesu! E o meu chapeirão

                       E o cinto e a esmoleira?

                       Pois esta era a mouteira

                       E este he o mesmo chão.

                       Agora merecia eu

                       Hum par de trochadas boas,

                       Porque fiar nas pessoas

                       Nunca outro fructo deu.

                       Bem vi eu que o guinéu

                       Me vio tudo aqui leixar;

                       Mas o seu negro prégar

                       Me levou a mi o meu




APÊNDICE B

 

Crioulos de base portuguesa: colectânia de textos e respectivas versões em português padrão e notícia de outras cristandades crioulas lusófonas:

 

 

APÊNDICE B1: Bangla Desh: Dhaka e Chittagong

 

APÊNDICE B2: Birmânia / Mianmar

 

APÊNDICE B3: Cabo Verde

 

APÊNDICE B4: Guiné-Bissau, Senegal, Serra Leoa e Gâmbia

 

APÊNDICE B5: India

APÊNDICE B6: Indonésia 

APÊNDICE B7: Japão: Nagasáki 

APÊNDICE B8: Macau  

APÊNDICE B9: Malásia: Malaca, AlorStar, Penang, Perak, Kuala Lumpur,   

                        Seremban e Johor Baru

APÊNDICE B10: São Tomé e Príncipe e Guiné Equatorial

APÊNDICE B11: Sri Lanka: Batticaloa, Trincomalee e Puttalam        

APÊNDICE B12: Tailândia: Bangkok        

APÊNDICE B13: Timor

 

 

 

 

 APÊNDICE B1: Bangla Desh: Dhaka e Chittagong

Existem referências, na obra de José Maria Braga, ao crioulo falado  no, então, Paquistão Oriental, hoje, Bangla Desh.

Em 1986, quando presidia ao Instituto Cultural de Macau, desenhei o projecto de investigação denominado “Crioulos do Oriente” onde incluí o crioulo do Bangla Desh:

Trata-se de um projecto de investigação de grande porte cujo objectivo é proceder ao levantamento dos crioulos de origem portuguesa no Índico e no Pacífico, quer do ponto de vista da investigação documental e bibliográfica sobre cada um dos crioulos, quer no trabalho de campo incidindo em inquéritos linguísticos e gravações.

Este projecto, solicitado a uma linguísta residente em Macau, no primeiro trimestre de 1987, por desistência de sua iniciativa, acabou por ser aprovado em Agosto de 1988 e a sua duração prevista é de 24 meses (de 1.9.88 a 31.8.90).

O seu custo total é de MOP 636.000,00.

Foi este projecto entregue à Dra. Isabel Tomás cujo curriculum se junta e que o vem executando com elevado rigor científico e exemplar profissionalismo.[1]

No planeamento das viagens para a execução do trabalho de campo, a Dra. Isabel Tomás sugeriu-me que se deveria eliminar a deslocação ao Bangla Desh (Crioulos de Dhakha e Chittagong) que, em sua opinião, estariam já extintos. Anuí, com pena, tanto mais que, em virtude de se encontrarem cortadas as relações diplomáticas entre Portugal e a Indonésia, o projecto não poderia incluir os crioulos deste país.

Anos mais tarde, nos primeiros dias de Janeiro de 1999, numa curta escala de apenas algumas horas em Dhaka, desloquei-me à Igreja do Santo Rosário que se localiza em Tejgaon, zona urbana central da capital do Bangla Desh, que estava prestes a receber trabalhos de preservação organizados e pagos pela Fundação Calouste Gulbenkian.  A Igreja Velha, como também é conhecida, estava encerrada. Junto à Igreja Nova, muito próxima, encontrei dois jovens a quem perguntei como poderia visitar a Igreja Velha. O jovem mais alto virou-se para o mais miúdo e disse-lhe:  

Bá busca chábi

Vai buscar a chave

Este registo do crioulo do Bangla Desh, recolhido de um jovem de 12/13 anos, deu-me a alegria de saber que se entre os jovens católicos de Dhaka se fala crioulo, isto significa que esse crioulo está vivo e terá o futuro assegurado.

Para quem puder lá chegar, ficam os seguintes contactos:

Igreja do Santo Rosário, Tejgaon, Dhaka, Bangladesh:

Parish Priest: Fr. Albert T. Rozario Mobile  :(0088) 01715020250

Assist. Priest  : Fr. Ignatius Parimal Rozario Mobile  : (0088) 01710895238

Assist. Priest  : Fr. Mintu L. Palma Mobile  : (0088) 01715038067 Chittagong

Catedral de Nossa Senhora do Santo Rosário, Bandel Road, Patharghatta, Old Chittagong: A igreja é parte do mais antigo bairro cristão/português em Bengala, remontando ao século XVI.

Bishop Moses Costa, C.S.C.

Telephone: (031) 632266

 

 

 APÊNDICE B2: Birmânia / Myanmar

 

Crioulo extinto

 

Cerca de 1510, após se estabelecerem em Goa, os portugueses passaram a comerciar nos portos de Mergui, Tavoy, Serião, e Akyab permutando apoios com o rei do Pegu.

 

As relações comerciais entre os portugueses e o Rei Bayinaung do Pegu cresceram intensamente e, em 1556, havia cerca de mil portugueses, soldados e marinheiros, comandados por António Ferreira de Bragança, ao serviço daquele rei.

 

Cerca de 1595, tiveram início sérios problemas entre os reis dos diversos reinos da Birmânia. O rei do Arracão encarregou Filipe de Brito, comandante de um bando de mercenários, de capturar o porto de Serião. Este executou a tarefa mas recusou entregar o referido porto ao rei do Arracão.

 

Obtendo o beneplácito do Vice-Rei da Índia, foi conferido a Filipe de Brito o título de Capitão-Geral e Governador do Serião que se fez coroar Rei do Pegu e governou como rei absoluto entre 1600 e 1613.

 

No norte da Birmânia, o Rei Anaukphelun sucedeu no trono de Ava em 1610 e deu início imediato à unificação do reino. Conquistou Prome e Toungoo e marchou em direcção ao sul com o seu exército vitorioso.

 

Filipe de Brito aliou-se a um rei insignificante, Nat Shin Naung, e resistiu ao Rei Anaukphelun mas sem sucesso. Foi condenado à morte por empalamento que durou dois dias.

 

O resto da guarnição com suas esposas e filhos num total de 5000 pessoas foram levados como prisioneiros para o Norte. Estes prisioneiros tiveram um tempo duro quando chegaram ao reino de Ava.

 

O Rei Thalun, que sucedeu a Anaukphelun era um bom administrador e fez uso dos serviços dos prisioneiros de acordo com as suas qualificações. Quando o reino de Ava entrava em guerra, o rei recorria a estes prisioneiros que eram verdadeiros “senhores da Guerra”. Deu-lhes parcelas  de terra para seu próprio uso e permitiu-lhes construir uma igreja. Fr. Agostinho de Jesus de Lisboa escreveu dizendo que em sua visita a Ava encontrou mais de 4.000 cristãos, os quais haviam sido aprisionados na fortaleza de Serião.

 

As Cartas Ânuas dos jesuítas na Índia mencionam alguns dados muito valiosos sobre o crescimento do Cristianismo no reino de Ava. A Carta Ânua de 1644, incluiu estatísticas da Igreja Católica na Birmânia. Havia 8 aldeias católicas:

1) Ava: Padroeira: Nossa Senhora da Esperança: 150 cristãos.

2) Para o sul de Ava fica Nabaca, à distancia de 30 léguas: Padroeiro: São João        Baptista: 300 cristãos.

3) Latora (Chuang U): 400 Cristãos.

4) Tabayam (Tabayin): 400 Cristãos.

5) Machobo (Shwebo) 70.

6) Alla (Halin) 60.

7) Sikim: 200.

8) Simguem: 80[2]

 

É esta a origem da Cristandade Crioula Lusófona da Birmânia.

 

Visitei-a em Janeiro de 1998. Reparte-se por seis aldeias rurais, na Província de Mandalay.  Partindo, demanhã cedo, do aeroporto de Mandalay, consegui visitar apenas uma das aldeias, já a tarde ia avançada: Chantha Village, com 1.500 habitantes, todos de origem portuguesa. Algumas partes do percurso têm de ser feitas através de campo aberto, sem estrada. Honram-se de constituir a 14.ª geração de portugueses, desde 1613. Ao todo serão cerca de 20.000. Apesar da cor, da pele, dos olhos e do cabelo, ser mais clara do que nas demais etnias da Birmânia, são designados por kala (negros). À força da discriminação social e profissional que sofreram durante gerações, perderam o hábito de usar a sua identificação com nomes cristãos. Os mais idosos ainda se recordam dos nomes próprios dos avós (p.ex. Carlos e Zagai). Dois terços convertem-se à religião católica pelo casamento. Uma elevada percentagem do clero católico é de origem portuguesa. Na aldeia de Chantha a escassez de água é um sério problema que estará na origem de alguma lepra. Nesta aldeia, o reservatório de água da chuva era uma vala junto a uma das paredes exteriores do cemitério. Um modesto apoio recebido do exterior é proveniente da Propaganda Fide... Filipe de Brito (Cassenga, em birmane) é muito popular na Birmânia.

    

Contacto:

Fr. PETER U MYA AUNG

PARISH PRIEST

ASSUMPTION CHURCH

CHANTA VILLAGE

YE U P.O. SAGAING DIVISION

MYANMAR



APÊNDICE B3: Cabo Verde

Designação: Crioulo de Cabo Verde (com variantes em cada Ilha)

Variante da Ilha de Santo Antão

Designação: Criol de Sintanton

 

Tchgá, entrá, rastá kêdera e bo sentá, nem que for um czutchutch.

 

Durante bo estada, sinti um puquin da ilha (sê gosto, sê tchêr, sê alma...)

 

éssim, quónd bo sei, bo'n de bé dzemorêve.

Chega, entra, arrasta [uma] cadeira e senta-te, nem que seja um bocadinho.

 

Enquanto estiveres, sente um pouquinho da ilha (seu gosto, seu cheiro, sua alma...)

 

assim, quando saíres, não vais ao desamparinho.

 

 

 

 hoje bo tita bé dei dzemorêve.

Dzemoréve =  sem nada, de mãos vazias, de mãos a abanar.  É uma expressão  exclusiva do crioulo de Santo Antão e usada quando os donos da casa recebem alguém que não esperavam e nada têm para oferecer (normalmente algo para comer).

Ó meu filho, hoje vais saír daqui ao desamparinho (de mãos a abanar, de mãos vazias).

Variante da Ilha de Santo Antão/Criol de Santanton

Informante, sobre o vocábulo dzemorêve: Dr. Carlos Alberto Duarte Almeida,natural do Paúl - Ilha de Santo Antão, Licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra e professor  liceal na Ilha de S. Vicente .

 

 

K’ri i!

‘So! Pardal!

 

Rbá na top

‘Ce na kovada!

 

Manel Gonsal

Mandá pe dze-b

Oz  e min

M’ná ê bo!

 

K’ri i!

‘So! Pardal!

 

Corre  aí!

Xô! Pardal!

 

Arriba no topo

Desce na covada!

 

Manuel Gonçalo

Mandou para dizer-te

Hoje sou eu

Amanhã és tu!

 

K’ri i!

‘So! Pardal!

 

Variante de Santo Antão: Cantiga de guarda de sementeiras:  Osório, Oswaldo: “Cantigas de trabalho – Tradições orais de Cabo Verde”: 1980

 

 

Ilha de S. Vicente

Designação:  Criol de  Soncent

CRIÔL DE MALÁCA:

BRAÇA ETERNE  DE CULTURA PORTUGUÉZA NA SUDÊSTE D’ÁZIA

 

Primêr que tude, m’crê gradecê tude gente na organizaçon que cunvdóme pa assisti e partecipá nesse Confrénça. Dum manera especial, m’crê manifestá nha admiraçon e gradecimente pa Joan Margaret Marbeck. S’esse Confrénça e sê livre “UM HERÁNÇA, defésa d’ heránça de gente de Malaca” encontrá um vôz fôrte e um pilar, que ca ê sô pa gardá sês valor de tempe antigue, má tambê - e más importante - pa futurá uns estratégia nôve pa guindás e fazês fcá pa sempre.

 

Sobre téma desse Confrénça, m’ca tê duveda que tude gente li ta num posiçon medjor do que mi pa pontá o que ê más drête. M’crê sô fazê uns pergunta e uns sugeston:

 

Ta parcê obvie que conservá Criôle de Maláca ê um queston de vida ô de môrte se gente de Maláca crê vivê na sê prôpre Cultura. Era importánte sabê evoluçon de numere de gente de Maláca que ta falá criôle nesse última década, não sô na Maláca má tambê na tude bánda de Malásia e  Singapura.

 

Tambê ê importánte espiá  mudánça na cada grupe de idáde. Quês que tem menes de déz óne tita diminuí? Se rasposta ê sim, isse ê um avise. Um soluçon em parte podria sê fundá uns crêche de mergui total na Criôl de Maláca. 

Segunde composiçon étnica e linguística de populaçon de Malásia, tê algun manêra de Criôl de Maláca bê ta tê um posiçon de línga oficial?

 

Confôrme Sistéma de Educaçón de Malásia, tê algum manêra de Criôl de Maláca sê um linga de opçon quande e ondê um mínime de estudánte pedi pa prendêl? De que manêra ta podê ranjá professor pa ês?

 

Estaçons de rádie podría concordá na emiti um parte na Criôl de Maláca, ô tê algum manêra de fundá estaçons de rádie li pa fazêl?

 

Nô podê  fazê esses mésma pergunta sobre estaçons de televisão.

 

Nascide na Cábe Verde, mi tambê m’ê herdêr desse heránça de nôs tude:  Línga Portuguéza que vrá “Linga Franca” ta fazê uns quinhent óne. Criôl de Maláca e Criôle de Cabe Verde, c’m ta falá com orgui côme nha linga matérna, son lingas irmãs c’um data d’ôtes com mésma origem: Criôl indo-português de Diu, Damão, Korlai, Mangalor, Cananor, Mahé, Cochim, Criôl de Sri-Lanka, Criôl de Macau, Criôl de Java e Criôle de Guinê e San Tomê e Prince. 

Criôl de Cabe Verde, Guinê e San Tomê e Princepe vrá linga nacional na sês país depôs de Independénça, se bê que Português fecá come línga oficial. Divide a problémas de política que tude gente ta compreendê,  quês ôte Criôl fecá linga de minoria cultural.

 

Esse difrénça de posição entre Criôl d’ ôtes banda ca ta trá quês que ca ê línga nacional sê drête de ser respeitóde e de recebê juda de governe naquês país em que ês ê patrimone nacional.

 

Guindá cada Criôl ca ê assunte sô de cada país onde ês ê falóde. Tude nós que ta falá Criôl nô tê que largá num trabói fincóde pa compreendê tamónhe de Munde dêsse herança de nôs tude. Nô tê que juntá nôs gente nesse mésma heránça e estruturá interesse de tude nôs. 

 

Num futur pert, m’ta esperá que representánt de tude nôs gente podê encontrá pa conchê e ser conchide uns d’ôtes, pa trocá experiénça e pa inventariá tude nôs nescidade. Isse nô podê dzê que ê construçon de nosse comunidade de interesse de nôs tude.

 

Obrigód pa bocês tude

PAPIÁ-CRISTÃO:

O ETERNO ABRAÇO DA CULTURA PORTUGUESA AO SUDESTE ASIÁTICO

 

Em primeiro lugar,  quero agradecer aos organizadores que me convidaram para assistir e participar nesta Conferência. De modo especial, quero manifestar a minha admiração e o meu agradecimento a Joan Margaret Marbeck. Com esta Conferência e o livro de sua autoria “UMA HERANÇA”, a defesa  do Património da Comunidade Cristã de Malaca encontrou uma voz muito forte e um pilar, não só na preservação dos valores do passado, mas também - e principalmente - na futuração de novas estratégias para robustecer e tornar perenes esses mesmos valores.

 

No que se refere ao tema desta Conferência, não tenho dúvidas de que todos os participantes estão em melhor posição do que eu para apontar as medidas  mais correctas. Apenas quero fazer algumas perguntas e sugestões:

Parece óbvio que a preservação do Papiá-Cristão é vital se a Comunidade Cristã de Malaca quiser manter-se fiel à sua própria Cultura. Seria importante conhecer a evolução do número de falantes de Papiá-Cristão nas últimas décadas, não só em Malaca como também nas diversas partes da Malásia e de Singapura.

 

É importante também observar as mudanças verificadas segundo os escalões etários. O estrato correspondente aos falantes com menos de dez anos está a diminuir? Se a resposta é afirmativa, isso constitui um aviso. Uma solução parcial  poderia ser a criação de jardins infantis onde o Papiá-Cristão fosse ministrado em regime de imersão total.

 

De acordo com a composição étnica e linguística da população da Malásia, há alguma hipótese de o Papiá-Cristão obter o estatudo de língua oficial?

 

Com relação ao Sistema Educativo da Malásia, há alguma hipótese de o Papiá-Cristão ser reconhecido como língua de opção quando e onde um mínimo de estudantes deseje aprendê-lo? Como providenciar professores para essas turmas?

 

As estações de rádio concordariam em produzir emissões parcialmente em Papiá-Cristão ou existem possibilidades de serem criadas estações de rádio locais para o fazer?

 

As mesmas perguntas podem ser feitas em relação às estações de televisão.

 

Nascido em Cabo Verde, sou herdeiro do património comum de todos nós: a Língua Portuguesa que se tornou “Língua Franca” há quinhentos anos. O Papiá-Cristão e o Crioulo que tenho o orgulho de falar como língua materna são línguas irmãs entre várias outras com a mesma origem: os Crioulos indo-portugueses em Diu, Damão, Korlai, Mangalor, Cananor, Mahé e Cochim, o Crioulo do Sri-Lanka, o patois macaense, o Crioulo de Java e os Crioulos da Guiné-Bissau e S. Tomé e Príncipe.

 

Os Crioulos de Cabo Verde, Guiné-Bissau e S. Tomé e Príncipe tornaram-se línguas nacionais dos respectivos países após a sua Independência, embora o Português tenha permanecido como língua oficial.  Por compreensíveis razões de natureza política, os outros Crioulos tornaram-se línguas das minorias culturais.

 

O diferente estatuto político entre os Crioulos não priva aqueles que não são línguas nacionais do direito ao respeito e de receberem apoio dos governos dos países a cujo património nacional pertencem.

  

O robustecimento de cada Crioulo não é apenas um assunto interno dos países onde são falados. Todos nós, falantes de Crioulo, temos de iniciar um trabalho conjunto no entendimento da dimensão universal  do nosso património comum. Temos de unir as nossas comunidades na mesma herança e estruturar os nossos interesses comuns.

 

Num futuro próximo, espero que representantes das nossas comunidades se encontrem para se conhecerem, para trocarem experiências e para inventariarem as nossas necessidades. Isto significa a construção da nossa comunidade de interesses comuns.

 

Obrigado a todos.

Variante de S. Vicente/Criol de  Soncent: Palavras proferidas pelo autor na Conferência “A Revival and Development of Spoken Kristang and the Malaca-Portuguese Heritage towards the year 2000." Malaca, 1996.

 

 

 

 Ilha de S. Nicolau

Designação: Criol de Saninclau 

 

F’rá pardal, u-u-u!

Gindá na lombu, u-u-u!

Têê na kovoada, u-u-u!

Antonn kovoada,  u-u-u!

Mandá faló-b,  u-u-u!

S’bo kme’l se midje,  u-u-u!

El ta mató-b,  u-u-u!

Dia da oz, u-u-u!

Foge pardal

Sobe aos montes

Desce para a covoada

António Covoada

Mandou dizer-te

Se lhe comeres o milho

Ele mata-te

Hoje mesmo

Variante de S. Nicolau: Cantiga de guarda de sementeiras:  Osório, Oswaldo: “Cantigas de trabalho – Tradições orais de Cabo Verde”: 1980

 

 

 

 

Blén, blén, blén,

N ca ta cazá ma ‘Ntona Cuzinha – ca tin-tin-ten, ca tin-ten

Blén, blén, blén,

‘Ntona Cuzinha  ca ten cuzinha[3] – ca tin-tin-ten, ca tin-ten

 

Blén, blén, blén,

Mi pó-m cazá ê má Ana Chiquinha – ca tin-tin-ten,ca tin-ten

Lúsiu d’Mari d’Cont

Pó-m kria d’bós d’nha sobók - ca tin-tin-ten, ca tin-ten

 

Blén, blén, blén,

N ta cazá nha Lúsia -

N ten un cóch d’banana na Racantin - ca tin-tin-ten, ca tin-ten

Un sóc d’batata ma un garafon d’grog -ca tin-tin-ten, ca tin-ten

 

Blén, blén, blén,

Dobrada, dobrada, dobrada, dobrada…[4]

 

 

Não caso com a Antónia Cozinha...

 

Antónia Cozinha não tem coisinha...

 

 

Eu para casar é com a Ana Chiquinha...

Lúcio da Maria do Cândido

É para eu criar debaixo das minhas asas...

 

 

Eu caso a minha Lúcia –

Tenho um cacho de bananas no Recantinho...

Um saco de batatas e um garrafão de groque

Variante de S. Nicolau:  Cantiga de pescadores: Recolha de Ildo Lobo: Repertório de “Os Tubarões”: Osório, Oswaldo: “Cantigas de trabalho – Tradições orais de Cabo Verde”: 1980

 

 

Ilha da Boavista

Designação:  Criol de Bubista

 

Un pai tinha dôs fije.  Aquel’ más nôbo pedil’ sê parte qu’á tocâb'el de sê ardança, el despedi d’el e el ba morâ n’un terra don el gastâ na ‘strabagança de rapaz sê parte d’ardança. 

Qande el gastâ tude quél tinha el f’câ n’un am’zêra tão grande, que qu’an el câ sabia comô el bê passâ, el bâ pedi e el ôchâ un algar na casa d’un hôme  rico, que mandal’ pa un horta de seu gardâ porc.

N’ês ‘stado assin triste é qu’el conxê sê desgraça e el flâ: Ah! Qante criado á ‘stâ farto gorinhassim na nôs casa, e mi um ‘stâ li tâ morrê de fome .

Jam ca podê saportâ nhê  desgraça. Um tâ bâ pô de zoêje diante de papá, um tâ flal’. É bardade q’um offendê papá assim com’um offendê  Noss’Senhor: Jam câ tâ dêbé ser tratado comô bôcê fije, mâ um tâ pedi papá pa dam’gasajo na bôcê casa, nin q’um tratado coun qalquer criado más 'spresibe.

Conforme el flâ  assin el fazê; el anfiâ  pa casa de sê pai. El ‘stâba inda longe qan pai conxel’, e  comâ un pai nunca câ tâ garbâ de sê fije, assin qu'el ojal' el 'squecê tudo qu'el tinha el  fête, el corrê, el ba braçal’ e el purdoal’. El brâ el flâ sês criado: Bôcês bâ b'scâ un rôpa más amejor que n pâ nhê fije, e bôcês ran un bon jantar, parquê um q’rê fazê un festôna pa nôs tudo 'stâ sâbe.

 Armon más bêjo, que sempre tinha vivido como un bon fije, f’câ quaje garbado qand'el bên de châda, e qu'el ôchâ tanto festa na casa pamôde sê armon que jâ tinha largado sês casa, e que s'el tinha brâdo ê parquê já'el câ tinha más meis de passá sê bida..

 logo que sê pai  sub’q’zê  qu’el ‘stâ  tâ pensâ, dê’na el, el mostral’comâ un pai tâ ‘stimâ sês fije tud’un, e el flâl: Nhê fidje. Bô armon ‘staba môrte, e agora el tornâ dâ bida; el stâba perdido e nô tornâ ôchâl; pris’é que nô ‘stâ contente.

Um pai tinha dois filhos. O mais novo pediu-lhe  a parte que lhe cabia da herança, despediu-se dele e foi morar numa terra em que gastou em extravagâncias de rapaz a sua parte da herança

Quando gastou tudo o que tinha, ficou numa miséria tão grande que não sabia como viria a passar, foi pedir e encontrou um lugar em casa de um homem rico, que o mandou para uma horta sua guardar porcos.

Nesse estado assim triste é que conheceu a sua desgraça, e disse: Ah! Quantos criados estão fartos agora mesmo na nossa casa, e eu estou aqui a morrer de fome. 


Já não posso suportar a minha desgraça. Vou pôr-me de joelhos diante do meu pai, [e] digo-lhe: É verdade que ofendi o meu pai assim como ofendi Nosso Senhor: Já não devo ser tratado como vosso filho , mas peço pai para dar-me agasalho  na sua casa, nem que tratado como um qualquer criado mais desprezível.

 

Conforme disse, assim fez; seguiu para casa de seu pai. Ele estava ainda longe quando seu pai o [re]conheceu, e como um pai nunca deixa de se compadecer de seu filho, assim que o viu, esqueceu-se de tudo o que ele lhe tinha feito, correu, foi abraçá-lo e perdoou-lhe.  Voltou-se e disse aos criados: vão buscar a melhor roupa que há para o meu filho, e arranjem um bom jantar, porque eu quero uma grande festa para todos ficarmos felizes.

 O irmão mais velho, que sempre tinha vivido como um bom filho, ficou quase compadecido quando regressou do campo e encontrou tanta festa em casa porque o seu irmão que tinha abandonado a casa deles,  e que se tinha regressado era porque já não tinha mais meios de passar a sua vida. 

Mas logo que seu pai soube o que ele estava a pensar, dirigiu-se a ele, mostrou-lhe como um pai estima os seus filhos igualmente, e disse-lhe:  Meu filho. O teu irmão estava morto, e agora voltou à vida; estava perdido e nós tornámos a achá-lo. Por isso é que nós estamos contentes.

Variante da Ilha da Boavista / Criol de Bubista:  Parábola do Filho Pródigo: BOTELHO DA COSTA, Joaquim Vieira e DUARTE, Custódio José:  O CREÔLO DE CABO VERDE: Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa: 6.ª Série: N.º 6: pp. 325-388: LISBOA: Imprensa Nacional: 1886.  Versão portuguesa do autor.

Ilha do Maio

Designação:  Criol di Djar Mai

 

"tard di cau iém"

“tarde calma”, cau= lugar, iém = mudo, silencioso

 

"sol na ceu sangra

laranja ba ta cai

trás di santiag

tard di cau iém

djarmai para na temp

sem um muviment
 

ka bom sinal

um corv fazé um arc al ba poisa

la riba na cruz di igreja


 
Notícia, notícia trist

al bem pal da

fidje di terra barc grand ka risisti

 
Mar d´janer

Mar di nort

i vida i morte

kela nka ta intendé


 
notícia...notícia...."

[o] sol no céu sangra

Laranja [o alaranjado do entardecer] vai caindo

Por de trás [da ilha] de Santiago

Tarde calma

[a] ilha de Maio parou no tempo

Sem um movimento

 

Não é bom sinal

Um corvo fez um arco [e] foi poisar

La em cima na cruz da igreja

 

Notícia, notícia triste

Veio para dar

Filhos da terra, [o] barco grande não resistiu

 

Mar de Janeiro

Mar do norte

E vida e morte

Isso eu não entendo

 

Notícia...  notícia...

 

Variante da Ilha de Maio/Kriol di Djar Mai, composição musical de  Betú, cantada por Ildo Lobo: “ Notícia”. 

O poema canta a Ilha do Maio e os seus filhos que emigram para trabalhar nos navios mercantes holandeses. Nos  árduos e longos anos de trabalho, alguns morrem.  A morte é simbolizada pelo corvo  que voa  descrevendo arcos e poisa  na cruz  que encima a fachada principal da Igreja.  O poema foi escrito  em Crioulo da Ilha do Maio,  mas o saudoso Ildo Lobo cantou-o em  Crioulo da Ilha de Santiago. A expressão "tard di cau iém" é de uso exclusivo na Ilha de Maio. Informante: Márcia Silva, nascida e educada na Ilha de Maio e radicada em Macau, onde se licenciou  em Estudos Ingleses, na Universidade de Macau.

 

 

 

 

 

 

 

Ilha de Santiago

Designação:  Criolu di Santiago

 

Ôi Cábu Vêrdi,
Bô qu’ ê nhâ dôr más sublími
Ôi Cábu Vêrdi,
Bô qu’ ê nhâ angústia, nhâ paxõ
Nhâ vída nâce
Dí disafíu dí bú clíma ingrátu
Vontádi férru ê bô nâ nhâ pêtu
Gôstu pâ lúta ê bô nâ nhâs bráçu
Bô qu’ ê nhâ guérra,
Nhâ dôci amôr

Stênde bús bráçu,
Bú tomâ-m’ nhâ sángui,
Bú rêga bú tchõ,
Bú flúri!
Pâ térra lôngi
Bêm cába pâ nôs
Bô cú már, cêu í bús fídju
N’ úm dôci abráçu dí páz

Oi Cabo Verde,
Tu que és a minha dor mais sublime
Oi Cabo Verde,
Tu que és a minha angústia, a minha paixão
Minha vida nasceu
Do desafio do teu clima ingrato
A vontade de ferro és tu no meu peito
O gosto pela luta és tu nos meus braços
Tu que és a minha guerra,
O meu doce amor

Estende os teus braços,
Toma-me o meu sangue,
Rega o teu chão,
Floresce!
Para que a terra longe
Venha acabar-se para nós
Tu com o mar, o céu e os teus filhos
Num doce abraço de paz

Variante da Ilha de Santiago/Criolu di Santiago: Excerto do poema Dôci Guérra, de autoria de Antero Simas.

 

 

 

 

 

 Ilha do Fogo

Designação:  Criolu de Djarfogo

 

Oh, Pamode?!

M´ obiba noba de nhá?
Que noba ê cumâ bento,
Que ta anda pâ tudo mundo
Sim parâ um só mómento?

M´ obiba noba tam sabe
Que m´cunçâ tâ crê nhá cheu?
Mâ nhâ era más frumós cara
Que Nhór Dês bota de céo!

M´temba, dixâ-m´ frâ nhâ craro,
Tanto gana conhê nhá
Que m´dijijâ mi era passo
Pa m´bemba na ar tâ boa

Jâ-m´olhâ gó m´ê bardade
Cusa, que és frâ, muto más!...
Oh Déos! Oh mundo! Oh pamode!
M´cal sérba inda rapaz?!

 

Oh, Porquê?!

Já ouvira novas de si?

Que as novas são como [o] vento

Que anda por todo [o] mundo

Sem parar um só momento?

 

Ouvi novas tão boas

Que comecei a gostar muito de si?

Que era a cara mais formosa

Que o Senhor Deus mandou do céu!

 

Tinha, deixe-me falar-lhe claro,

Tanta gana de a conhecer

Que desejei ser pássaro

Para ter vindo no ar a voar

 

Vi agora que é verdade

Aquilo que disseram, [e] muito mais!...

Oh Deus! Oh mundo! Oh porquê!

Quem me dera ser ainda rapaz?!

Variante da Ilha do Fogo/Criolu de Djarfogo: Poema de Pedro Cardoso

 

 

 

 

 

 Ilha Brava

Designação:  Criolu de Djabraba

 

 

 Força de Cretcheu                         

Ca tem nada na es bida                                                   Más grande que amor                                                         Se Deus ca tem medida                                                 Amor inda é maior.                             

Maior que mar, que céu                      
Mas, entre tudo cretcheu                    
De meu inda é maior                                               Cretcheu más sabe,                                                               É quel que é di meu                            
Ele é que é tchabe                                                            Que abrim nha céu.                                                   Cretcheu más sabe                             
É quel qui crem                                  
Ai sim perdel                                      
Morte dja bem                                    

Ó força de cretcheu,                                                         Que abrim nha asa em flôr                   
Dixam bá alcança céu                          
Pa'n bá odja Nôs Senhor                      
Pa'n bá pedil semente                          
De amor cuma ês di meu                                                 Pa'n bem dá tudo djente                      
Pa tudo bá conché céu                   

 

A Força do Amor

Não há nada nesta vida
Maior do que o amor                                                               Se Deus não tem medida                                                        O amor inda é maior. 

Maior que o mar, que o céu                                               Mas, entre todo o cretcheu [amor]                                         O meu inda é maior                                                      Cretcheu más sabe, [amor mais gostoso]                              É aquele que é o meu                                                            Ele é que é a chave
Que abriu o meu céu.
Cretcheu más sabe [amor mais gostoso]
É aquele que me quer                                                               Ai se eu o perder                                                                         A morte logo chega

Ó força do amor,
Que abriu a minha asa em flor
Deixa-me alcançar o céu                                                      Para ir ver Nosso Senhor                                                     Para ir pedir-Lhe a semente                                                   De amor como este meu
Para vir dar a toda a gente                                                   Para todos conhecerem o céu

Variante da Ilha Brava / Criol de Djabraba:  Poema de Eugénio Tavares.

 

 

 

 

APÊNDICE B4: Guiné-Bissau,  Senegal, Serra Leoa e Gâmbia

        Designação: Kriol ou Kriulo

 

 

Fijus di Terra

Filhos da terra/Crioulos locais

 

Deus ku lebri

Lebri ba pidi Deus pa dal ma djireza inda. Deus falal:
 - Ba buskan tris kusa na mundu: Liti di lifanti, mel di bagera, ku irã segu.

 Lebri kuda te, i kôsa kabesa, i lanta i buska dus kabas ku  un  po kumpridu, i pega kaminhu.



I ka tarda, i odja kau ku  lifanti sinta, i na mamanta si  fidju. I kunsa na papia el sõ:  Si liti mas e kabas, bu ka fia me,  ma i bardadi.
  

Otcha ki tchiga pertu di lifanti, kil puntal:
  

- Ku kin ku bu na djusia sin?
 I falal:
- I ku kil santchu k’ na porfia kuma bu liti ka ta inchi ês kabas.
 Lifanti falal:
- Justu di kila, i ka tchiga djus. Tira liti bu jubi.





Lebre tira sõ un bias, i inchi kabas; i gardisi lifanti; Kil falal:
 - Tisin ki santchu.
 Lebri bai, i enda,  i enda te ki oja bagera i kunsa na papia el sô:
 - si mel ta inchi ês Kabas.
 - I ka ta incil.
 Bageras puntal:
 - Ku ken ku na djusia sin?
 I fala elis:
- I ku ki santchu, i kuda kuma suma i parsi ku pekadur, i sibi tudu kusa. Kuma bu mel ka ta inci e cabas.
Bageras ri, i falal:

 - Ki santchu dudu, no na mostral.
 É entra na kabas, i inchil ku mel. I fala lebri:
  

 -Tisino ki santchu.
 Lebri gardici elis, i pega kaminhu.
 I enda, i enda, ienda, i ka odja rastu di irã segu, i kunsa na papia ma el sõ:
 - Ami ku falau, bu ka fia nã sõ, ma i ma kumpridu ke po.
 Irã cegu puntal:
 

Ku ken ku bu na porfia sin?
 Lebri falal.
 - i ku ki santchu;  kuma e po ku pikininu sin ma bo cumpridu.
 Irã segu falal:
 - Kila ka tchiga djus; midin bo djubi.
 Lebri falal:
 - Pa kil santchu fia, sõ na lebau unde ki sta; no ta maral ku e korda.
 Lebri fika i na mostral kuma ki na bin mara santchu, ma e  na mara sõ irã na po. I ka caba,  i ba panha si dus kabas, i pega kaminho. I enda, i enda, i enda, tok i tchiga na porta di seu; i konki, e abril porta. I nterga Deus ki dus kabas, ku irã segu.
 


Deus falal:
 - N ka na buriu djiresa, bu ta bin nganan un dia a mi propi; ma n na jundau oreja, e na ma kumpridu gosi.  

 

Deus e a Lebre

[A] Lebre foi pedir [a] Deus para lhe dar ainda mais esperteza. Deus disse-lhe:                                                             - Vai buscar-me  três coisas ao mundo: Leite de elefanta, mel de abelha  e [um] deus cego.                                               A Lebre pensou, coçou a cabeça, levantou-se, [foi] buscar duas cabaças e um pau comprido e meteu-se a caminho.

Não tardou, viu [um] lugar em que [a] elefanta  amamentava [a] sua cria. Começou a falar sozinha:  [O] seu o leite nesta cabaça, tu não acreditas, mas é verdade.

Quando chegou perto da elefanta, esta perguntou-lhe:

- Com quem estás tu a discutir?                                               Ela [lebre] disse-lhe:                                                                         - É com aquele macaco que teima  que o teu leite não enche esta cabaça.                                                                      [A] elefanta disse-lhe:                                              - Precisamente por isso, não há-de chegar.  Tira o leite [e] verás.

A Lebre fez só uma pressão e  encheu a cabaça; agradeceu à elefanta que lhe disse:                                                                  -   Traz-me esse macaco.                                                             A Lebre foi [-se embora], andou, andou até que viu abelhas  e começou a falar sozinha:                                                            - [O] seu mel enche esta cabaça.                                                - Não enche.                                                                                        [As] abelhas perguntaram-lhe:                                                  - Com quem estavas a falar assim?                                         Ela [lebre] disse-lhes:                                                                    É com aquele macaco que, como é parecido com as pessoas, sabe todas as coisas. [Diz que] o vosso mel  não enche esta cabaça.                                                                    [As] abelhas riram e disseram-lhe:                                               - Aquele macaco é doido, vamos mostrar-lhe.           Entraram na cabaça e encheram-na com mel. E disseram à lebre:                                                                                                 -Traz-nos esse macaco.                                                              [A] lebre agradeceu-lhes, e pôs-se a caminho.               Andou, andou, andou e não viu rasto de irã cego, e começou  a falar sozinha:                                                           - Eu é que te digo, tu não acreditas, mas é mais comprido que este pau.  [O]  irã cego perguntou-lhe: 

Com quem é que tu discutes assim?                                       A [A] lebre disse-lhe:                                                                           - É com aquele macaco; que este pau , que é pequenino, é mais comprido que tu.                                                               [O] irã cego disse-lhe:                                                              - Esse não chega precisamente; mede-nos  e vê.                     A lebre disse-lhe:                                                                      - Para que o macaco acredite, levo-te onde ele está; amarramo-lo com esta corda.                                                    [A] lebre ficou  a mostrar-lhe como amarrar o macaco, mas só amarrou o irã ao pau. Mal acabou, apanhou as duas cabaças e pôs-se a caminho.  Andou, andou, andou até que chegou à porta do céu; bateu, abriram-lhe a porta. Entregou a Deus as duas cabaças e o irã cego.

Deus disse-lhe:                                                                                   - Eu não te acrescentarei  esperteza, [porque] virás enganar-me um dia a mim próprio; mas vou puxar-te as orelhas que ficarão mais compridas agora.

BULL, Benjamim Pinto:  "Crioulo da Guiné - Bissau. Sabedoria e Filosofia".Tradução do autor  revista e corrigida pelos  Engenheiros  António Emerenciano Estácio e Malam Sambu.

 

 

 

APÊNDICE B5: INDIA

Damão– Designação: Crioulo de Damão

Antú vi. Eu tem contan pór-óss um chistoz histór. Mim mãe tim fallan quand tinh piquinin.

Tinha naquel temp um velh morteng. E’ll tinh doi creád mulher e bastant barzúc.

 

Esse doi mulher, um tinh nõm Gitrud e ôt Análl. Bem cêd aquell velh tinh fazen cordá sú criad quand tinh cantan gáll.

 

Anall já fallou pú Gitrud: Ess nóss don munt rabjent; qui cêd jà tem fazen launtá; num tem dixan durmi mesmo tud nôt. Gitrud já respondeu:

 

Bai Anall, bam nós fazê um coiz; voss turcê gargant de gall e falla pú velh; Gall tinh gemen-gemen; já isticou canell.

 Qui ha fazê Bai? Anall já fazeu qui lai Bai Gitrud tinh fallan. Velh já ficou mnt mortificad.

 

Mas óss tem saben, éll qui coiz ja fez? E’ll n’um tinh durmin e tá fazen cordá mê-not. Qui disgrass!

 

Amb já ficou arrependend munt, mas qui á fazê? Tard arrependid infern tem chê.

António venha. Eu vou contar-lhe uma história engraçada. Minha mãe contou-me quando eu era pequenino.



Havia naquele tempo uma velha macilenta. Ela tinha duas criadas e muita riqueza. [barzuc: moeda antiga de Damão].



Essas duas mulheres, uma tinha o nome de Gertrudes outra Anália. Bem cedo aquela velha acordava as suas criadas quando o galo cantava.

 



Anália disse a Gertrudes: Esta nossa dona [é] muito rabujenta; tão cedo tem de fazer-nos levantar; não nos deixa dormir todas as noites. Gertrudes respondeu:  

 



Vai Anália, vamos fazer uma coisa; você torce o pescoço ao galo e diz à velha; o galo estrebuchava;  já esticou as canelas.



Vamos a isto? Anália fez como Gertudes disse. A velha ficou para morrer.

 



Mas sabem o que ela fez? Ela nunca dormia e fazia-nos acordar à meia-noite. Que desgraça!

 


Ambas ficaram muito arrependidas, mas que fazer? De arrependidos está o inferno cheio.                                                                                                                                                                                                                           

MONIZ, António Francisco: Notícias e documentos para a História de Damão: Uma fábula de Esopo: A velha e o galo. Tradução do autor

 

 

Diu – Designação: Crioulo de Diu

Niguerinha baix de manguêr

Qui tá fasê

Tá buli cadêr

 

Niguerinha, cum port fichad

Qui tá fazê

Tá ganhá peccad

 

Niguerinha, cum barrig inchad

Qui já comê

Batat limpád

Negrinha de baixo da mangueira

O que estás a fazer

A rebolar os quadris

 

Negrinha com [a] porta fechada

O que estás a fazer

A cometer pecado

 

Negrinha com [a] barriga inchada

O que comeu

Batata descascada

QUADROS, Jeronymo: Cartas de Diu, 1907

 

 

Korlai

Designação: Kristi

 

Um rêi su kabel ki korta ani su barb ki fêje um barber tivi kad suman

 

di rêi ja punto ki barber mi rênad su jent ki lei tem?

 tar barber ja falô ki

tud  jent kumen beben tã  fart.

Dapai rêi ja punto ki barber sus pert ki t

 

Dapai barber ja falô ki rêi sus pert t vac, boi ani bufl rapad dakal kumen beben fart tem.

 

Dapai rêi ja falô “a sim”? tar barber ja falô “sim”

Dapai barber ja kortô rêi su kabel  ja fejeu su barb ani barber ja foi su kaj torn.

 

Dapai rêi ja camô ki pradan ani ja falô ki pradam ki mi pert barber ki te tavi mi kabel ki korta  ani mi barb ki fêje

io p’el punto ki mi reanad su jent kumen beben kile tem?

Tar barber ja falô par mi ki tud jent kumen beben fart tem.

Dapai rêi ja falô ki pradan ki vai ani ulia barber su pert ki tem.

Dapai pradan ja tumô doi soladad su kosid  ani ja vo  alde ani punto ki jent ki uzo kumen beben kile di pasan?


Dapai jent falô ki no jent su servis feje ani ak  diyer kit enkotra no ta teje anako saman ki no fil  famil ki kumen. Ta bom.

 

Dapai elo ja voi maiaj ani punto ki um om: uzo kumen beben kile tem? El falô agu di not feje raro sukãy ani asi no di feje pasa.

 

Dapai elo trai pisom ja voy barber su kaj ani punto ki barber: vo ani vo fil famil kumen beben kiley tem?  Tar barber ja falô: no kumen beben fart tem.

 

Dapai pradan ja punto ki barber: vo pert ki tem. 

 Dapai barber ja falô ki pradam ki mi pert vac , boi ani bufl tem

Asi? ki pradan ja falô rapad dakal me vo ta falan ki rêi ki tud gent kumen beben fart tem.

Dapai  pradan ani soladad ja ve torn ani falô ki rêi ki barber su pert tem vac, boi ani bufl ani rapad dakal  el falan ki tud gent reanad su kumen beben fart tem

Dapai rêi ja de ord ki pradam ki vai ani barber su tud animal pega ani puja da trank.

 

Sigun di barber ki ja ve rêi su kabel ki corta ani barb ki feje, rêi punto ki barber: ki mi reanad su jent kumen beben hilei tem?

Dapai ja falô ki rêi: ki tud jent muren fom. Pelo nute ki kume ani ag ki bebe

Dapai rêi p’el ja falô ki vo kumen beben fart ti,  tar tud jent kumen beben fart tem asi vo tim falan. Ago vo animal tud dent trank ja pujo tar vo ta falan ki tud jent fom muren

 

Dakal so su nusta moro nu pesa, tud mun su pesa kere.

 

Agor ja kabo ye istor.

Muit obrigad

Um rei que cortava o cabelo e que fazia a barba [com] um barbeiro que tinha cada semana, [semanalmente]

[um] dia [o] rei perguntou [ao] barbeiro: no meu reino, a gente como vai?

Então o barbeiro [disse] falou que

toda a gente come e bebe à farta.


Depois o rei perguntou  ao barbeiro os pertences que tinha

Depois o barbeiro [disse] falou ao rei [os] pertences que tinha: vaca[s], boi[s] e búfalo[s]; por isso que [se] come e bebe com fartura.

Depois o rei [disse] falou: “Ah sim?” e então o barbeiro [disse] falou: “sim!”

Depois [de] o barbeiro [ter] cortado [ao] rei o  cabelo [e] feito a  barba foi [-se embora], de  regresso a casa.

Depois [o] rei chamou o ministro [e] falou ao ministro que [o] meu barbeiro que aí esteve a  cortar [-me o]  cabelo e fazer [a] barba

eu  perguntei para ele: o que no meu reino a gente come e bebe?

Então o barbeiro falou para mim que toda a gente come e bebe à farta.

Depois o rei falou que [o] ministro fosse ver os pertences que o barbeiro tinha.

Depois [o] ministro tomou dois soldados consigo e foi à aldeia e perguntou àquela gente [o] que costumavam comer [e] beber [e] como passavam os dias.

Depois [a] gente falou que:  a nossa gente o seu serviço [que] faz e é com [o] dinheiro que cada um encontra  [que] nós temos em cada semana que [os] nossos filhos [e] famíla comem. Está bom.


Depois já havia mais gente e perguntou a um homem: [o que] costumam comer e beber? Ele falou [disse] água à noite é raro, cana de açucar e assim fazemos passar os nossos dias.

Depois os três foram a casa do barbeiro e perguntaram: você e [os] vossos filhos [e] família o que é que têm para comer e beber? Então [o] barbeiro falou: nós comêmos e bebemos à farta.

 

Depois [o] ministro perguntou ao barbeiro: você que pertences tem?.

Depois [o] barbeiro falou ao ministro: [os] meus pertences são vaca[s], boi[s] e búfalo[s]

Ah sim? O ministro falou, por isso mesmo você tem falado ao rei,  que toda a gente come e bebe à farta.

Depois [o] ministro e [os] soldados vieram de volta e falaram ao rei que o barbeiro tinha vaca[s], boi[s] e búfalo[s] e, por isso, ele falou que toda a gente no  reino comia [e]  bebia à farta

Depois o rei deu ordem para o ministro ir e, [do]  barbeiro, todos [os] animais tomasse e pusesse trancados.

[No] dia seguinte o barbeiro  veio  para [ao] rei cortar o cabelo e [a] barba fazer, [o] rei perguntou ao barbeiro: o quê, no meu reino, a gente come [e] bebe, [e] como passam?

Depois falou o rei: que toda [a] gente morre de fome. Pela noite, o que come e que água bebe?

Depois [o] rei para ele falou:  quando você comia [e] bebia à farta, toda a gente comia e bebia  à farta, assim você falava. Agora  os vossos animais todos  dentro  [das] trancas, já pode então falar que toda [a] gente morre de fome .

Onde está  a  sua moral: não pense [que] todo o mundo quer o seu pensamento [pensa como você].

Agora acabou a história.

Muito obrigado

Recolha e tradução do autor (1989), revista e corrigida por John Álvaro Libano, natural de Damão.

 

 

 

 

APÊNDICE B6:

Indonésia

 

Tugu (Java)

Iste figura yo bende ku ele

Este quadro/pintura eu vendi a ele

Batavia/Jakarta

Kantu kere da ake londra kum yo

Se quiser dar essa honra a mim

 

Tugu – Canção em Krontjong Morisco:

Pasa na bordi di mar

Ola nabiu Kêrê nabiga

Vilu vilu nang korsan mal

Nungku atja di d’justisa

 

Anda-anda na bordi di mar

Minie Korsan nunka contenti

Io buska ja minia amada

Nunka sabi ela ja undi

 

Io buska minia amada

Ia minia noiba, minia amor

Io busca até tuda banda

Isti korsan teng tantu dor

 

Io prunta fula strela

Bosoter nunka ola un tenti

Fula e strela nunka resposta

Minia Korsan nunka contenti

 

O bie aki minia amada

Minia noiba, ó moler bonito

Io espara com esparansa

E canta kontigu Moresco

Passeia na beira mar

Olha os navios, quer navegar

Filho, filho não [tem] mau coração

 Nunca encontres [o] dia da justiça

 

Passeio à beira mar

Meu coração nunca [está] contente

Procurei a minha amada

Nunca sei onde ela [foi]

 

Procuro [a] minha amada

Ela [a] a minha noiva, [o] meu amor

Procuro por todo [o] lado

Este coração tem tanta dor

 

Pergunto [às] flores, [às] estrelas

Vós outras nunca a vêem

[As] flores e [as] estrelas nunca respondem

Meu coração nunca [está] contente

 

Oh, vem aqui minha amada

Minha noiva, oh mulher bonita

Eu espero com esperança

E canto contigo [o] Morisco*

*O Krontjong Morisco é um género de música popular indonésia, de raiz portuguesa

 

 

 

 

 APÊNDICE B7

 

Japão – Nagasáki - Extinto

 

 

Traslado do despacho q. o Governador de Nangasaque; Cavanguchi Goenzeimon Sama; mandou ao Navio, pr. Escripto, segunda-feira pela manhãa; aos seis de Agosto; e explicado pelo Jurubaça [intérprete]: Guichizaimon; com as mesmas palavras dittas, e explicadas p.r elle, na mesma maneira q. afsima tenho ditto; em minha prezença, e dos quatro Jurubaças; cujos nomes acharaõ ao pé do d.° despacho; e dos mais q. prezentes estavaõ.

 

Copia do despacho q. o Governador de Nangasaque, mandou ao Navio, p.r escripto, e foy explicado em Portuguez, pelo Jurubaça [intérprete]; q. p.r  naõ estar em modo q. todos o poçaõ entender: eu Manoel de Aguiar Pereira, o traduzi, tirado do seu próprio original, q. declarou o Jurubaça: Guichizaimon; e me reporto ao proprio. 

 

Portuguezes fallarão neste tempo a Macao Japaõ, já acharaõ tromenta, já chegaraõ, p.r ifso já mandá doze pefsoas até Nangasaque, já chegou o Senhor Governador, já tomá Portuguezes p.ª Japaõ; no misté fazé viagem p.ª Japaõ, este tempo já achá  tromento de gente p.ª trazè aqui, p.r q. sombra de Christaõ, não insiná, agora já tem despacho do Governador de Nangasaque, p.ª Navio com gente vay p.ª Macao; daqui p.r diante no misté vem mais, agora mandá torná p.ª Macao; quando chega lá, avizá p.ª cabeça de Governo, no misté mandá Navio p.ª Nangasaque, p.r. q. este já trazê estes doze Japões, torná vay; agora Governador de Nangasaque já tem fazê tudo este, elle ligo mandá avizo p.ª Corte de Emdó,  p.ª o secretário informá p.ª Emperador, como Gov.ºr  de Nangasaque já dá este despacho, p.ª Navio q. veyo de Macao, trezê doze Japaõ.

O Governador logo dá todo necefsário p.ª viagem de Macao, quando for tempo de bom vento, e monçaõ p.ª fazê sua viagem p.ª Macao.

Dado em sete de Setembro da setima Lua; em Segunda feira, seis de Agosto de 1685 an.ºs.

Por dizerem os Portuguezes, q. p.r cauza das tormentas, fora portar a Macao, huã Embarcaçaõ com doze Japões, p.r esta cauza, os madaraõ a Nangasaque a entregar; o Governador tomou entrega delles; e de hoje p.r diante, naõ venhaõ mais Portuguezes a Japaõ, p.r q. com a sua vinda, padece a gente tormentos; rezaõ p.r q. naõ querem q. haja sombra de Christaõs, pelo ensino q. daõ a sua gente: p.r agora o Governador de Nangasaque dá este despacho; q. o Navio, e a gente volte p.ª Macao; e chegando lá, advirta ao cabeça do Governo, q. naõ mande mais Navio a Nangasaque; q. este, p.r ter trazido os d.ºs doze Japões, torna a hir; e toma sobre si este despacho, q. elle fará avizo desta sua determinaçaõ, ao secretário da Corte de Emdó, p.ª de tudo fazer Informe ao Emperador, do despacho q. deu ao Navio q. veyo de Macao a trazer os doze Japões; e q. dará todo o necefsario p.ª a partida do d.º, p.ª Macao, quando for tempo, e monção de bom vento.

 

Dado em sete de Setembro, da setima Lua; em segunda feira, seis de Agosto de 1685 an.ºs.

Arquivo Histórico de Macau: Assento e memória de hum Barco q. veyo de Japaõ, desgarrado, p.r força dos temporaes; a estas Ilhas da China: Em Março de 1685. Breve, e sucinto Relatorio q. dou, ao Governo da Nobre Cidade; da viagem q. fiz a Japaõ, a levar os doze Japões, q. os temporais os trouxeraõ a este Cidade, na sua Embarcaçaõ; p.ª os entregar ao Governador de Nangasaque: com carta p.ª o mesmo.

(Arquivos de Macau: Vol. I: N.°4: Setembro de 1929: 232:233).

 

Breve enquadramento histórico:

A intriga holandesa contra os portugueses no Japão pôs termo ao comércio de Macau naquele país em 1610. A perseguição religiosa contra os cristãos que confessavam a sua fé tinha por resultado a sua tortura e morte nas décadas seguintes.  A proibição definitiva aos portugueses de residirem no Japão ocorreu em  1636 e foi repetida anualmente, até 1639. Em 1640 foi organizada uma embaixada em Macau para ir ao Japão tratar do reatamento do comércio com aquele país. Composta por 74 pessoas, a embaixada chegou a Nagasaki no princípio de Julho de 1640. A 3 de Agosto seguinte, 61 membros dessa missão foram decapitados, a embarcação em que viajaram foi queimada e os 13 sobreviventes enviados de volta a Macau. 

A cessação do comércio com o Japão colocou a economia de Macau em situação ruinosa.

A 10 de Março de 1685, foi localizada, na ponta da Macareira, uma embarcação com 12 japoneses a bordo, aí arrojada pela força de um temporal. A notícia causou grande alvoroço na cidade por se vislumbrar a possibilidade de reabertura do comércio entre Macau e o Japão, passados 47 anos, tirando partido da sua repatriação devidamente organizada.

Partiram os náufragos  japoneses, devidamente acompanhados  por séquito de 47 pessoas, adequado ao fim em vista, na fragata S. Paulo, propriedade de Pedro Vaz de Sequeira, que chegou  a Nagasaki em 3 de Julho de 1685. Tiveram de partir de regresso a Macau em 20 de Agosto seguinte, face à recusa taxativa das autoridades japonesas em reatar as relações com os portugueses. 

Chefiou esta missão Manuel de Aguiar Pereira, viúvo e natural de Macau.

No relatório da missão apresentado ao Governo da Nobre Cidade (de Macau), com data de 3 de Outubro de 1685[5], Manuel de Aguiar Pereira refere: o Intérpetre antigo dos Portuguezes, quando hiaõ a Japaõ (p. 220); com estes vinhaõ quatro Japões, q. todos fallavaõ Portuguez; hum deles era o Jurubaça antigo dos Portuguezes; home’ já velho; e lhe perguntey pela hidade; ao q. me referio, dizendo-me q. tinha, setenta, e sete annos (p. 221); cujo nome era Guichi Zaymon (p. 232).

Os documentos que se reproduzem acima contêm o despacho do Governador de Nagasáki. Do lado esquerdo, trata-se da tradução para português feita pelo velho intérprete dos portugueses sobre o original escrito em japonês. Do lado direito é a mesma tradução corrigida por Manuel de Aguiar Pereira por  não estar em modo que todos o possam entender.

Nascido em Macau, Manuel de Aguiar Pereira exprimir-se-ia correctamente em português padrão e em maquista ou patuá, como aconteceu com várias gerações de macaenses, filhos de pai nascido em Portugal e de mãe macaense, de que recordo José dos Santos Baptista de Miranda e Lima, poeta clássico e satírico, em patuá, (10.11.1782 - 22.1.1842) e José dos Santos Ferreira, escritor e poeta (28.7.1919 – 24.3.1993).

Que português falava o intérprete  Guichi Zaymon? Certamente não seria o português padrão. Esse, todos os portugueses entendiam. E Manuel de Aguiar Pereira entendia ambos. O intéprete japonês falava, muito provavelmente, um crioulo de base portuguesa: o maquista ou patuá, presente em Macau enquanto a mãe dos macaenses tinha origem malaqueira, indo-portuguesa, do Ceilão, timorense, em suma, era asiática não chinesa.

A análise de conteúdo da tradução do texto japonês do Governador de Nagasáki feita por Guichi Zaymon contém modos de exprimir arcaicos que persistem nos crioulos de base portuguesa mas desapareceram no uso atual da língua portuguesa:

 

já mandá doze pefsoas

Mandaram doze pessoas

no misté fazé viagem p.ª Japaõ

Não precisam de viajar para o Japão

daqui p.r diante no misté vem mais

Daqui por diante não é preciso virem mais

mandá torná p.ª Macao

Mandou regressar a Macau

quando chega lá, avizá p.ª cabeça de Governo, no misté mandá Navio p.ª Nangasaque

Quando chegarem lá, avisem a cabeça do Governo, [que] não é preciso mandar Navio a Nagasáki

 

      

 

 APÊNDICE B8

 

Macau

 

Designação: Maquista ou Patuá

Excertos de um diálogo entre dois primos macaenses, Augusta e João Fernandes, (ca. 1860*):

Antes de eu vae pra Hongkong

De onze anno para dose

Eu já estudá garmática

 Na escola de Padre Jorje. (*)

 

A:  Pergunto se o primo ainda
    
Sabe as regras de grammática?

JF: Eu nom pode lembrá tudo,

      Ja perdê bastante pratica. 

 

A:  Primo falIa erradamente
      Falla apenas um “patois”.

JF: Masqui patuá, tudo gente

      Entendê cusa eu falIa

 

A:   Sendo algum portuguez novo
       Não o pod’ra entender.

JF:  Com minha zápi catápe,

       Logo fazê comprendê

 

A:  Primo é rico, tem dinheiro,
     
Pode aprender portuguez,
      Ao menos meia
hora à noite,
     
Quanto gastará por mez?

JF:  Portuguez oze em dia

       Só serve pra pobretão

       Quem más podê, prendê inglez 

       Pra podê ganhá sua pão.

 

A:  Primo não sabe avaliar
      O que é a língua portuguesa.

JF: Só serve pra ovi missa

     Com livro dentro d’igreza

 

     Papá fálá são asnera

     Querê prendê portuguez,

     Que unga lingu tão inutil

      Devê esquecê de unga vez.

 

      N’ Hongkong tudo prendê inglez

      Nôs, china, como estranzero

A:  Primo se assim continua 

      Fica sendo malaqueiro

 

[Antes de eu ir para Hong Kong]

[Dos onze anos para os doze]

[Estudei gramática]

[Na escola do Padre Jorge]

 

[Não posso lembrar tudo]

[Perdi bastante prática]

 

[Embora “patois”, toda a gente]

[Entende o que eu digo]

 

 

[Com os meus trejeitos (?)]

[Faço-me entender]

 

 

 

[O português hoje em dia]

[Só serve ao pobretão]  

[Quem tem meios, aprende inglês]

[Para ganhar o pão]

 

[Serve apenas para ouvir missa]
[Com o missal na igreja]

[O pai disse que é asneira]

[Querer aprender português,]
[Porque uma lingua tão inútil]

[Deve esquecer-se de vez]

[Em HK todos aprendem inglês]   

[Nós, os chinas e os estrangeiros]

   

 (*) Se bem que datado de 1895 (“Renascimento” III, n°1, Imprensa Nacional. Macau. 1945) este diálogo humorístico retrata uma situação que me parece ter lugar uns quarenta anos antes. Afirmo isto, pela referência à “escola de Padre Jorje”. Trata-se da Escola Principal de Instrução Primária de que o Padre Jorge António Lopes da Silva (8-5-1817/14-7-1870), natural deMacau, foi director e mestre de português, entre 1847 e 1854 (V.TEIXEIRA, Pe. Manuel - ”A Educação em Macau”.Direcção dos Serviços de Educação e Cultura Macau 1992, p. 40). Seja uma ou outra a idade deste documento, não deixa de ser estranho que tenha sido publicado pela primeira vez em 1945 mercê do trabalho notável de Leopoldo Danilo Barreiros de salvar tudo o que existia do “Dialecto Português de Macau”.

 

 

APÊNDICE B9:

 

Malásia - Malaca, Alor Star, Penang, Perak, Kuala Lumpur, Seremban e Johor  Baru

Designação: Kristang, Papiá kristang, Portugis

 

Pai Nosso

Avé Maria

 

Pai nussa nussa Pai

Pai nussa ki teng na seu
Santafikadu bossa Nomi
Bossa reinu beng
Bossa bontadi kumpri

Na terra assi kuma na seu
Dar nussa pang di kada dia
Perdua nussa pekadu
Assi nus perdua nussa inimigu
Nang dessa nus teng mal intentasang
Mas libra kum nus di tudu mal

 

 

 

Ave Maria

Ave Maria cheu di grasa
Sinyur teng kum bos
Bensuadu bos di tudu muler
Bensuadu akeli fruta di bossa ventri, Jesus
Santa Maria Mai di Deus
Rogar per nus pekador agora
Assi na oras di nussa morti
Amen.

 

DA SILVA, Patrick,  Revista de Cultura, Macau: 1988, n.º 5, pp. 105-110.

 

 

 

APÊNDICE B10:

São Tomé e Príncipe e Guiné Equatorial

Designações:

 

Ilha de S. Tomé:

        Forro ou Fôlo, São-Tomense ou Santome

        Língua dos angolares: Lungua N'golá

 

Ilha do Príncipe: Lunguyê

 

Guiné Equatorial – Ilhas de Fernando Pó e Ano Bom: Fá d’Ambô ou Flá d’Ambu

 

Forro ou Fôlo

 

 

 Declaraçón Universal di Dirêtu di Hómé 

Artigo 1º

Tudu nguê di mundu ca nancê livli e igual ni dignidade e ni dirêtu. Punda nen ca pensá e nen tê cunxensa, selá nen fé tudu cuá cu tençón de lumón.

 


Declaração Universal dos Direitos Humanos

 Artigo 1°

Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.

 

Seja lovadu!

Seja louvado!;  olá

Bom dja ô

Bom dia

Bos tadji  ô

Boas tardes

Boj  notxi  ô

Boas noites

Que nomi  bo  e?

Que nome você tem?/Como se chama?

Nomi  mu  sa  Pedro

O meu nome é Pedro

 

Quá mandá bô scá fugi um?

 

Quá mandá bô scá fugi mun?
quá mandá bô bá condê?
chi bô fé áchi pa’n quêcê,
çá máchi cu’n scá lemblá bô.

Ch’in glává bô, quêcê glávu,
pódá póbli pécádô
piá mó Santu Slavadô
pódá San Pédu cu négá Sun.

Máchi boá Dêssu mátá mun
dô quê pena (sé) cu’n çá nê…
(quá) cu’n fé bô, quá cu non tê,
quá mandá bô scá fugi mun ?

Melhó ‘nga môle ũa vê
dô quê óla cu’n plêdê bô!
quá bô tê no mê d’ôbô!
quá mandá bô bá côndê?

Máchi bô lentlá n’ôbô,
máchi cu bô scá fugi mun,
çá machi qu’n scá lemblá bô…

Para que foges tu de mim?

 

Para que foges daqui?
p’ra que te vais esconder?
se o fazes p’ra te esquecer,
mais me lembrarei de ti.

Se te ofendi, aqui estou
dá perdão ao pecador,
vê o exemplo do Senhor
que as ofensas prdoou.

É melhor a morte, sim,
do que viver a penar…
se fiz mal só por te amar,
porque foges tu de mim?

Mata-me antes (sei morrer
por minhas culpas) sem dó,
porque foges para o óbó,
porque te vais lá esconder?

Para que foges daqui,
p’ra que te vais esconder?
se é para eu te esquecer,
mais me lembrarei de ti…

Poema de Fancisco Stokler, com tradução de Jerónimo Pontes

 

Lungua N'golá

Ê  ra Têtêuga  ua  kiba  palaxu

Ele deu à Tartaruga uma parte deste palácio

 

Lunguyê, Língua da Ilha ou Principense

Poonomi pesoali / Pronomes Pessoais

Ami                                       

Eu

Kua mi

Comigo

Atxi

Tu

Kua txi

Contigo

Ê

Ele/Ela

 

 

No

Nós

Ki no

Connosco

Ouo

Vós

Kôli – Ki (k’)ouo

Consigo - Convosco

Eles/Elas

Ine

 

 

 

Poonomi Posesivu / Pronomes Possessivos

Ki me

Meu

Ki tê

Teu

Ki sê

Seu

Ki no

Nossos/Nossas

Ki (k’)ouo

Vossos/Vossas

Ki ine

Seus/Suas

Verbos:

Abrir: Bi; Acender: Sêndê; Andar: Ndan; Apagar: Pagá; Cair: Kiê; Chorar: Gô; Comer: Kume; Comprar: Kopa; Correr: Kuê; Cozinhar: Kuxi; Dar: De; Defecar: Gbô; Descer: Dêssê; Dormir: Dimi; Entrar: Lenta; Escolher: Sanu; Fazer: Fêzê; Fechar: Fissa; Ficar: Fika; Ganhar: Gan; Lavar: Lava; Levar: Tan ue; Olhar: Pia; Passear: Paxa; Pedir: Pidi; Perder: Pêdê; Pôr: Puê; Precisar/Querer: Mêssê; Rezar: Reza; Rir: Rin; Sacudir: Vani; Semear: Ximia; Sentar: Tussan; Separar: Zo; Subir: Subi; Tirar: Txa; Tomar: Tama; Trazer: Daka; Ver: Vê; Virar: Viá; Zangar: Vôlô.   


 

Guiné Equatorial – Designação do Crioulo: Fá d’Ambô ou Flá d’Ambu

Ilhas de Ano Bom e Fernando Pó

Malía  da  pe-d’eli  tabaku

Maria deu ao pai dela tabaco

 

 

 

APÊNDICE B11:

 

Sri Lanka - Batticaloa, Trincomalee e Puttalam

Designação: Burgher Portugis, Portugis de Ceilam

 

Eau tanda Bengal

Riva de gammala

Lo trissa oen noiva

Charoe de marmala

 

Eau tanda Bengal

Riva de oen  cheecha

Lo trissa oen noiva

Kie bonitoe oen beecha

Eu vou a Bengala

Em cima de [um camelo]

Trarei uma noiva

Cheiro de marmelo

 

Eu vou a Bengala

Em cima de uma lagartixa

Trarei uma noiva

Que é bonita [como] uma manceba

                                                      JACKSON, Kenneth David: CANTHA SEN VARGONYA – TRADIÇÕES  ORAIS EM VERSO CRIOLO

                                                                        INDO-PORTUGUÊS, 1996.

 

 

 

  

 

    Tailândia (Bangkok)

 

No período em que estive em Bangkok, como Conselheiro Cultural da Embaixada de Portugal, entre 1995 e 1999, os euro-asiáticos de origem portuguesa mantinham um cerimonial que designam por “Visita ao Avô” e ocorre todos os anos, no primeiro dia de Janeiro, e a que tive oportunidade de assistir no Bairro da Imaculada Conceição, o núcleo mais antigo dos portugueses em Bangkok:

 

As crianças e seus pais entram em casa do avô que se mantém de pé no hall de entrada, ajoelham-se todos de mãos dadas e dirigem-lhe a seguinte saudação:

 

- “LOVADO SEJA  JESU CHRISTO”

 

O avô responde:

 

- “Par sempre.  Amen”

 

 

 

 

 

 

 

 

APÊNDICE B13:

 

Timor

 

Designação: Crioulo de Bidau

 

Canção "Pasterinho verde”

 

Pasterinho verde

Senta na catapa.

Velho olha velha,

Senta tapa-tapa.

Pástero de lamuca,

Pena girà-sol.

Culpa não foi minha.

Culpa foi de vós.

Peixe matà-ôi

Manére no coilão

Tanto fala fala,

Doe de còração.

 

Passarinho verde

Pousa na amendoeira.

O velho espreita a velha,

Sentado escondido.

Pomba verde,

Penas de girassol.

A culpa não foi minha.

A culpa foi sua.

O peixe mata-olhos

Pescado na rede

Tanta conversa,

Dói o coração.

Baxter, Alan N: “Notes on the Creole Portuguese of Bidau, East Timor" JOURNAL OF PIDGIN AND CREOLE LANGUAGES 5:1. 1-38 (1990). Versão portuguesa do autor.

 



[1] MORBEY, Jorge: I.C.M. RELATÓRIO DE ACTIVIDADES DE 1988: pp. 177-178

[2] The Catholic Directory of Myanmar 1995: 13-14.

[3] O mesmo que cachinha (vulva).

[4] Peixe dos mares de Cabo Verde.

[5] Arquivos de Macau: Vol. I: N.°4: Setembro de 1929: 220:234.





BIBLIOGRAFIA

ALMADA, Maria Dulce de Oliveira [cfr. DUARTE, Dulce Almada]: CABO VERDE – CONTRIBUIÇÃO PARA O ESTUDO DO DIALECTO FALADO NO SEU ARQUIPÉLAGO: Ed. Junta de Investigações do Ultramar: Lisboa: 1961: 166 p.

ARQUIVOS DE MACAU: Vol. I: N.°4: Setembro de 1929: 403 p.

BAPTISTA, Marlyse: The syntax of Cape Verdean Creole: The Sotavento Varieties: Amsterdam/Philadelphia: Ed. John Benjamins Publishing: 2002: 289 p.

BAPTISTA, Marlyse e GUÉRON, Jacqueline: Noun Phrases in Creole Languages: A Multi-faceted Approach: Amsterdam/Philadelphia: Ed. John Benjamins Publishing: 2007: 494 p.

BARCELLOS, Christiano José de Senna: SUBSÍDIOS PARA A HISTÓRIA DE CABO VERDE E GUINÉ: 7 volumes: Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro, Praia: Abril 2004: (Reprodução da obra com o mesmo nome, editada em Lisboa, pela Imprensa Nacional (1899/1912) e, o último volume, pela Imprensa da Universidade de Coimbra (1913). 

BRAGA-BLAKE, Myrna: Singapore Eurasians Memories and Hopes: Ed. The Eurasian Association: Singapore: 1992: 175 p.

BAXTER, Alan N.: NOTES ON THE CREOLE PORTUGUESE OF BIDAU, EAST TIMOR: in JOURNAL OF PIDGIN AND CREOLE LANGUAGES 5:1 (1990) p.1-33: Amsterdam/Philadelphia: Ed. John Benjamins Publishing

CALLAWAY, John: Vocabulary, in the Ceylon Portuguese, and English Languages, with a series of familiar phrases: Ed. Wesleyan Mission Press: Colombo: 1820: 44 p.

CANIATO, Benilde Justo : Língua Portuguesa e Línguas Crioulas nos Países Africanos : VIA ATLÂNTICA : No. 5 : Outubro : 2002.

CARDOSO, Eduardo Augusto: O Crioulo da Ilha de S. Nicolau, de Cabo Verde: Ed. ICALP/Instituto Cabo-Verdiano do Livro: Lisboa: 1990: 142 p.

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